Coronavírus

Pressionado por Maia e governadores, Senado deve frustrar Guedes em pacote a estados

Agencia Senado
Pacote defendido pelo governo soma R$ 77,4 bilhões, sendo R$ 40 bilhões de repasses diretos a estados e municípios  |   Bnews - Divulgação Agencia Senado

Publicado em 15/04/2020, às 05h27   Folhapress


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Defendida pela equipe econômica, a estratégia de insistir em um pacote mais enxuto de socorro aos estados na crise do novo coronavírus deve esbarrar na articulação de governadores no Senado. A Casa no Congresso representa os estados.

Chefes de Executivos estaduais recorrem a aliados pela liberação de dinheiro para cobrir até despesas obrigatórias, como salários. O recuo da economia neste ano já afeta as contas de governadores e prefeitos.

Líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO) disse que a votação expressiva da Câmara, que aprovou um plano de ajuda mais amplo nesta segunda-feira (13), não pode ser desprezada.

Sob críticas do governo e de economistas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conseguiu aprovar, por 431 votos a 70, o projeto de auxílio mais vantajoso a governadores e prefeitos. O plano não exige medidas de ajuste nas contas públicas, como controle das despesas com servidores.

Nesta terça, um dia após a derrota, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se reaproximou do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para tentar costurar na Casa uma solução. "Conversei com ele [Alcolumbre] esta manhã [terça]. Vai votar, mas não deve ser nesta semana", afirmou Bolsonaro.

Vetar um projeto de socorro ao enfrentamento da pandemia teria um desgaste político muito alto. O veto foi sugerido pelo ministro Paulo Guedes (Economia) caso o governo não consiga desidratar a proposta encampada por Maia.

O ministro insiste em uma versão que prevê uma transferência de recursos menor que a definida pela Câmara e, em troca, amplia a suspensão de pagamento de dívidas com a União e com bancos federais.

O pacote defendido pelo governo soma R$ 77,4 bilhões, sendo R$ 40 bilhões de repasses diretos aos estados e municípios, ou seja, dinheiro no caixa de governadores e prefeitos para o enfrentamento da crise.

A proposta da Câmara teria um impacto de R$ 89,6 bilhões, sendo que R$ 80 bilhões seriam de compensação da União pelas perdas de ICMS (imposto estadual) e ISS (municipal) diante da crise econômica, segundo cálculos de líderes.

Alcolumbre passou a negociar com o governo o envio de um projeto para substituir o texto aprovado pelos deputados. A ideia é manter alguns dispositivos da proposta da Câmara, como a suspensão das dívidas com bancos públicos.

O presidente do Senado também sinalizou que espera um aceno de Maia no sentido de votar medidas já aprovadas pelos senadores, como a ampliação do auxílio emergencial (R$ 600) e de crédito para micro e pequenas empresas.

"Não vamos pautar o projeto que eles [deputados] votaram ontem. Agora é princípio da reciprocidade", disse Alcolumbre.

Se o Senado não apresentar um novo projeto e fizer alterações na proposta encaminhada pela Câmara, a palavra final é dos deputados que tendem a manter um pacote aos estados mais amplo do que deseja o Ministério da Economia. Maia trava um embate com Guedes e ministros que cuidam da articulação política desde a semana passada.

O governo chegou a abrir canal de negociação direta com líderes da Câmara, escanteando o presidente da Casa, que assumia a linha de frente do plano de socorro.

As críticas a Maia não cessaram mesmo após ele recuar na ideia de ampliar a margem de endividamento dos governadores (inclusive os que já estão com baixa capacidade de pagamento) e abrir mão de um dispositivo que poderia beneficiar o estado do Rio de Janeiro, em recuperação judicial.

A proposta do presidente da Câmara privilegia os estados do Sul e Sudeste na distribuição do dinheiro. Segundo estimativas da equipe econômica, 60% da transferência direta da União para recompor ICMS iria para Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, além de Rio de Janeiro e São Paulo.

Nesses dois últimos estados, os governadores WIlson Witzel (PSC-RJ) e João Doria (PSDB-SP) tentaram se capitalizar politicamente com a pandemia ao assumir posicionamento público contra a postura de Bolsonaro no combate ao coronavírus.

Maia se alinhou a ambos, sustentando ainda um modelo de divisão de recursos menos vantajoso ao Norte e Nordeste. Para o governo, o amplo repasse a governadores desestimularia o fim de medidas restritivas por causa da Covid-19 e que, na avaliação de Bolsonaro, estendem a crise econômica.

Nesta terça, Maia contestou a contraproposta do governo e acusou a equipe econômica de usar dados distorcidos para atacar o projeto aprovado pelos deputados.

"O que o governo quer fazer, do meu ponto de vista, é criar um conflito político federativo que deveria ser deixado para outro momento. As eleições nacionais acontecerão em 2022."

Para o presidente da Câmara, a conta do governo de oferecer R$ 40 bilhões de repasses diretos a estados e municípios está inflada, pois contabiliza recursos destinados à saúde. Segundo ele, a ideia tem que ser manter o funcionamento da máquina pública em tempos de forte retração na receita.

A equipe econômica questiona o período da ajuda a governadores e prefeitos. O projeto da Câmara prevê repasses por seis meses. O governo defende três meses, mesmo intervalo previsto para socorro a trabalhadores informais e empresas paralisadas.Guedes estima que R$ 40 bilhões são necessários para suprir a demanda na crise.

Porém, esse valor poderia ser elevado após avaliação a ser feita em meio à pandemia.

O modelo de repasse aprovado pela Câmara é baseado na compensação de ICMS e ISS. Ou seja, dependerá da queda em cada mês registrada pelos estados e municípios.

Assim, o governo federal transferiria o valor para que a arrecadação permaneça no mesmo patamar do ano passado. Para a equipe econômica, isso não dá previsibilidade de gastos.

Segundo o Ministério da Economia, em caso de queda de 10% da receita, o gasto seria de R$ 30 bilhões (por seis meses). O desembolso subiria para R$ 85,5 bilhões em seis meses de receita 30% menor. Se a arrecadação cair pela metade, o gasto seria de R$ 142,5 bilhões, nos termos do projeto aprovado pela Câmara.

Para o coordenador do Comsefaz (Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda), Rafael Fonteles, o plano aprovado na Câmara atende apenas a uma parte das necessidades dos governadores e prefeitos.

"Estados e municípios precisam de muito mais recurso", disse.

Fonteles defende ampliação do limite de endividamento, mais repasses do governo federal, novas linhas de financiamento, além da postergação do pagamento de empréstimos internacionais e precatórios (dívidas a pessoas físicas ou empresas por decisão judicial).

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