Justiça

Por receio de que operação Panaceia fosse prejudicada, MP-BA chegou a pedir prisão de filho do presidente da Fecomércio

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Empresas do ramo de medicamentos investigadas foram criadas tendo familiares de Carlos Andrade Júnior em seu quadro societário, aponta Sefaz-BA  |   Bnews - Divulgação Divulgação/MP-BA

Publicado em 22/06/2021, às 18h52   Marcos Maia


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O Ministério Público da Bahia (MP-BA) solicitou a decretação da prisão temporária de Carlos Andrade Júnior, filho do presidente da Fecomércio, Carlos Andrade, no âmbito da operação Panaceia, deflagrada na manhã da última segunda-feira (21).

A investigação apura um esquema de sonegação de impostos operado por um grupo de empresas. Estima-se que o prejuízo ao erário estadual seja na ordem de R$ 39 milhões - ou mais, além de fraudes à receita federal. Referenciado pelo parquet como um dos principais operadores de uma associação criminosa, o pedido de prisão considerava que ele poderia atrapalhar as investigações. 

No pedido, os procuradores do Grupo de Atuação Especial de Combate à Sonegação Fiscal (Gaesf) do MP-BA argumentam que, caso Carlos Júnior estivesse em liberdade, “sobretudo nas horas e dias seguintes à deflagração da operação de busca e apreensão”, ele poderia “influir decisivamente” nos trabalhos da força-tarefa.

Na avaliação dos membros do parquet, ele poderia agir para se desfazer de documentos e influenciar co-autores e testemunhas ,” dentre os quais parentes de seu ciclo familiar, que ainda atuam como integrantes formais de pessoas jurídicas investigadas".

Com base na análise de apurações realizadas pela Secretaria da Fazenda da Bahia (Sefaz), o órgão contabilizou mais de quatro empresas do ramo de medicamentos criadas tendo familiares de Carlos Júnior em seu quadro societário.

Até o momento, foi apurado que um grupo de empresários adotava a prática de criar outras empresas - em nome de "laranjas”, sem a capacidade econômica suficiente para gerir esses negócios - que eram utilizadas para viabilizar a sonegação de impostos.

Início

Duarante coletiva de imprensa realizada na manhã da última segunda (21), a titular da Inspetoria Fazendária de Investigação e Pesquisa (INFIP) da Sefaz, Sheilla Cavalcante Meirelles, contou que as investigações tiveram início em 2010, com a observação da empresa Milllenium Farma Distribuidora de Medicamentos.

Um relatório de inteligência fiscal produzido pela Sefaz, e citado pelos procuradores, reportou que, entre as atividades da organização, haviam "indícios de sucessão empresarial dentro do mesmo segmento de atividade empresarial, deixando para trás valores expressivos de débitos tributários, após abertura de nova empresa concomitante ou sucessória à anterior".

Constituída em junho de 2000, a Millenium iniciou suas atividades com capital social de R$ 100 mil, tendo como sócios Sandro dos Santos Andrade, irmão de Carlos Júnior, e André Luís Branco Freitas. "Nesse ínterim, houve uma sucessão atípica do quadro societário deste empreendimento comercial, com oito alterações em apenas cinco anos de constituição", narra o documento.

Segundo o relatório citado pelo MP-BA, a composição também contou com Carlos Júnior. Restam como sócios atuais da empresa Gilvanei dos Santos Souza e Luiz Carlos de Jesus Filho - ambos classificados como "pessoal totalmente desprovido de capacidade econômica". Ao último cabe, de acordo com o documento, a administração da empresa. 

Atualmente, a situação cadastral junto à Receita Federal tem situação "baixada" desde fevereiro de 2015, com um débito tributário superior a R$ 3 milhões. As apurações indicam que Carlos Júnior foi sócio da empresa em dois períodos distintos - de 2 de março de 2001 a 16 de junho de 2002 e de 27 de dezembro de 2002 a 7 de março de 2003.

A Fazenda apurou ainda, entre outros indícios de fraude, que os endereços dos atuais sócios da Millenium estão "localizados em áreas de invasão".

"[...] As habitações apresentam condições precárias para moradia - situação incompatível para quem, em tese, dispões de R$ 100 mil para a aquisição de cotas do capital social de uma empresa", diz a peça. 

