Economia & Mercado

Divisão Internacional do Trabalho e Política Industrial

Imagem Divisão Internacional do Trabalho e Política Industrial
Bnews - Divulgação

Publicado em 07/05/2019, às 23h16   Yuri Dantas e Leonardo Siqueira*


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O tema da política industrial para o desenvolvimento econômico remonta ao período da Revolução Industrial na Inglaterra no século XIX, quando pensadores da nascente Economia Política debatiam sobre os caminhos a serem adotados para o progresso de suas nações. No século XX, sua importância se fez ainda mais perceptível com a terceira revolução industrial, em que o advento da tecnologia de informação e comunicação impulsionou extraordinariamente a velocidade da inovação e introduziu novos bens e serviços dos processos produtivos.

Nos dias de hoje, alguns países já atingiram a quarta revolução industrial, em que se faz uso de inteligência artificial, uso de sistemas ciber-físicos e internet das coisas. Deste modo, a rapidez das mudanças tecnológicas e a redução das distâncias fizeram com que a concorrência e a pressão para o acompanhamento das inovações tecnológicas se intensificassem, pondo em desvantagem no mercado internacional os países que não as adotassem.

Contudo, com a disseminação de medidas neoliberais nos anos 1990, alguns países periféricos no sistema capitalista, como o Brasil, que sentiam o peso das dívidas externas, apresentaram desarticulações políticas e passaram a adotar medidas de liberalização econômica e abertura comercial. Dessa forma, a entrada de capital estrangeiro e a penetração das empresas transnacionais passaram a focar na divisão de tarefas e produção de bens e serviços intermediários articulados em cadeia global de valores, o que acarretou um agravamento da polarização centro-periferia na divisão internacional do trabalho.

Uma mudança desse cenário pode passar, sobretudo, pela criação de capacitações tecnológicas e de condições infraestruturais que permitam ao país ascender na cadeia global de valores e se inserir em cadeias produtivas de maior conteúdo tecnológico. Mas, essas capacitações não serão promovidas pelas empresas transnacionais justamente pelo contexto hierárquico e desigual das cadeias globais de valores e das potências detentoras do capital.

Vê-se, portanto, que o ponto chave é a capacidade de coordenação, financiamento e determinação do Estado ao garantir poder e coesão social para proporcionar e conduzir estratégias nacionais que viabilizem uma transformação estrutural significativa. O problema surge quando o país está inserido em um período recessivo em que há mais chances de se adotar políticas de austeridade e dar uma menor importância às políticas industriais, o que dificulta as economias periféricas a mudarem os seus status.

Em casos como esse, como o que o Brasil vivencia nos últimos anos, é de praxe uma guinada austera na política fiscal do país, o que põe em segundo plano ações importantes para o setor industrial como o investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Tais medidas influenciam na diferenciação e no processo inovativo das firmas nacionais. Isso faz com que o produto brasileiro fique defasado no cenário internacional, uma vez que os demais países continuam a se modernizar, como pode ser visto com a nova estrutura da quarta revolução industrial. 

Por conseguinte, com a perda da competitividade de produtos manufaturados nacionais, resta ao Brasil se especializar em produtos de baixo valor agregado, como pode ser visto quando se analisa a balança comercial brasileira por nível tecnológico, constituída majoritariamente em exportação de produtos de baixo valor agregado, como produtos agrícolas e commodities. Desta forma, o Brasil estaria inserido na divisão internacional do trabalho como um país periférico, em que há uma especialização em bens intermediários e matérias-primas para suprir as necessidades dos países do centro, em que há a produção de bens finais. 

Assim, a mera inserção na cadeia global de valores sem uma devida preparação ou suporte à indústria nacional pode ser um agravante para a intensificação da polarização centro-periferia. Isto é, inserir-se no mercado externo sem um parque industrial moderno e consolidado, ocasionaria em uma especialização em produtos de baixo valor agregado, por haver demanda dos países do centro e não requerer uma boa desenvoltura tecnológica. Dessa forma, o país não superaria a sua defasagem tecnológica, uma vez que não há uma necessidade imediata para se modernizar, e não alcançaria o cathing up tecnológico – importante fator para o desenvolvimento nacional.

Uma saída para romper esse paradigma inerente da divisão internacional do trabalho seria a adoção de estratégias de desenvolvimento setorial, como as Políticas Industriais que se caracterizam por medidas que intervêm favoravelmente ao setor industrial com o objetivo de compensar as desvantagens competitivas presentes e a difusão tecnológica no país. O ponto chave da política industrial é a intervenção do Estado para proporcionar os elementos necessários à consolidação industrial, como o investimento em infraestrutura, formação de mão de obra qualificada e a criação de empresas públicas em áreas estratégicas, como produção de bens de capital e bens intermediários. 

Superar a especialização em mão de obra barata e produtos de baixo valor agregado constituiria um desafio central para os países periféricos inseridos na cadeia global de valores, objetivando a promoção de progresso econômico e social via políticas industriais. Daí surge a imprescindibilidade em se adotar estratégias setoriais que visem a consolidação dos sistemas nacionais de inovação e o desenvolvimento industrial e modernização tecnológica. Um elemento importante é o poder político do Estado de negociação e capacidade de investir, financiar e promover o desenvolvimento econômico e tecnológico. Vale novamente ressaltar que muitos países industrializados, com protagonismo do Estado, já atingiram a quarta revolução industrial e que, quanto mais tardia é a adoção de tais políticas industriais, maiores serão os esforços para alcançar as novas fronteiras tecnológicas. 

*Yuri Dantas - Pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Graduado em Ciências Econômicas pela UFBA e Mestrando em Economia pela Ufba.  

*Leonardo Siqueira- Pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Doutorando em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre em Desenvolvimento Regional e Urbano (2018) pelo Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Urbano (PPDRU) na Universidade Salvador (UNIFACS).

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