Política

“Faltam investimentos para crianças”, diz Hilton sobre prefeitura

Publicado em 11/10/2015, às 00h00   Aparecido Silva (Twitter: @cydosilva)


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Por Aparecido Silva

Em entrevista ao Bocão News, o vereador Hilton Coelho (PSOL), presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente, na Câmara de Salvador criticou o pouco investimento demonstrado pela prefeitura de Salvador, na lei Orçamentária Anual de 2016, que diz respeito a implementações de ações em prol do direito da criança e adolescente na capital do Estado. O psolista ainda fala da atuação do colegiado no Legislativo soteropolitano e credita um marco na construção de propostas em torno do tema.

Bocão News: Gostaria que falasse sobre essa data. Como muitas outras, é criticada pelo teor econômico, ou seja, aproveitado para movimentar o comércio. Hoje, podemos dizer que o dia da criança tem alguma conquista a ser comemorada nessa questão dos direitos da criança? Qual o cenário que você aponta para nós hoje?

Hilton Coelho: Acho que o Brasil, do ponto de vista material, não conseguiu avançar em relação a conquistas para criança e adolescente, especialmente crianças do nosso País. Mas culturalmente sim, principalmente em função da difusão de elementos do ECA. Há, pelo menos, uma maior estruturação da rede de proteção com destaque para os conselhos tutelares, mas não só eles, com a preocupação especializada de instituições como o MP e agora a Câmara de Vereadores da nossa cidade também aprova a comissão de defesa da criança e adolescente para que tenhamos no legislativo a possibilidade, não apenas de elaboração de leis, mas com fiscalização do Executivo. Eu acho que são demonstrações de que culturalmente existe um maior nível de convencimento da sociedade que é preciso fazer com que o Brasil, desde as raízes do cidadão, seja respeitado para que construamos uma sociedade melhor. Uma sociedade que a gente consiga avançar no quesito desigualdade.  O que marca a sociedade brasileira é a desigualdade. Nós somos o 7º país em condições sociais de vida.  Por exemplo, em educação, estamos na pior condição do mundo.  O Brasil está na pior situação do ponto de vista “educação”.  Então corrigir essas situações, essas desigualdades, é o grande sentido da aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente há 25 anos.

Bocão News: Vamos falar mais adiante sobre o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), mas eu queria saber quais têm sido as principais diretrizes da atuação da comissão do senhor presidente da Câmara em defesa dos direitos das crianças e adolescentes?

HC: O principal investimento da nossa comissão tem sido a questão educacional. Nós temos uma critica muito grande a gestão do prefeito ACM Neto. Então eu sempre coloco “apesar da gestão do prefeito ACM neto, nós tivemos avanços importantes na área educacional”. Eu falo “apesar da gestão”, porque isso aconteceu a partir de muitos embates especialmente dos educadores do município em conjunto com a Câmara de Vereadores, tivemos algumas conquistas nesse sentido. Primeiro a questão do plano de carreira da educação municipal, é algo bastante importante porque apontou a possibilidade de um crescimento profissional dos educadores do município, estabeleceu, por exemplo, a reserva de carga horária que é um tempo específico de preparação da intervenção em sala de aula. Tudo isso tende a elevar a qualidade de educação no município. Outro elemento que acho que é bastante importante também é a questão do número de concursados hoje na rede. Temos uma boa maioria de concursados. Ainda não é a situação ideal, mas avançou bastante. Isso aconteceu também porque a Câmara de Vereadores entrou com representações no Ministério Público desde o início da prefeitura apesar da resistência do prefeito ACM Neto, a gente conseguiu dar passos adiante nesse sentido. Inclusive em relação ao plano anual da prefeitura, mas tem algum nível de avanço em relação à construção de novas unidades, então eu citaria isso como prioridade. A comissão tem feito uma discussão bastante ampla, nós inclusive elaboramos, recentemente, o Orçamento Criança, que esperamos que o prefeito ACM Neto (DEM) refaça a proposta desse orçamento que chegou na Câmara, mais uma vez, sem contemplar as necessidades da criança e do adolescente e essas demandas vão das diversas áreas: educação, saúde, cultura, esporte, no reforço ao conselho municipal em defesa da criança e do adolescente e reforço aos conselhos tutelares. Então é um programa bastante amplo e também bastante concreto que lhe aponta metas reais para a prefeitura de salvador e que vai chegar às mãos do prefeito. Esperamos que ele altere a lei Orçamentária Anual de 2016 em favor dos direitos da criança e do adolescente.

