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Reza a dor

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78% dos assassinatos a Travestis e Transexuais estão concentrados nos países da América Latina  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 14/11/2019, às 12h20   Diego Aric Souza


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Vivemos uma cadeia de dificuldades cotidianas, presos no tempo que acelera nossos passos, problemas que não se resolvem facilmente, dores que nos atacam em proporções imprevisíveis e situações que nos desmotivam. Somado a isso, e como se não bastasse, dormimos e acordamos pedindo a qualquer força de ordem metafísica que nos proteja, pelo simples fato de que a violência social é mais um terrível vetor que nos faz ter o sentimento mais comum – e que não deveria ser – dos “tempos de agora”: o medo! 

Nessa direção, todos os dias, em uma situação de interação, duas ou mais pessoas podem se violentar em via de mão dupla, ou simplesmente, existir um agressor e um agredido no calor de brigas, discussões e polêmicas. Dessa agressividade podem ocasionar danos em graus variáveis, irreversíveis tanto do ponto de vista físico quanto psicológico, de modo a marcar no corpo das vítimas, feridas dolorosas e, em pior instância, acarretar na morte dos envolvidos. 

Então, destaco os crimes causados pela fenomenológica homofobia. Temos uma sociedade patriarcal que, além de negar direitos a população LGBTQIA+, não reconhece o ser humano como produtor, construtor e zelador de seus direitos.  Esse fenômeno é indicador de mortes cotidianamente no Brasil, e segundo a ONG Européia TGEu, em 2018, 78% dos assassinatos a Travestis e Transexuais estão concentrados nos países da América Latina. Isso é proveniente de um processo histórico de exclusão social ao longo dos processos civilizatórios (me refiro ao colonialismo, ditadura, seres humanos escravizados, dentre outros). 

Muitos dos nossos são assassinados constantemente. A cada 23 horas, uma morte é contabilizada na comanda da dor e intolerância.  A cada 1380 segundos temos muitxs  Rodrigos, Marcelos, Itaberllys, Kaíques, Larissas, Vitórias, Fabíolas, Micaelas, Meiryhellens, Emillys e  Marielles com suas vidas ceifadas, sonhos interrompidos e amores negados pela selvageria e subhumanidade. Um circo contínuo de pavor para aqueles que são violentados e para seus familiares, onde a plateia assiste aos atos bárbaros contra esses seres humanos. Aliado a isto, o desequilíbrio da justiça e sua balança, esta que tende a pesar pela não resolução dos casos e a deliberação acaba sendo o descaso quanto à punição dos algozes. 

Às vezes parece mesmo que só nos resta rezar. Dentre as solicitações possíveis, parece comum pedir que os dias tenham mais cor e menos sabor de sangue. Que haja menos dinheiro e mais paixão. Menos revólver apontado e mais abraços largos. Menos lobos e mais cordeiros. Que onde haja morte, tenhamos espiritualidade. Onde haja subserviência, tenhamos revolução. E, assim, não tenhamos, impiedosamente, crimes hediondos por ser quem se é. No futuro, ao invés de rezar para acalmar e acalentar a nossa própria dor, rezemos pela glória da liberdade, do prazer e da mansidão. Oremos! 

Diêgo Aric Souza: Relações Públicas. Especialista em Mídias Oficiais e Gestão em RP. Mestre em Educação e Contemporaneidade pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). 

E-mail: [email protected]

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