Da mesma forma, as investigações apontam que Luiz Carlos não fez menção à propriedade de cotas de capital da empresa em sua declaração de imposto de renda.

Parentescos

As apurações também investigam o vínculo da Millenium com outras empresas do ramo, tomando por base a relação de parentesco entre sócios. Neste sentido, os procuradores se concentraram no caso de duas organizações.

Sendo a primeira delas, a Mecfarma Distribuidores de Medicamentos, com capital social de R$ 60 mil e sócios inaugurais André Luiz Bispo dos Santos e Josualdo Domingues Santos. Atualmente, ela está com a situação cadastral "baixada" na receita federal em outubro de 2018 sob a situação de "inexistente de fato", ainda existe um débito tributário superior a R$ 21 milhões. 

"Observou-se que o capital Social da empresa aumentou em 1.233,3%, alcançando o valor de R$ 800 mil, sucedendo-se neste meio tempo como sócios, de forma concomitante, e, ou, sucessiva, Carlos de Souza Andrade Júnior, Adinalva dos Santos Andrade e Sandor Luiz da Conceição Duarte, cabendo a este, por último e antes de sua extinção, a administração da empresa, conforme disposição contratual", narra o documento.

As investigações apontam que a mãe de Sandro e Carlos Júnior, Adinalva dos Santos Andrade, também figurou como sócia da Millenium e da Mecfarma em períodos sucessivos à saída e ingresso dos filhos. 

Carlos Júnior, inclusive, figurou na qualidade de sócio administrador da Mecfarma, entre dezembro de 2004 e julho de 2010, e foi alvo da operação Carcará.

A ação, realizada em novembro de 2010, tinha como objetivo desarticular uma organização criminosa voltada à prática de crimes contra a Administração Pública Federal em ao menos 21 municípios baianos, em procedimentos licitatórios que visavam à aquisição de merenda escolar e medicamentos, entre outros.

Segundo informe da Sefaz, Carlos Júnior ingressou na sociedade da Mecfarma em dezembro de 2004, adquirindo 95% do capital social - os outros 5% foram comprados por Sandro Luiz em outubro de 2005. Também segundo o documento, o contrato de locação da sede da empresa foi representado por Sandro, tendo seu pai, Carlos Andrade, como fiador.

Após sucessivos aumentos de capital entre 2007 e 2009, a Mecfarma Distribuidora alcançou o patamar de R$ 800 mil. Posteriormente, em julho de 2010, Carlos Júnior transferiu suas cotas para sua mãe. Em setembro de 2015, ela transferiu 45% de suas cotas para Sandro. Assim, ambos passaram a ter 50%.

Em 2018, ele adquiriu as cotas da mãe, tornando único sócio da empresa que na época tinha um capital social de R$ 800 mil. Antes disso, em outubro de 2015, Sandro outorga poderes de representação e administração da Mecfarma ao irmão, renovando sucessivamente as procurações até 2019. 

Outra Empresa

Também é citada a Andrade Tales Distribuidora de Medicamentos, cujo endereço era o mesmo utilizado pela Millenium e pela Mecfarma. 

Tendo como atividade principal o comércio atacadista de medicamentos, a Andrade Tales iniciou suas atividades com capital social de R$ 30 mil, tendo como um dos sócios Geraldo Andrade Filho, primo de Carlos Júnior e Sandro. 

"Observou-se que o capital social da empresa aumentou em 6566,7%, alcançando o valor de R$ 2 milhões", destaca o parquet.

Entre os três sócios restantes da empresa estava Ana Patrícia Querino Andrade Viana, irmã de Geraldo. Da mesma forma, a mãe de Carlos Júnior e Sandro também compôs o quadro societário da Andrade Tales como sócia/administradora. 

Atualmente, a situação cadastral desta empresa consta como "inapta" junto à Receita desde junho de 2013, por "localização desconhecida", possuindo um débito tributário estadual de mais de R$15.500 milhões.

O parquet contabilizou, além destas duas, outras quatro empresas do ramo de medicamentos criadas tendo em seu quadro societário familiares dos irmãos Andrade. A delegada da Polícia Civil, Márcia Pereira, que conduz as investigações, estima que o inquérito em andamento sobre a operação Panaceia deve ser finalizado em 30 dias.   

A partir daí, o MP-BA avaliará a necessidade de deflagrar - ou não - uma ação penal correspondente aos crimes imputados aos acusados.

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