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Davi Moraes e Pierre Onassis unem suas experiências no Afroelétrico e apostam em novas linguagens musicais

Imagem Davi Moraes e Pierre Onassis unem suas experiências no Afroelétrico e apostam em novas linguagens musicais
Bnews - Divulgação

Publicado em 10/10/2018, às 14h55   Rafael Albuquerque


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Originado da união de Davi Moraes e Pierre Onasiss, dois artistas inquietos e com trajetórias elogiadas, o Afroelétrico pode ser considerado um tudo de ensaio onde os músicos vão fazer experimentos. O projeto traz a força do que eles denominam de guitarra percussiva, além de elementos da música eletrônica e da voz marcante de Pierre. O ex-vocalista do Olodum vai trazer a influência afro, sua raiz, e mesclar com o que há de mais moderno na atualidade. Os artistas vão ter o primeiro contato com o público durante participação no show da banda Trem de Pouso nesta quinta-feira (11), no Largo Tereza Batista, Pelourinho. Mas quem quiser saber um pouco mais sobre o novo projeto é só ler a entrevista que os artistas concederam ao BNews abaixo:
BNews: Salvador é berço de grandes artistas e grande parcerias musicais. Considerando que vocês já têm suas carreiras paralelas, quando surgiu a ideia que originou esse processo de vocês?
Davi Moraes: Foi boa essa forma como você abordou, porque realmente a gente vem falando dos encontros que a música nos proporciona, que são encontros mágicos, e aqui é um lugar onde acontece muito isso. O nosso foi de uma forma muito natural. A gente se encontrou num estúdio aqui de Salvador, quando eu estava fazendo um trabalho e a gente se encontrou. Rolou a oportunidade de ter uma apresentação, de começar uma amizade que já vinha de uma admiração de fã, de um admirar o trabalho do outro. Dali em diante, foi estreitando a amizade e começamos a compor juntos e ver que a gente tinha não só uma afinidade espiritual e pessoal de amigos, como na música.
BNews: Mas até então de forma despretensiosa?
Davi Moraes: Até então despretensiosamente, só de começar a compor juntos, de ter aquele prazer de conhecer um cara que sempre escutei desde minha adolescência quando eu sonhava em viver de música. A gente tem essa referência da voz de Pierre, dos blocos Afro, daquela coisa do puxador afro. Eu sempre tive uma influência muito forte disso tudo. E tenho também uma referência muito forte de meu pai, por ser o primeiro cantor de trio, e o encontro com a guitarra de Armandinho. A guitarra sempre foi um elemento muito forte no trabalho do meu pai, seja com o Armando, com Pepeu, com o próprio Luiz Caldas. Eu senti uma coisa natural de uma reedição desse tipo de encontro, da minha guitarra, que por mais que eu tenha influência do Rio com o chorinho, do samba carioca, mas eu tenho raiz muito forte na Bahia. A maior parte de minha família é daqui e eu passei praticamente todos os carnavais da minha vida aqui, muitos tocando, vendo os blocos afro passar. E quando a gente se encontrou foi uma química de imediato que a gente sentiu.  E aí sim, com o tempo de amizade a gente veio amadurecendo o projeto.
Pierre Onassis: Essa conexão com Davi, quando aconteceu o primeiro encontro, a gente já sabia o que estava por vir. Eu fui muito tocado pelo talento de Davi, que todo mundo conhece. A minha história também despertou nele o desejo de fazer algo. Foi despretensiosamente, mas no universo já estava conspirando tudo a favor de que um dia a gente faria algo, porque o desejo que Davi tem de contribuir é oi desejo que eu tenho. Ele sabe que já contribuiu muito pela música brasileira, e eu aqui na Bahia sempre tentei representar bem esse universo afro, com canções, como intérprete, no posicionamento de garantir a originalidade da música baiana com toda sua percussão. E foi aí que despertou em nós a vontade de fazer algo, vestindo uma nova roupa nessas coisas que já aconteceram e que fazem parte do cancioneiro popular. A gente quer fazer as pessoas felizes, realizadas com a música que toque no seu coração com muita simplicidade e, sobretudo, com muita verdade. Eu sou muito realizado de poder fazer esse projeto com Davi, porque eu seu que ganha a Bahia, ganha o Brasil, garante a propagação do que ele respira e do que eu respiro. O Afroelétrico é isso, do afro e do elétrico, como diz o próprio nome.
