Justiça

STF impede Bolsonaro de fechar conselhos criados com aval do Congresso

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Foi a primeira vez que o plenário do STF se debruçou sobre uma medida do atual governo   |   Bnews - Divulgação Nelson Jr./SCO/STF

Publicado em 13/06/2019, às 17h56   Folhapress


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O STF (Supremo Tribunal Federal) impôs nesta quinta-feira (13) uma derrota ao governo Jair Bolsonaro, ao impor limites ao decreto presidencial que visa eliminar uma série de órgãos colegiados da administração pública federal -como conselhos, comitês e comissões.

Todos os ministros da Corte entenderam que o presidente da República apenas pode fechar conselhos e comitês que tenham sido criados por decreto ou por outra norma infralegal.

Eles decidiram que Bolsonaro não pode suprimir estruturas que tenham algum amparo em lei (ou seja: que tenham passado pelo crivo do Congresso Nacional). Apesar de o resultado representar uma derrota para o Palácio do Planalto, o governo escapou de uma derrota ainda maior: dos 11 integrantes do STF, cinco queriam revogar integralmente o decreto editado por Bolsonaro em abril.

Prevaleceu, no entanto, o entendimento do relator da ação, ministro Marco Aurélio Mello, de apenas declarar inconstitucional um dispositivo da norma que abria brecha para que o chefe do Executivo também pudesse extinguir órgãos colegiados que são mencionados em lei.

Foi a primeira vez que o plenário do STF se debruçou sobre uma medida do atual governo. O pedido para que o decreto fosse anulado foi movido pelo PT. Os ministros ainda precisarão analisar o mérito da ação mais adiante, em data ainda não marcada.

O decreto 9.759 de 2019 determina o fim de colegiados criados por decretos ou por medidas administrativas inferiores. Também estavam inclusos na medida órgãos mencionados em lei, mas cujo texto não especifica quais seriam suas competências e composição -não se sabe quantos colegiados se incluem nessa definição, que deve abarcar parte considerável dos conselhos. Estima-se, entretanto, que não sejam a maioria.

Nesta quarta-feira (12), quando o placar estava cinco a quatro para derrubar integralmente o decreto de Bolsonaro, o julgamento foi adiado em razão de um pedido de vista do presidente do STF, ministro Dias Toffoli.

Retomado o julgamento nesta quinta-feira, tanto Toffoli quanto Gilmar Mendes defenderam anular apenas parcialmente o texto, invertendo o placar.

Os ministros favoráveis a derrubar todo o decreto argumentaram que ele determina, de forma vaga, o fechamento indiscriminado de diversas estruturas da administração pública federal no próximo dia 28.

De acordo com eles, isso traz insegurança jurídica para a administração pública.

"A extinção indiscriminada de todos os conselhos, sem a identificação nominal de qualquer um deles –quando têm naturezas e funções diversas– tem um nível de opacidade e obscuridade; e impede o Congresso Nacional e a sociedade de saberem exatamente o que está sendo feito", disse, em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso.

Além de Barroso, votaram pela suspensão total do decreto os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de Mello.
A tese menos abrangente -que acabou vitoriosa- foi endossada por Marco Aurélio, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux, além de Mendes e Toffoli.

"Qualquer processo pretensamente democrático deve oferecer condições para que todos se sintam igualmente qualificados para participar do processo de tomada de decisões", disse Marco Aurélio.

O decano da corte, Celso de Mello, aproveitou seu voto para criticar o que chamou de "utilização excessiva de decretos". "Esse comportamento minimiza perigosamente a importância político-institucional do Poder Legislativo", afirmou o ministro.

O decreto analisado pelo STF estabeleceu que a partir de 28 de junho deixarão de existir uma série de colegiados da administração pública.

O texto não nomeou individualmente quais estruturas serão eliminadas, mas trouxe uma redação genérica que, segundo especialistas, coloca em risco estruturas como a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo, Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, Comitê Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, e o Conselho Nacional do Idoso e Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, entre outros.

Em maio, Bolsonaro determinou o fechamento de uma primeira leva de mais 50 colegiados. Entre os órgãos eliminados, está o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o chamado Conselhão, que fazia a interlocução dos setores empresarial e sindical com o Palácio do Planalto desde 2003.

Na ação levada ao Supremo, o PT apresentou quatro argumentos principais: o primeiro é que o presidente da República não tem atribuição para criar ou extinguir órgãos públicos. O segundo é que um decreto não tem o condão de alterar disposições previstas em lei -como é o caso de alguns conselhos.

O partido também sustentou que, ao não especificar quais colegiados serão atingidos, o decreto violou o princípio da segurança jurídica, pois criou incertezas na administração pública.

Por fim, a sigla disse que a extinção de instituições que permitem a democracia participativa viola o princípio constitucional da participação popular."Temos um decreto que fere a Constituição porque excede claramente as competências que a Constituição entrega à Presidência da República", disse o advogado do partido, o ex-ministro Eugênio de Aragão, na quarta-feira.

"Não pode o presidente da República, sem ouvir o Congresso Nacional, extinguir os órgãos da administração. Ele pode dispor sobre o funcionamento da administração, mas a extinção de órgão está na reserva legal", acrescentou.

O advogado-geral da União, André Mendonça, que fez a defesa do governo no Supremo, também na quarta-feira, negou que o decreto tenha como objetivo desmontar a participação social na elaboração de políticas públicas. Para ele, trata-se de um tema de racionalização e de eficiência da administração pública.

De acordo com Mendonça, a Secretaria Especial de Desburocratização, do Ministério da Economia, identificou a existência de 2.593 colegiados no âmbito da administração pública, "muitos dos quais inativos e inoperantes há muito tempo."

"O cerne da questão é a boa governança pública, da racionalidade administrativa e o princípio da eficiência. Garantindo-se a participação da sociedade civil na construção das políticas públicas", disse o advogado-geral da União.

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