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Extermínio e eutanásia econômica?

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Bnews - Divulgação Arquivo Pessoal

Publicado em 10/04/2021, às 15h35   Túlio Alves


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Com o avanço da pandemia (Covid-19) no Brasil, uma pergunta vem ganhando força e perplexidade: quantas mortes poderiam ter sido evitadas se o governo tivesse adotado as medidas corretas ? Já são 348.048 óbitos. Vale mencionar que a mortalidade por Covid-19 superou, pela primeira vez, a soma de todas as mortes causadas por outras doenças (50,3% contra 49,7%) quando analisado o período de 01 semana (28/03/2021 a 03/04/2021). 

Para tornar o cenário ainda mais fúnebre, verificou-se que o país acumulou 27.048 óbitos nos primeiros dias (1o ao 9o) do mês de abril, quase o dobro do que foi registrado no mesmo período do mês de março.

Sem piedade, a Covid-19 já matou mais do que a AIDS em quarenta anos, ceifando a vida de 1,5 brasileiros/mil, com predomínio do povo negro e dos pobres. Tais constatações podem ser pedagógicas, no sentido de decifrar as políticas erráticas do Ministério da Saúde e de um governo, como um todo, indiferente ao sofrimento humano. 

Sem dúvidas, a mencionada pergunta vem ganhando força, tanto pela evolução crescente da pandemia, como pelo histórico brasileiro que lhe garantiu a condição de país com a maior experiência vacinal do mundo. Por exemplo, controlamos a poliomielite, o sarampo, a pandemia do HIV, a quase pandemia do H1N1 e tantas outras enfermidades. Entretanto, tal histórico foi amplamente corroído pela sucessão de erros de um governo que poderia ter adquirido 70 milhões de vacinas (Pfizer) ainda no ano passado e combatido, ao invés de incentivar, tratamentos farmacológicos para a Covid-19 não recomendados pela ciência, além do mau exemplo relacionado às medidas não-farmacológicas, como o uso da máscara, distanciamento social e em algumas situações o 
"lockdown".

Para além dos erros governamentais, outras instâncias do poder não deveriam flertar ou apoiar medidas que  aprofundem essa tragédia. Nesse sentido, vale lembrar que a vacina é um bem comum, com eficácia comprovada para o controle e a prevenção de epidemias que possam prejudicar a saúde individual e coletiva. Até mesmo os maiores defensores do liberalismo político,   como John Stuart Mills ( influente filósofo da língua inglesa do século XIX), têm um entendimento que garantem subsídios contra a barbárie. Sob um argumento utilitarista, baseado no conceito moral do mencionado filósofo Inglês, considerando a vacina como um bem comum, com impacto na saúde pública, o interesse individual deveria ser relativizado em favor do interesse coletivo, em atendimento ao princípio da proteção do corpo social contra as ameaças de indivíduos e grupos que possam prejudicá-lo. Dessa forma, a liberação das vacinas para que  empresas privadas possam comercializá-las, em uma pandemia, é inaceitável e bárbaro.

Com todos esses desfechos sombrios, relacionados à Covid-19 no Brasil, e a falta de perspectivas, é preciso considerar a possibilidade de estar ocorrendo uma inaceitável associação de extermínio com eutanásia econômica em nosso país.


Túlio Alves é médico anestesiologista e professor da UNEB

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