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O novo padrão exportador de especialização produtiva no Brasil

Imagem O novo padrão exportador de especialização produtiva no Brasil
A diferença básica do novo padrão exportador com o padrão anterior é a associação de um maior grau de elaboração de muitos produtos exportados  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 24/10/2019, às 09h08   Yuri Dantas


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Muitas análises consideram a elevação da exportação como algo positivo para o desenvolvimento econômico nacional. Contudo, é preciso levar em consideração o conjunto: a qualidade dessa capacidade exportadora, o nível tecnológico desejado para suprir tais capacidades e a inserção do país na cadeia global de valores. No caso brasileiro em especial, o conjunto da dinâmica exportadora não se orienta para o desenvolvimento, mas sim para a atualização de velhas estruturas de dependência e do subdesenvolvimento como novas formas de organização reprodutiva.

A diferença básica do novo padrão exportador com o padrão anterior é a associação de um maior grau de elaboração de muitos produtos exportados. Há uma maior especialização da produção de commodities agrícolas e metálicas, assim como de produtos industriais de médio a baixo valor agregado. Portanto, essa base exportadora não reflete uma estratégia ativa de diversificação e geração de novas oportunidades comerciais, mas sim o aproveitamento de vantagens naturais ou comparativas na produção e no comércio internacional em consonância com uma demanda externa aquecida.

Deste modo, a crescente nas exportações brasileiras está associada ao aproveitamento de oportunidades criadas pela expansão das importações dos mercados internacionais mais dinâmicos com ênfase no comércio bilateral Brasil-China, que ajudou a consolidar o padrão de especialização exportador baseado nos tradicionais bens primários e de baixo valor agregado. Esse comportamento chinês não é isolado do comércio com o Brasil, estendendo-se a importação de bens agrícolas e minerais por toda América Latina.

Ademais, a atual exportação de bens e serviços é destinada a mercados externos e a um reduzido mercado interno com alto poder de consumo. Portanto, a consolidação desse novo padrão exportador de especialização está vinculada à perda de poder aquisitivo dos trabalhadores e à precarização em geral das condições de trabalho, uma vez que o mercado interno não constitui um elemento dinâmico. Assim, há uma sustentação da transferência de valores para os países centrais e o recurso à superexploração como forma de compensar tais transferências e sustentar um nível mínimo de competitividade no mercado externo.

A constituição do novo padrão exportador de especialização produtiva teve como consequência o fim do padrão industrial que marcou a América Latina entre a década de 1940 e meados da de 1970, em que houve etapas de internalização, mais autonomia nacional e diversificação do parque industrial. Essa nova dinâmica implicou um sucateamento industrial e falta de modernização frente aos avanços tecnológicos, processos que foram caracterizados como de desindustrialização. Além disso, países complexos como o Brasil e o México enfrentaram um reposicionamento da indústria no projeto geral do desenvolvimento nacional, em que foi submetida à subordinação do novo projeto exportador sob comando, em geral, de empresas transnacionais.

A especialização exportadora fica mais evidente quando se analisa as exportações brasileiras por intensidade tecnológica. Há uma tendência em se apoiar em setores específicos, como na agropecuária, setores alimentícios e na indústria extrativa mineral – eixos com crescente participação na pauta exportadora ao longo dos anos. Ao focar nessas vantagens comparativas no comércio internacional, articula-se uma nova reprodução do capital que propicia um tipo de especialização nesses setores em específicos, que apresentam uma débil incorporação tecnológica, dificultando a modernização do parque industrial e a diversificação da pauta exportadora. Ademais, é preciso destacar a falta de coordenação e relação orgânica da produção desses bens exportados com o restante da estrutura produtiva nacional, uma vez que demandam a importação de máquinas e equipamentos, bens intermediários e até mesmo matérias-primas para suprir a falta de desenvoltura tecnológica presente no país.

Outro ponto a ser salientado nesse novo processo de especialização exportadora é o papel do capital estrangeiro na reestruturação produtiva. O avanço de políticas neoliberais, principalmente na década de 1990, com a venda de empresas públicas e a implantação de políticas liberalizantes foram fatores cruciais para o aumento do capital estrangeiro no país. Contudo, os investimentos apresentam pouco enraizamento, nos quais predominam trabalhos de montagem, embalagem, rotulagem e processamento, o que dinamiza a mobilidade do capital para outras regiões. A internacionalização da economia brasileira e a entrada de capital estrangeiro não se arraigam nas cadeias produtivas do país, limitando as filias estrangeiras e não gerando os encadeamentos na economia que seriam notados em fases anteriores.

Além disso, destaca-se a inserção brasileira no capitalismo financeirizado em que há uma subordinação do país aos interesses estrangeiros, em que avaliações puramente financeiras e de curto prazo são mais defendidas em detrimento de uma estratégia nacional de desenvolvimento e dimensão produtiva. Desse modo, o perfil financeirizado das empresas multinacionais adentradas via investimento direto estrangeiro e a lógica estabilizadora das políticas econômicas adotadas acarretam nas reestruturações produtivas reprimarizadoras e internacionalizadas.

Portanto, o novo padrão exportador de especialização produtiva constitui segmentos de grandes cadeias produtivas globais, subordinados ao capital estrangeiro, que já não obedecem projetos nacionais de desenvolvimento econômico e são guiados por interesses imediatistas da dimensão financeira. Apesar da distribuição desigual entre os países centrais e periféricos sempre estar presente no decorrer do desenvolvimento capitalista, tal processo foi exponencializado com as atuais dinâmicas de cadeias globais de valores e segmentação da produção pelo mundo.

Yuri Dantas - Pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da UFBA. Mestrando em Economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia (PPGE/UFBA). Graduado em Economia pela UFBA.

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