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As semelhanças entre protestos dos Jaquetas Amarelas e das Jornadas de Junho

Imagem As semelhanças entre protestos dos Jaquetas Amarelas e das Jornadas de Junho
Bnews - Divulgação

Publicado em 26/12/2018, às 22h57   Lucas Valladares*


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As últimas semanas na França foram marcadas pelos protestos mais violentos desde 1968. Em maio daquele ano, Paris foi tomada por estudantes universitários lutando, inicialmente, contra a discriminação de classes sociais e a burocracia política. No dia 17 de novembro, o movimento dos Jaquetas Amarelas emergiu, já contam com mais de 3.900 prisões, 1200 pessoas feridas e 8 mortes. Mas tem outra origem: motoristas de diversos segmentos, insatisfeitos com o alto preço dos combustíveis, criação de novos impostos e custo de vida elevado.

Os motoristas não conseguiram parar a economia francesa no mesmo nível visto cinco décadas atrás, por conta descentralização de seus grupos e falhas na convocação de greves gerais pelos sindicatos, mas demonstraram a enorme insatisfação da classe média francesa com a política econômica do presidente Emmanuel Macron. 

Desde 2015, o preço do Super 95 (Gasolina) subiu 12,3%, £0,25 só em 2018. No caso do diesel esse aumento foi ainda maior, o litro subiu 30,1%, sendo que £0,86 do valor total é apenas imposto. Esse valor é referente aos aumentos do “imposto do carbono” francês, utilizado para desestimular a emissão de gases de efeito estufa, promovendo maior uso de automóveis sustentáveis, principalmente elétricos.

Dito isso, formular um paralelo com os protestos evidenciados no Brasil em Julho de 2013 não é difícil. As semelhanças são muitas, ambos os movimentos foram organizados, em redes sociais, de forma largamente apartidária, tendo participação de diversos componentes sociais. A faísca que desencadeou os protestos de 2013 foi justamente o aumento de R$0,20 na passagem de ônibus, em São Paulo. Esse fato também é parecido a paralisação dos caminhoneiros em Maio de desse ano, que por sua vez uma tentativa de reajuste por conta de um aumento no preço do diesel, derivado da mudança da política de preço da Petrobras.

Então, porque fatores relacionados com os combustíveis geram essa indignação? Os reajustes dos preços dos alimentos, dos aluguéis e dos serviços, por exemplo, acontecem de forma mais fracionada, diluindo-se ao longo dos meses. Além disso, a culpa é mais difícil de ser atribuída a um só dado ou agente, normalmente se culpa o processo inflacionário comum dos preços. No caso de uma tarifa regulada politicamente, como a passagem do ônibus ou impostos sobre o diesel, além do aumento acontecer de uma vez só, atingindo todo mundo ao mesmo tempo, é bem mais simples de apontar um responsável e partir para o confronto.

Com o aumento da adesão popular, todos os movimentos citados apresentaram algum nível de heterogeneidade social, amplos no plano das propostas e reivindicações, englobando diversas partes do espectro político, que por sua vez tentaram aliciar a maior parte possível dos movimentos para si. Portanto, a pauta se expandiu para muito além das queixas iniciais, incluindo corrupção, salários, pensões e as finanças públicas em geral.

Ao mesmo tempo que o coquetel de ansiedade agitado por populistas de direita e extrema-direita, como Marine Le Pen, critica a violência dos protestos, eles dependeram fortemente da perturbação e desordem para surtir um efeito concreto. Depois de várias demonstrações, em múltiplas cidades, o governo francês concedeu, no último dia 4, o cancelamento do aumento do imposto sobre os combustíveis e uma moratória de seis meses sobre as mudanças nos preços do diesel e da gasolina, previsto para Janeiro de 2019. Também houve a eliminação do imposto sobre as horas extras e as bonificações de fim de ano.

Similarmente, a prefeitura do município e o governo do estado de São Paulo, na época, atenderam parte das reivindicações das Jornadas de Junho e revogam o aumento da tarifa de ônibus. A revogação dos aumentos aconteceu também no Rio de Janeiro e em dezenas de outras cidades brasileiras. Da mesma forma, os preços do diesel também estão sendo subsidiados pelo governo Temer.

Esses tipos de movimentos refletem a vasta insatisfação da população e representam o quão importante são os preços no mercado de combustíveis para várias classes da sociedade, além de evidenciar o poder de mobilização dessas para reivindicar mudanças em defesa de seus interesses, mesmo que apenas momentaneamente. 

*Lucas Valladares - pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Graduando em Economia pela Faculdade de Economia da Ufba.  

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