BNews: O material de divulgação de vocês fala da descoberta de “novas linguagens musicais”. Isso vai acontecer a partir das experiências de cada um de vocês? Podemos denominar isso de alguma forma?
Pierre Onassis: Tudo isso é Afroelétrico. Quando a gente fala de influência, eu lembro que o primeiro disco que meu pai me deu pra escutar foi Ray Charles, isso eu com talvez uns 10 anos. Quando você toma uma “porrada” dessa com 10 anos, é lógico e natural que isso vai te influenciar lá na frente. Acho que meu pai, intencionalmente, queria embutir em mim música boa. E que bom que eu cresci com esse sentimento, que bom que eu cresci ouvindo Emílio Santiago. Tudo isso é um pouco de minha história.
Davi Moraes: Só pra completar o que Pierre falou de novas linguagens, trata-se de a gente trazer a nossa bagagem, que não temos nenhuma intenção de nos livrarmos delas, até por respeito aos nossos mestres, pra dar continuidade, pra trazer a percussão, a guitarra baiana. Mas sem o purismo. Quando dizemos nova linguagem queremos acrescentar novos elementos, queremos ousar, queremos fazer novas misturas, juntar programação com o tambor tocado, com a guitarra que é percussiva, com a percussão que é eletrônica.
BNews: vocês puxam pela raiz, mas trazem a modernidade.
Davi Moraes: isso aí. É a gente ter orgulho de trazer as raízes, mas não ter purismo, é ter mente aberta pra quebrar barreiras musicais pra naturalmente trazer as novas linguagens.
BNews: Então, o conteúdo que vocês absorvem não necessariamente serão reproduzidos. Serão absorvidos e potencializados.
Davi Moraes: exatamente. Não é só simplesmente fazer o que os nossos mestres fizeram. É fazer o que eles fizeram e ir a diante, e isso é o grande barato.
BNews: Em que momento da música brasileira vocês acham que o Afroelétrico está sendo inserido, considerando essa onda do sertanejo, do funk?
Pierre Onassis: Então, música é música, sempre música. O respeito mútuo é o que tem que haver sempre. Nós temos nossas raízes, mas eu não critico. Música é igual a rádio, é dial. Se você não gostou é só mudar a sintonia. E o respeito tem que prevalecer sempre. Eu respeito todas as tendências musicais. Acredito que o sertanejo tem seu espaço devido, porque foi conquistado. Acredito que o próprio movimento do axé, que é mais um comportamento, foi conquistado. O universo da música afro foi conquistado. Tudo isso é conquistado porque é aquilo que você deseja. Eu acredito que esse momento que a gente vive é de celebração, é cada um fazendo aquilo que acredita e indo pra onde deseja ir.
Davi Moraes: E nós vemos que são histórias que se repetem. Você pensa assim: quais seriam as dificuldades de hoje? Falta espaço pra uns, e tem espaço demais para outros? Mas aí você pensa que quando o samba apareceu teve sua dificuldade. Teve preconceito, era considerada música de morro. Depois veio a MPB, veio o rock dos anos 80. Aí disseram que a MPB já era e que o bom era o rock. Mas aí tinha o preconceito da MPB com o rock, porque diziam que o rock era mal tocado. Aí o rock se firmou, quem tinha sua verdade se firmou. Aí veio o funk, que também sofre preconceito. E foi assim por diante. O sertanejo, por mais que faça sucesso, também sofre sertanejo. Então, tem essas histórias que se repetem, cada uma com a particularidade de sua época. Mas a gente acredita que seja lá qual for o estilo, não estamos numa competição pra ver quem é o melhor. Que tenha espaço para todos e que o que é feito de alma e de coração a gente acredita que sempre vai prevalecer e vai ter uma continuidade. Você tem exemplos disso: eu vejo agora a volta dos Novos Baianos. Por mais que seja minha família, quando eu soube eu me perguntava como seria isso. E aí foi o que foi, Margareth (Menezes) me ligou de lá do show chorando. Aí você vê 40 anos depois podem dizer que tem um estilo ou outro tomando conta do mercado, mas os caras tiveram uma volta triunfal. Então, não estamos levantando uma ou outra bandeira. Somos a favor da união. Quando mais a gente for unido é melhor. O mais importante é a gente ter a certeza e defender algo que a gente acredite. Eu aprendi isso com meu pai, que quando é feito com coração tem o potencial de chegar e de tocar o nosso público.
