Economia & Mercado

A Dialética da Dependência e a Industrialização na América Latina

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Os principais problemas enfrentados pelos países latino-americanos atualmente são frutos de sua dinâmica produtiva voltada para a exportação, superexploração da força de trabalho e negligência para com o mercado interno  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 23/07/2019, às 19h42   Yuri Dantas*


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A fragilidade estrutural da indústria brasileira e a sua baixa desenvoltura tecnológica refletem na sua estrutura produtiva que, ao especializar-se em produtos de baixo valor agregado, apresentam um desempenho insatisfatório na inserção internacional de produtos manufaturados nacionais. Além do mais, tal debilidade se mostra integrada a uma relação de dependência com o capital estrangeiro, numa dinâmica deletéria aos interesses nacionais, que constitui um dos desafios para o desenvolvimento industrial e nacional. 

Contudo, a fragilidade industrial brasileira não é algo recente, mas sim o resultado de séculos de dependência da América Latina aos países centrais europeus. A divisão internacional do trabalho foi inicialmente promovida no século 16 por um capitalismo nascente que almejava uma dinâmica internacional. Nesse período, as colônias latino-americanas, fornecedoras de matérias-primas e bens agrícolas, apresentavam uma relação de subordinação, expressa no historicamente reconhecido Pacto Colonial, com suas metrópoles que tinham nessa dinâmica um meio de garantir o desenvolvimento comercial e bancário da Europa.

Uma vez que os meios de subsistência de origem agropecuária seriam consideravelmente supridos pelos países dependentes da América Latina, houve espaço para a elevada especialização produtiva da sociedade europeia que a Revolução Industrial necessitara no Século XVIII. Essa foi a dinâmica que permitiu aprofundar a divisão internacional do trabalho e  fomentar os países centrais como produtos mundiais de manufaturas. Por outro lado, os países periféricos ficaram encarregados de criar uma oferta mundial de bens agropecuária e matérias primas industriais que aparece como uma condição necessária para sua inserção no mercado internacional capitalista.

Assim, a América Latina reproduzia em seu seio as relações de produção agroexportadora que apresentara no decorrer de sua história. E essa relação era alimentada mediante uma acumulação baseada na superexploração do trabalhador. Outra característica da produção latino-americana é o seu descolamento do consumo interno, já que a mesma estaria sendo destinada para os países industriais. Portanto, quando o mercado mundial atingiu certo grau de desenvolvimento e alguns países da América Latina ingressaram na etapa de industrialização, como no caso brasileiro, estes encontraram bases e contradições criadas pela economia agroexportadora herdada do seu período colonial.

Dadas as circunstâncias, a industrialização latino-americana se dá sobre bases distintas. A economia exportadora debilitou o nascimento do setor industrial, que só via crescimento quando fatores externos limitavam a importação e forçavam o consumo interno, como as crises comerciais e a limitação dos excedentes da balança comercial. A maior incidência desses fatores que provocou mudanças significativas na indústria. Portanto, a industrialização latino-americana não cria sua própria demanda como foi nos países centrais, mas nasce para atender uma demanda pré-existente e se estruturará em função das exigências de mercado procedentes dos países avançados.

À medida que a industrialização avança na América Latina, há mudanças na composição de suas importações, com uma diminuição na importação bens de consumo e sua substituição por matérias-primas, produtos semielaborados e máquinas destinadas à indústria. Outra mudança foi a importância do capital estrangeiro para suprir as necessidades de investimentos diretos na indústria.

Contudo, ao mesmo tempo em que o capital estrangeiro era injetado nas economias latino americanas para o investimento industrial, as economias centrais se especializavam na produção de bens de capital e os mesmos eram importados pelas economias periféricas para impulsionarem o processo de industrialização. Ou seja, o centro acabou criando um mercado capaz de absorver os produtos de sua indústria pesada. 

Assim, a industrialização latino-americana correspondeu a uma nova divisão internacional do trabalho, em cujo marco são transferidos para os países dependentes etapas inferiores da produção industrial (como por exemplo, a siderurgia), e sendo papel dos países centrais as etapas mais avançadas, como a produção de computadores, e o monopólio da tecnologia correspondente.

Percebe-se que os principais problemas enfrentados pelos países latino-americanos atualmente são frutos de sua dinâmica produtiva voltada para a exportação, superexploração da força de trabalho e negligência para com o mercado interno. Essas bases que sustentaram a industrialização em tais países foram determinantes para perpetuarem seus papeis submissos na globalização neoliberal, tendo como consequências a desindustrialização - especialização dos países em bens primários e de baixa intensidade tecnológica – e a fragmentação social.

*Yuri Dantas - Pesquisador do Núcleo de Estudos Conjunturais (NEC) da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia (Ufba). Graduado em Ciências Econômicas e Mestrando em Economia pela Ufba.  

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