Justiça

Impeachment x Democracia

Publicado em 10/12/2015, às 07h30   Marcelo Junqueira Ayres*


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A democracia no Brasil é nova, em fase de formação e constante aperfeiçoamento. Por essa razão, devemos ficar vigilantes para não permitir o desvirtuamento do Estado Democrático de Direito, que tem na sua maior expressão a Soberania Popular, preconizada, de plano, no primeiro artigo da nossa Constituição Federal, segundo o qual: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
Assim, o maior de todos os poderes é o do povo, que o expressa através do voto secreto e direto, com valor igual para todos, conforme previsto no artigo 14 da Carta Magna. 
O resultado das eleições é a principal manifestação da soberania popular, é a exteriorização do poder da população, que legitima o representante mais votado a exercer o mandato eletivo, não importando se essa escolha se deu com diferença pequena ou grande de votos.  
O mais votado passa a ter legitimidade e deve governar para todos, independente de quem o tenha escolhido. Ou seja, o exercício do seu mandato passa a ser legal, válido, puro, perfeito e regular, traduzindo-se na vontade da maioria da população, que deve ser respeitada, sob pena de afronta a princípios constitucionais comezinhos, que servem de sustentáculo para democracia de um País.
As eleições para presidente no Brasil ocorrem a cada quatro anos, e a interrupção de um mandato legítimo só pode se dar com base e fundamento legais, não sendo permitido rupturas por critérios políticos ou em decorrência de eventual crise econômica do País.    
O pedido de Impeachment da atual presidente atenta contra a soberania popular e democracia, por não estar respaldado em qualquer das hipóteses autorizadas por Lei, que só admite tal medida drástica e excepcional, em casos de crimes dolosos de responsabilidade, previstos no artigo 52 da CF e na Lei 1.079/50, os quais, até então, não restaram configurados.
Uma fato é a corrupção endêmica existente no Brasil, revelada na Petrobrás e empresas privadas, onde os responsáveis, sejam agentes públicos, políticos ou não, estão sendo processados e punidos. Neste caso, não há prova de envolvimento da Presidente da República.
De outro lado, estão as chamadas “pedaladas fiscais”, realizadas por Presidentes que governaram o País nos últimos 25 anos, inclusive, conforme noticiado, realizado também pelo atual vice presidente, quando esteve no exercício do mandato, e que não podem ser entendidas como crimes dolosos de responsabilidade, mas, tão somente, como infrações contábeis, já que não há furto ou desvio de dinheiro público.  Ao contrário disso, trata-se de manobra financeira que visa, justamente, destinar esses recursos, em sua integralidade, ao atendimento de programas sociais existentes no País.   
Por essa razão, diante dos argumentos frágeis utilizados para a retirada de um presidente do seu mandato legítimo, outorgado pelo poder do povo, é que se revela atentatório à democracia e a soberania popular, com viés eminentemente político, ainda mais quando assumiria em seu lugar, vice presidente que não recebeu um único voto direto da população, e também teria cometido o mesmo ato infracional de “pedalada”, alegado erroneamente no pedido de impedimento como sendo crime doloso de responsabilidade.  
Marcelo Junqueira Ayres* é pós graduado em Direito Processual Civil e Público, e juiz titular do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia.

Classificação Indicativa: Livre

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