Entrevista

"É um rastilho de pólvora, não vai parar mais", diz Jandira Feghali sobre atos contra Bolsonaro

Imagem "É um rastilho de pólvora, não vai parar mais", diz Jandira Feghali sobre atos contra Bolsonaro
"Acho que o governo tem muitas crises, muitas contradições", avalia deputada federal  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 25/05/2019, às 23h59   Henrique Brinco


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A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) está otimista sobre a possibilidade de derrota da Reforma da Previdência no Congresso Nacional. Em entrevista exclusiva ao BNews, a comunista afirma que a insatisfação contra o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) deve crescer cada vez mais - sobretudo agora com os cortes de verbas nas instituições federais de ensino. 

Para a carioca, a decisão do minstério da Educação faz com que uma ampla frente, que não é necessariamente ligada a esquerda, se volte contra o Palácio do Planalto. A parlamentar, no entanto, revela certo ceticismo com a possibilidade de o vice-presidente Hamilton Mourão assumir a República no lugar do atual chefe do Executivo.

Sobre 2022, ela revela que ainda é cedo para fazer projeções. Entretanto, afirma que o ex-presidente Lula será sempre uma grande liderança e não descarta a possibilidade de o PCdoB fazer uma nova aliança com o PT. Ainda na entrevista, ela comenta a prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB) e analisa o imbróglio que toma conta da política na Venezuela.

Leia na íntegra:

BNews - Como a oposição pretende derrotar a Reforma da Previdência, já que tem número inferior ao governo, que também não tem maioria? Como é que vai ser o trabalho de convencimento?

Jandira Feghali - É isso. Lá ninguém tem número suficiente. Nem o governo para colocar 308 e nós também não temos os 206. Nem o governo, nem o centro e nem a oposição. Então, ali tem uma disputa de convencimento, mas o governo terá dificuldades, porque precisa dos 308 e nós não. Nós já temos de 135 a 140 e só precisamos somar 206. E nós estamos lutando lá dentro com os partidos de centro e com os movimentos sociais do Brasil inteiro. Agora, somada a luta da educação, que já estava na batalha contra a Reforma da Previdência, porque os professores são muito atingidos por ela. A juventude sabe que está sem perspectiva com a Reforma. E com essa luta em defesa da educação, acho que ganha muita robustez a luta que estamos fazendo. Então, eu estou apostando muito nessa compreensão que a sociedade vai tendo de que a Reforma é, de fato, uma crise que vai sendo gerada, e uma economia que vai sendo subtraída das pessoas que não têm para onde ir. Na verdade, é uma reforma sobre os mais pobres. Isso não é um discurso. É um dado, um fato. Quando o ministro Paulo Guedes foi a comissão, todos os dados que foram lá mostrados, que são poucos, é que de R$ 1,236 trilhão, R$ 1,12 bilhão é sobre os que ganham até 2 salários mínimos. Então, não é possível aceitar uma coisa dessa. Esta reforma não é aceitável.

BNews - O governo Bolsonaro tem jogado para a plateia que o corte nas universidades se dá pela "balbúrdia" instalada nas instituições federais. Como a oposição rebate esse argumento?

Jandira Feghali -  Ele agora cortou de todas as instituições federais, da educação brasileira em geral. Aqui na UFBA os cortes chegam a 52%. O que ele está fazendo é impedir que as escolas existam, funcionem. Está cortando a luz. Vai ficar sem luz, sem água... Está impedindo que os professores lecionem. Não precisa convencer ninguém. O povo já está na rua, a juventude já ocupou. Isso é um rastilho de pólvora, não vai parar mais. O dia 15 de junho, que seria o dia contra a Reforma da Previdência, agora ganhou uma robustez. Então, se o governo Bolsonaro achava que ia colocar a educação a favor da Reforma da Previdência, com discurso de contraposição das duas lutas, ele deu um tiro no pé. Ele somou as duas lutas. Se tem um lugar que tem frente ampla é a universidade, que diferentemente do que ele imagina é um lugar amplo. Não é só de esquerda. E muita gente das universidades que votou nele agora está na rua contra ele. Então, ele errou. Ali é amplo. Tem pesquisador, tem professor, tem o filho da classe média alta, da classe média, da classe menos favorecida, na negritude que nunca tinha entrado, tem os cotistas... Então, ele conseguiu fazer a frente ampla contra ele atingindo a educação brasileira.

