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Contraditória decisão do STF

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Bnews - Divulgação

Publicado em 02/02/2019, às 12h00   Otto Alencar*


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Na madrugada desse sábado, 2 de fevereiro, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Dias Toffoli, em uma manobra jurídica mais do que questionável, com o devido respeito, tornou sem efeito a deliberação do Plenário do Senado Federal no sentido de que a votação para a eleição da Mesa Diretora fosse aberta e nominal.

O Presidente do STF se valeu de um meio processual inidôneo para tanto, extrapolando os limites da própria causa – Uma Suspensão de Liminar – e terminou por violar a independência harmônica entre os poderes, ao invadir uma questão eminentemente interna corporis, e submeter o Plenário ao convencimento da Presidência do Supremo, sob a justificativa de que sua decisão anterior estaria sendo desrespeitada.

Vejamos: a decisão foi proferida nos autos da Suspensão de Liminar número 5.272 do Distrito Federal.

A aludida Suspensão de Segurança foi interposta pela Mesa Diretora do Senado, contra a decisão do Ministro Marco Aurélio Mello, que deferiu liminar em mandado de segurança nº 36.169, determinando que a votação fosse aberta.

O Ministro Presidente, na contramão dos precedentes do próprio Supremo Tribunal, vem ao longo dos últimos meses deferindo diversos casos de Suspensão de Segurança ou de liminar para afastar a eficácia de decisões de outros ministros do próprio Supremo.

Ocorre que o Presidente do Supremo não tem competência para suspender decisões de Ministros do próprio Supremo. A lei 8.437/92 prevê a possibilidade de suspensão de decisões de outras instâncias, jamais uma decisão da própria Suprema Corte, já que o presidente, apesar de comandar administrativamente o Tribunal, não tem superioridade hierárquica sobre os demais membros da Corte Suprema.

Esse entendimento já foi externado pelo Supremo em diversas oportunidades, ao longo dos anos.
A decisão extrapola os limites da lide, em clara violação aos artigos 2º, 141 e 492 do Código de Processo Civil. Isso porque o pedido era de suspensão da decisão do Ministro Marco Aurélio, que entendia inconstitucional a disposição regimental que garantia a votação secreta. É evidente que o mandado de segurança sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio não dizia respeito à deliberação do Plenário do Senado, tomada na data de ontem. Assim, a suspensão de segurança decidida pelo Ministro Toffoli não poderia, jamais, ir além dos limites da causa originária, que era o mandado de segurança, e do próprio pedido de suspensão movido pela Mesa do Senado. Isso é elementar.

A decisão do Ministro Presidente Dias Toffoli é contraditória, sob diversos aspectos.

1 – No conteúdo da própria decisão ele afirma que é da jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal que as questões de organização interna e de interpretação do regimento do Poder Legislativo são matéria atinentes à economia interna, interna corporis, de modo que não cabe ao Judiciário interferir. O curioso é que a decisão que suspende a decisão de Marco Aurélio, do próprio Dias Toffoli, se fundamenta nesse entendimento, quando diz, expressamente, que, palavras do próprio Dias Toffoli:

“De outro lado, todavia, matérias respeitantes aos atos de organização das Casas Legislativas ou que respeitassem apenas à interpretação do regimento interno de qualquer daquelas casas continuaram sendo abordadas por esta Corte como matéria interna corporis e, desse modo, impassíveis de apreciação pelo Poder Judiciário, sob pena de violação à Separação dos Poderes.”

2 – Os próprios precedentes invocados na decisão indicam que a regra é que as deliberações sejam abertas, e que a exceção seja a deliberação secreta. E reconhece a constitucionalidade da eleição secreta. Isso, contudo, não implica na inconstitucionalidade da eleição aberta! Nos termos da própria decisão anterior, essa é uma escolha do Poder Legislativo. Ao interferir nessa escolha, o Ministro Toffoli, como Presidente da Suprema Corte, monocraticamente, está a desequilibrar a independência entre os poderes, arvorando-se em um poder Supremo, de que não é mandatário, já que a Suprema Corte, apesar do nome, não exerce supremacia sobre os demais poderes.

A decisão da madrugada, ao extrapolar os limites da lide, terminou também por usurpar a competência dos demais ministros da Corte Suprema, já que qualquer medida judicial com a finalidade de anular a deliberação do Plenário do Senado deveria ser submetida à distribuição eletrônica de um novo processo, de uma nova causa judicial, fosse ela Mandado de Segurança, ação direta de inconstitucionalidade ou arguição de descumprimento de preceito fundamental. O recesso judiciário já acabou, de modo que não mais teria competência o Ministro Presidente para decidir em plantão decorrente do recesso. Ultrapassou-se a distribuição regular, mediante uma petição avulsa nos autos da Suspensão de Segurança, cujos limites são impostos pelo próprio pedido inicial nela contido. E pior, para contradizer a própria decisão anterior, que garantia a autonomia dessa Casa para definir sobre sua organização interna.

Ou seja: a autonomia do Senado só existe quando estiver de acordo com o pensamento do Presidente do Supremo. Trata-se de um ataque direto à separação harmônica entre os poderes.

* Otto Alencar é médico e senador da República pelo PSD

Classificação Indicativa: Livre

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