Bocão News: Nessa linha de que existem avanços nesse campo da educação, pode-se dizer que há melhoras para a criançada hoje em Salvador, opção de lazer e também educação, teria alguma coisa pra se apontar como positiva nesse período que ACM Neto assumiu e está fazendo algumas andanças pela periferia tentando fazer uma imagem de que esta trabalhando pela cidade toda. O senhor teria algo a apontar de positivo nesse cenário de favorecer as crianças hoje?

HC: Qual o principal espaço onde a criança se sente protegida? Porque nós estamos com problemas generalizados e violência em Salvador. O principal espaço de segurança hoje da criança, infelizmente, está se restringindo ao espaço escolar. Boa parte das crianças fica trancada em suas casas porque os pais precisam trabalhar, não tem com quem deixar seus filhos então elas passam um período na escola, no outro ficam em casa. Um grande caminho para esse espaço do lúdico é a valorização do espaço escolar. Nós queremos que a prefeitura valorize muito mais do que vem sendo feito. Em relação a aparelhos públicos, notamos o nível de investimento da prefeitura, mas se encontra em um quadro que é realmente difícil. Quando o prefeito ACM Neto chegou, a gente não tinha uma praça pra criança da primeira infância em Salvador. É claro que, se num quadro lastimável tem algum nível de intervenção, a tendência é você chamar atenção em relação a intervenção. Então essa intervenção é de fato foi feita. Tem algumas praças da infância hoje em Salvador, mas ainda existe o problema da segurança, velho problema da manutenção, no Brasil, inauguram-se espaços, mas não garante a manutenção dos espaços. Eu costumo dizer que a administração de Salvador é muito perversa com a segurança da cidade. Temos situações muito gritantes. Por exemplo, Salvador até hoje não conseguiu resolver o problema da alimentação escolar. Hoje você chega nas escolas e vê os meninos tomando suco de caixa refresco com biscoito. É inadmissível.

Temos uma situação que nós deveríamos ter em torno de 30 conselhos tutelares e Salvador está com 16

Bocão News: Dois pontos que eu queria que o senhor falasse sobre é a questão da exploração do trabalho, da mão de obra infantil e também a questão da exploração sexual em Salvador hoje a gente pouco ouve falar sobre isso, mas claro que existe. Qual o cenário que você acompanha, como presidente da comissão do direito?

HC: O nosso olhar sobre isso, ainda é um olhar muito empírico porque uma das coisas que está na nossa proposta de demandas, o orçamento da criança e adolescente de Salvador que foi elaborado no mês passado, uma das demandas é um diagnostico sobre a criança e o adolescente. A gente não pode ter uma visão sem passar por um diagnóstico feito cientificamente. Na verdade com o processamento de dados, com a geração de índices, tudo isso. Temos um problema em relação ao diagnóstico. Não é difícil perceber isso, inclusive tem uma ação conjunta da comissão, Ministério Público, órgãos governamentais da prefeitura e do estado e câmara de vereadores, que acompanha a situação dos megaeventos em Salvador (carnaval, copa, olimpíadas). Principalmente no carnaval percebemos que esses dois problemas gritam na cidade. Tanto a questão do trabalho infantil como a exploração sexual e aqui, no carnaval é ainda significativo porque está baseado principalmente na questão do turismo que é estimulado também pelo sexo. Vemos isso claramente, como por exemplo: existe a valorização completa no nosso centro histórico. Salvador é considerada um dos patrimônios culturais da humanidade, mas o nosso centro histórico não é valorizado, não é feito um turismo cultural, portanto isso não é estimulado. E a tendência é que se faça um turismo baseado na ideia do turismo da perspectiva do turismo sexual. Isso vai deixar vulnerável, crianças e adolescentes. O observatório que é feito para situações de megaevento é constatada essa situação de manter de maneira muito expressiva na nossa cidade, nós ainda carecemos dessa fase preliminar.