BNews: Como os pares receberam a notícia dessa junção de vocês dois, desse novo projeto?
Davi Moraes: Então, alguns dos nossos amigos estão sabendo mais agora porque o projeto já oficializou. Mas tem uns que eu falei antes da gente já oficializar, e foi impressionante a alegria. E Márcio (Victor), com quem eu acabei de falar, foi um deles, um dos primeiros que comentei. Fizemos uma turnê maravilhosa tocando com Caetano, é um irmão. Sei a importância da revolução rítmica que ele fez aqui, a importância de um dos maiores percussionistas do mundo. Muita gente hoje vê Márcio como o cara de um ou outro sucesso de carnaval, que ele é, como líder de uma banda, de massa. Mas faço sempre questão de frisar que ele é um dos maiores músicos do Brasil, no topo. Contei também pra Saulo, pra Margareth, e eles ficaram numa alegria porque eles veem que tem a ver.
BNews: Talvez esse entusiasmo seja, além da questão da amizade, pela possibilidade de vocês representarem uma reoxigenação desse movimento musical na Bahia?
Davi Moraes:
Sim, sim. Quando eu falei pra Margareth, que há tanto tempo levanta essa história do AfroPop, né? Porque a música da Bahia é tão diversa, e às vezes uma coisa ou outra faz um sucesso maior e fica parecendo que somos uma linha só. Há milhões de estilos, cara. A gente estava falando aqui agora a diferença que é a levada do Olodum, pro Ilê, pra Timbalada. Aí Margareth falou pra juntar e fazer um negócio junto, e tal, com a galera que tem a ver com essa onda. A gente se identifica muito com essa onda da black music, Michael Jackson, James Brown, Ray Charles. Misturar isso tudo com percussão, com o afro. Tem essa identificação com Peu Meurray, com Magary (Lord). São esses caras que fazem música popular. É como Leitieres (Leite), que é um professor, disse, não existe o ritmo axé music. O que existe é uma diversidade incrível de ritmos a qual a gente se identifica.
Pierre Onassis: É mais um comportamento, é um estado de espírito. As pessoas se predispõem a ouvir essa diversidade que Davi citou.
Davi Moraes: Porque o rótulo até restringe a uma coisa muito menor do que é. Acho que os amigos ficaram felizes porque eles conhecem o trabalho do Pierre, conhecem o meu trabalho, e percebem de cara que vai ser legal, é uma coisa que soa bem na cabeça deles.
Pierre Onassis: Essa reoxigenação que você falou vai acontecer não porque queremos embutir isso nas pessoas. Vai acontecer naturalmente, é o que a gente tá propondo fazer. Davi falou de nossas influências eletrônicas, e por isso a gente tem um DJ que é o Mangaio, que traz influências eletrônicas. A gente já conhece o sabor, mas vamos colocar uma outra coisinha, porque também é obrigação nossa enquanto músicos antenados e visionários que somos. Temos que trabalhar na perspectiva de futuro, porque tudo vai passar. A gente precisa fazer o registro e dizer que “nesse tempo eu passei por aqui”. Meu filho vai crescer e vai lembrar que eu nessa época fiz isso, que marcamos esse tempo, que Davi estava junto.
Davi Moraes: Você tem, por exemplo, a guitarra baiana. Teve um tempo que a guitarra baiana estava com pouca representação. Armando preocupado, Aroldo preocupado porque não surgiram novos representantes da guitarra baiana. Aí começou a surgir mulheres tocando guitarra baiana, aí veio o BaianaSystem com Robertinho representando. E aí o que aconteceu? Fortaleceu até acontecer uma coisa curiosa: a primeira marca de cordas fabricou o encordoamento de guitarra baiana. Antes você tinha que comprar o encordoamento de guitarra pra colocar na guitarra baiana.
BNews: Em termos práticos, o Afroelétrico já está em estúdio, o que vem pela frente?
Davi Moraes: Estamos ensaiando todos os dias com um time da pesada, todo mundo com uma bagagem grande na música. Os caras estão entusiasmados e isso desperta as pessoas. Temos a perspectiva de fazer ensaios e seguir o caminho rumo ao Carnaval.
