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Mudança do Garcia é sentimento muito além do desfile

Roberto Viana
Dizem que a passagem do bloco é "irreverência". Na verdade, é pura "sacanagem"  |   Bnews - Divulgação Roberto Viana

Publicado em 11/02/2013, às 22h27   Lucas Esteves (Twitter: @lucassteves)


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Quem acompanha Carnaval pela TV ou tem coragem apenas de encarar a concentração da folia no Campo Grande só conhece a Mudança do Garcia pela invasão do circuito principal, com bandinhas, animação e críticas sociais e políticas. Mas a Mudança é muito mais do que isso, porque vem dos recônditos do bairro. Dá para se analisar nos clichês. Enquanto para as transmissões o bloco é uma demonstração de “irreverência”, a realidade não tem nada a ver. A Mudança do Garcia é pura “sacanagem”.
Quem quer acompanhar a verdadeira Mudança do Garcia tem que acordar cedo, encarar o transporte e chegar ao fim de linha rapidinho sob pena de perder os detalhes. Nove da manhã já pode ser considerado tarde, pois a movimentação é grande desde já no famoso restaurante Aconchego da Juju, da falecida cozinheira Juju, figura querida do Garcia e de toda Salvador. Com vizinhos, admiradores e bebedores ocasionais, Juju concentra o sentimento inicial da Mudança, que começa a invadir o bairro e lota os corredores do estabelecimento com algumas das mais interessantes figuras da folia.
Saindo da Juju, não dá para segurar os abraços doa amigos, as brincadeiras entre quem está concentrado, as bandinhas em cacofonia e a decisão dura relativa a que espaço ocupar. No calor eterno da Segunda de Carnaval, jamais chove na Mudança. Então, a solução para afastar o calor mercuriano é quebrar aquela gelada e fazer a resenha: a do ano passado e da projeção deste agora. E se preparar para a saída longamente atrasada e acalentada, mas garantida.
Famosa por ser também uma movimentação política, a Mudança do Garcia recebe muitos políticos, que individualmente estabelecem blocos adicionais, com bandinhas, faixas e gritos de protesto, mas sempre dosados entre a cerveja e os sorrisos. E quem desce para o fim de linha do bairro sabe que a conjugação dos verbos “brincar” e “protestar” é idêntica. E leva muito até esta união alcançar a Avenida. Afinal, antes de tudo, a Mudança é do Garcia e, depois, da capital. Pra que a pressa?
Neste meio-tempo, há espaço para todas as manifestações. Das discordantes mas conviventes, como a recente cisão PT-PV, às novas alas petistas e comunistas que protestam contra a política da presidente Dilma Rousseff, aliada, mas “inimiga”. Gritos contra tentativas de privatizações, desvalorizações de categorias de servidores federais, apelos de investimentos de PIB e recursos do pré-sal, ironia à nova política do prefeito da capital. A Mudança não é o Papa, mas não poupa ninguém. Nem o repórter, acusado de “delator”.
Por volta de meio-dia chega, enfim, a esperada hora. A Mudança ruma do fim de linha do bairro e sai “imparável” pelas ruas do bairro em direção ao Campo Grande, que jamais tem forças para segurar os foliões, com o sol na cabeça e animação lá em cima. Um incauto passou de carro e levou tantos tapas no para-brisa que se irritou, mas ganhou cerveja de presenta para se acalmar. O trajeto ao longo do bairro é o mais divertido, com aperto nas ruas, os risos dos companheiros e a bênção do morador mais ilustre do bairro, o sambista Riachão, isolado no “camarote” de casa devido à idade já avançada.
A chegada no Campo Grande é a confirmação de que a Mudança é e sempre será uma tradição inesgotável do Carnaval de Salvador. A força do bloco está contida nas palavras do criador do bloco, Lourival Chaves, que um ano antes já projeta o Carnaval do ano que vem. Ciente de que o prefeito ACM Neto programou para 2014 dois carnavais, o articulador não perde tempo e “cola na corda”. “Se ano que vem Salvador vai ter dois carnavais, é claro que vai ter duas Mudanças. Oxe!”

Classificação Indicativa: Livre

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