O povo brasileiro precisa entender que as nossas crianças tem prioridades em relação a tudo e que essa prioridade precisa ser exigida por cada cidadão

Bocão News: O senhor começou falando da questão dos direitos que a criança e adolescente têm. Queria saber a questão que a gente tem instrumentos hoje como o ECA, Conanda... Existem direitos que são colocados nesses documentos. Direito a esporte, saúde, educação, como o senhor já começou apontando isso. Queria que o senhor falasse mais sobre esse cenário e se esses instrumentos estão sendo cumpridos e o que precisa ainda pra que seja uma coisa mais concreta no nosso dia a dia, a criança ter esses direitos na prática. Como é que o senhor vê isso hoje?

HC: Existe uma negação completa na minha leitura de efetivação do estatuto e o remédio para isso é conscientização da população. O povo brasileiro precisa entender que as nossas crianças tem prioridades em relação a tudo e que essa prioridade precisa ser exigida por cada cidadão. Falamos sobre o dia das crianças e você (Cydo) tratou a questão do consumismo e isso é gravíssimo. O Conanda gerou uma decisão que proíbe a propaganda voltada a crianças e que teve impacto principalmente aos canais na televisão aberta, mas em relação aos canais fechados e internet, isso é respeitado em absoluto. O abuso tanto na internet como nos canais fechados é muito flagrante. Então estamos entrando em ação com o Ministério Publico para terminar com esses abusos. A efetivação do ECA passa principalmente pela informação da população, para entender que é uma conquista para ela, porque existe uma campanha meio subliminar e um desgaste do significado do estatuto. Então a população brasileira precisa entender o estatuto como um patrimônio nosso. E em função disso ter uma postura afirmativa. Nós inclusive tivemos uma lei aprovada na câmara que definiu a obrigatoriedade do conteúdo do ECA  ser trabalhado no espaço escolar. É uma das principais  novidades. Nós aprovamos a lei, mas incrivelmente o prefeito ACM Neto vetou, com um argumento que geraria despesa. O projeto indica que o primeiro momento disso seria a formação dos professores, a inserção da aprovação já realizada pela secretaria dos professores, isso não tem como gerar despesa. Isso passa por uma necessidade que se tem de mitigar as conquistas legais do povo brasileiro.  Precisamos que o poder público reveja a sua posição no sentido de afirmação dessa conquista. Por outro lado a gente vive num país que não podemos esquecer que ao lado do corte de recursos que agora estamos vivendo: cortes muito agressivos. Vivemos num país que é uma espécie de paraíso do capital brasileiro.  Nosso mandato vai realizar no dia 24 de outubro, a presença de Maria Lúcia Fatorelli que foi a brasileira que participou da coordenação da auditoria de dívidas do Equador e da Grécia e descobriu coisas inaceitáveis em relação à situação da Grécia, mas que são muito similares a situação brasileira.

Bocão News: Outra questão que quero pontuar o Conselho Tutelar na sua avaliação atende de fato a necessidade de que essa comunidade infantil tem hoje de ter essa proteção quando se encontra desamparada?

HC: De forma alguma. Hoje a dificuldade estrutural dos conselhos, inclusive o numero de conselhos tutelares em Salvador, é muito pequeno. Temos uma situação que nós deveríamos ter em torno de 30 conselhos tutelares e, Salvador está com 16. Isso numa cidade que é a capital do desemprego e pobreza. Mesmo assim funcionando precariamente. O respeito pelo trabalho deles é muito baixo. Nos nossos conselhos tutelares falta de tudo: de material a um corpo funcional, pois não pode funcionar só pelo conselheiro tutelar, precisa ter um corpo administrativo, técnico, jurídico, assistência social, pelo menos.

Colaboraram Victor Pinto e Brenda Ferreira

Classificação Indicativa: Livre

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