BNews: Tem algo confirmado pra o Carnaval que vocês possam adiantar pra nós?
Pierre Onassis:
A gente vai estar no carnaval, isso aí eu garanto. Mas está tudo muito no embrião.
BNews: Uma tendência dos últimos Carnavais é o trio sem cordas, que o poder público banca para o folião pipoca. Há a possibilidade de vocês embarcarem nessa onda e tocarem pra o povão no Centro, na Barra?
Davi Moraes: Desculpe, mas é que eu nunca toquei com corda. Eu nem sei o que é tocar com corda, então não vai ser agora que vai acontecer.
Pierre Onassis: Esse está mais familiarizado (risos).
Davi Moraes: Eu lembro um caso engraçado de quando começou a história de que todo mundo ia tocar sem cordas, e eu vim fazer mais um carnaval com meu pai. Aí perguntaram a meu pai como seria essa novidade. Ele disse: “como assim? Eu nunca levantei cordas, você vem dizer agora que vou baixar as cordas”. Aí eu vou reiterar que não tenho nada contra o trio de corda. Posso ter meu gosto, minha preferência, e sempre gostei de ir atrás dos trios que eu gostava, e sempre gostei muito mais de pular com o povo. O que eu tenho contra é a opressão, a violência que os cordeiros faziam com as pessoas na rua. E esse ano deu para perceber que as ruas estavam mais tranquila, com menos truculência.
BNews: Esse ano já houve uma diminuição muito grande no número de blocos, então talvez isso já tenha influenciado.
Pierre Onassis:
Já há esse pranchão, os trios mais baixinhos com a proximidade do público. Precisa haver uma predisposição da prefeitura, do governo, pra garantir isso. Alguém preciosa bancar porque há uma expectativa financeira muito grande em torno do Carnaval.
Davi Moraes: Até porque o cara toca quatro, cinco horas seguidas.
Pierre Onassis: O desejo é tocar para o povo, sem cordas. Eu fiz muito isso com o Olodum, com aquela massa. Tive também experiência com o Bom Balanço.
Davi Moraes: Eu acho que o turista vai continuar vindo. O que de repente fica desequilibrado é você ter um Carnaval feito quase 100% pro turista. Mas e o baiano? Eu uso até o exemplo do que fizeram nos estádios brasileiros após a Copa. A grande e verdadeira torcida, que sempre fez o futebol, foi excluída por causa dos preços hoje que são absurdos. Quem fez o negócios ser o que é, foi excluído. No carnaval, chegou uma hora que o cara vende todos os abadás e fica tranquilo. É bom a gente sair da zona de conforto e conquistar coisas diferentes. Você não precisar botar o abadá lá para vencer abre pra uma série de possibilidades como o Furdunço, o trio pranchão, a Rumplezz. E eu acredito que os turistas vão continuar vindo porque vai ver coisa bonita. E não precisa mais tanta preocupação com segurança porque não tem mais aquela briga dos cordeiros empurrando as famílias.
Pierre Onassis: O que acontecia é que as pessoas estavam deixando de ir ao Carnaval.
Davi Moraes: Tem também o lance de que as pessoas pagavam abadás caros, pacotes caros, então eles queriam ouvir o que eles queriam. Então, às vezes tinha uma ditadura onde estava todo mundo tocando a mesma música.
BNews: Já há um lugar definido para os ensaios do Afroelétrico?
Pierre Onassis:
A gente estava falando justamente sobre isso, sobre a falta de lugares em Salvador. Não há muitas opções.
Davi Moraes: Pierre fez um disco recentemente, eu também lancei um disco agora, então agora que a gente tá exatamente resolvendo isso. Tudo vai ser definido nesse decorrer de tempo.
BNews: Fala um pouco dessa participação com Trem de Pouso nesta quinta-feira (11).
Pierre Onassis: Vamos lá conferir essa junção de Ninha, Xexéu e Patrícia. Lá vamos deixar um aperitivo do que é o Afroelétrico. É uma satisfação muito grande estar lá com essa galera que é um registro da música baiana.
Davi Moraes: Queremos agradecer a eles por esse convite e dizer que é uma honra estar com eles. E com certeza a galera tem um aperitivo bom do Afroelétrico.

Classificação Indicativa: Livre

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