BNews -  O vice-presidente Hamilton Mourão tem se aproximando da esquerda ao dar declarações e fazer acenos para pautas que são historicamente da esquerda brasileira. Ele é um lobo em pele de cordeiro?

Jandira Feghali - [Risos] Eu acho que o governo tem muitas crises, muitas contradições. Entre os militares, esse grupo olavista, desqualificado e desrespeitoso com os militares. Então, há muita batalha ali dentro. Nós não sabemos exatamente onde vai dar isso. Esse governo é uma usina de crises. Então, ali a gente não sabe no que vai dar. Acho que não temos que tomar parte entre essas brigas de Mourão e Bolsonaro. Não nos cabe tomar parte nisso. Nós uma posição contra o projeto que representa esse governo, que é um projeto de destruição do Estado brasileiro, é um projeto de retirada de direitos sociais e de muita restrição democrática. Esse decreto do porte de armas, além de ser inconstitucional, porque ele muda a lei por decreto, é um decreto que amplia enormemente a presença de armas na sociedade brasileira. Então, é um governo da morte, e não um governo da vida. Então, não vou tomar parte nas crises entre presidente e vice-presidente. 

BNews - Puxando a entrevista para a Bahia, circulam rumores cada vez mais fortes de que o governador Rui Costa quer ser candidato à Presidência da República em 2022. O PCdoB sempre foi aliado do PT. Ele é um nome que agrada ao seu partido ou o PCdoB seguirá com essa postura lançar candidato próprio?

Jandira Feghali - Olha, está tão longe 2022, né...

BNews -  Mas articulações já acontecem...

Jandira Feghali -  Acho que temos trabalhado hoje para unificar todo o nosso campo de esquerda e formar uma frente ampla, além de nós, contra o projeto que o governo Bolsonaro representa. Agora, as eleições de 2022, acho que muita água vai rolar. O PCdoB pode ter candidatura própria. Então, não dá hoje para definir nenhum tipo de posição diante de nada. Acho que hoje a nossa luta é para garantir direitos do povo, para manter o estado de pé, o estado brasileiro. Para garantir que o legado que a gente construiu durante tantos anos não se destrua. 

BNews -  Sobre política internacional, a Venezuela vive uma crise e o presidente autoproclamado Juan Guaidó tenhou assumir o poder diversas vezes. Como o PCdoB se posiciona diante desse caso?

Jandira Feghali -  Acho que nenhum país do mundo pode ter o seu destino definido de fora para dentro. Essa crise que está sendo incentivada pelo governo norte-americano de Donald Trump para dentro da Venezuela não é aceitável. O povo venezuelano é altivo, soberano e tem que decidir seu próprio destino. Ninguém pode se meter. E chega a ser ridículo alguém se autoproclamar presidente da República, né? O povo tem que decidir. O governo eleito é o de Maduro, gostem ou não.

BNews -  A prisão do presidente Michel Temer foi justa?

Jandira Feghali - Nós somos pelo estado democrático de direito e pelo devido processo legal. Na primeira prisão dele, nós manifestamos que o devido processo legal deveria ser respeitado. Ele foi solto depois, recorreu e agora o tribunal decidiu novamente prendê-lo. A gente precisa conhecer o processo direito para poder opinar. Então, não tenho opinar em um processo que eu não conheço por dentro. Houve já uma decisão em segunda instância, ele vai recorrer novamente. Eu não li o processo por dentro. Sempre fomos defensores do devido processo legal.

BNews - Lula continua sendo uma liderança forte para 2022?

Jandira Feghali - Lula sempre foi uma liderança forte e sempre será. Achei que a entrevista dele [para a Folha] foi uma entrevista de quem conhece o Brasil, de quem conhece política externa. E mostrou a grande diferença entre ele e quem está aí, né? E mostrou o motivo de estar preso: por ser essa grande liderança.

Fotos: Vagner Souza/BNews

Classificação Indicativa: Livre

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