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Após Lava Jato, Odebrecht busca agora saída para dívida de R$ 80 bilhões

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Nesses últimos quatro anos, o conglomerado vem se sustentando basicamente com recursos próprios  |   Bnews - Divulgação Reprodução

Publicado em 21/05/2019, às 11h02   Redação BNews


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O grupo Odebrecht enfrenta a mais difícil crise de liquidez desde que a Operação Lava-Jato colocou-o sob os holofotes das ações de combate à corrupção no Brasil, há quatro anos. A companhia precisa de um fôlego de R$ 1 bilhão para, por mais um ano, manter suas atividades funcionando, enquanto tenta se reorganizar financeiramente. Segundo o site Valor Econômico, os recursos, porém, não são para cobrir dívida, e, sim, para o funcionamento cotidiano das empresas, incluindo os pagamentos devidos ao Ministério Público (MP).Exceto a petroquímica Braskem, que possui vida própria, e a Ocyan, que finalizou uma recuperação extrajudicial em 2017, os demais negócios estão inadimplentes no serviço e na amortização das dívidas há pelo menos seis meses, já em conversas com os credores para uma saída.

Apesar do aperto, a direção do grupo acredita que encontrará as soluções necessárias para a liquidez. Ao Valor, a companhia afirmou em nota que "depois de três anos de profunda transformação, em que reconheceu erros, mudou governança, aprimorou sistemas, está concentrada na reestruturação de dívidas de algumas de suas empresas controladas e na busca de eficiência e excelência de outras que estão em fase de crescimento." O grupo diz estar "confiante no avanço das negociações, que são complexas e demandam tempo".

Nesses últimos quatro anos, o conglomerado vem se sustentando basicamente com recursos próprios - tanto para rodar as operações quanto para honrar compromissos financeiros - e sucessivos alongamentos da dívida. De um programa para obter R$ 12,5 bilhões, o grupo levantou R$ 7,5 bilhões com venda de ativos.

Além disso, a holding Odebrecht S.A. (ODB) assumiu a participação de sócios em vários negócios, que preferiram desfazer a sociedade, e fez sozinha frente aos aportes necessários nesse período. Mas o fôlego chegou ao fim, segundo diversas fontes ouvidas pelo Valor.  O objetivo para 2019 ainda é deslanchar uma ampla reorganização financeira, a partir de cada negócio, para ajustar a dívida de cada um à sua realidade de geração de receita, tentando, dessa forma, evitar que a própria ODB chegue a uma recuperação judicial.

Mas esse plano não está se concretizando na velocidade planejada. E o risco na holding aumenta a cada dia. A RK Partners trabalha no desenho de soluções possíveis para o grupo, inclusive para uma eventual recuperação judicial, se necessária, desde o fim de 2018.

A expectativa é que, nos próximos meses, várias empresas tenham que entrar em recuperação extrajudicial ou até judicial. Entre elas a Atvos, de açúcar e álcool, a própria construtora Odebrecht Engenharia e Construção (OEC), por conta da reorganização de US$ 3 bilhões em bônus emitidos fora do Brasil, o estaleiro Enseada e provavelmente a incorporadora e construtora OR, antiga Odebrecht Realizações. Esse risco também assombrou a Odebrecht TransPort (OTP), diante da demora na aprovação da venda da SuperVia à Mitsui pela Caixa, mais precisamente pelo FII-FGTS, sócio no negócio.

Os compromissos financeiros do grupo, já descontados os de Braskem, são da ordem de R$ 80 bilhões. É mais do que os R$ 65 bilhões consolidados na ODB - desconsiderada a petroquímica - devido à existência de negócios nos quais a Odebrecht é a maior acionista, ainda que não seja controladora, e operações fora do Brasil.

Do total devido, R$ 40 bilhões são com os seis maiores bancos nacionais. No plano de reestruturação, inicialmente, não se pretende considerar essa dívida de forma agregada, mas sim reorganizá-la nas suas controladas. Mas colocar essa estratégia em prática está mais difícil do que se pensava. Por um lado, o tamanho da exposição do grupo evita ou posterga um colapso, que não interessa a nenhum dos grandes credores. Os bancos nacionais têm nas mãos garantia para apenas R$ 12,7 bilhões do total dos créditos, em ações da Braskem. 

Mais de R$ 27 bilhões não têm cobertura - seria, para o sistema financeiro, um volume de crédito inadimplente muito maior do que o de qualquer outra companhia que já tenha tido problemas no Brasil. 

Mas a outra face dessa moeda é que a relação da Odebrecht com os bancos públicos - Caixa, Banco do Brasil e BNDES - tornou-se difícil pós-Lava-Jato, o que agrava a situação. Além disso, essas instituições não têm atuado de maneira coordenada, como já foi no passado. Há divergência e demora na aprovação de reorganizações, propostas e negócios, relatam diversas fontes. Em comum, apenas elas têm o temor do escrutínio do Tribunal de Contas da União (TCU) em relação a quem conduz as negociações. Daí, a lentidão.

Após superar a fase de acordos de leniência e criação de uma estrutura de governança, o foco passou à questão financeira, e o caso mais urgente dentro do sistema era o da Atvos, de açúcar e álcool.

No começo do ano, foi feito um plano para cortar a dívida de R$ 11 bilhões na empresa de agronegócio pela metade. A outra metade seria convertida numa debênture de participação de resultado. O modelo esbarrou no BNDES e mais outro credor, que só aceitavam a estrutura com um novo dono. A negociação de venda, contudo, não ocorrerá no tempo que a empresa precisa. Para complicar, o fundo Lone Star, credor com penhor sobre a cana, após fornecer capital de giro no começo de 2018, obteve nesta semana uma vitória na Justiça, onde tenta executar sua cobrança. A decisão exige da Atvos o depósito de cerca de 65% das vendas de álcool em favor do fundo.

Com isso, o projeto de uma reorganização definitiva para o futuro da sucroalcooleira, com corte no valor da dívida, teve de ser adiada. A saída, por ora, será uma recuperação extrajudicial apenas para alongamento das dívidas, incluindo carência para juros. A redução nos compromisso dependerá da existência de um novo controlador. Em 2016, a companhia já tinha alongado os vencimentos. Mas, os juros continuaram pesados e, em dois anos, a empresa ficou novamente inadimplente.

Devido às dívidas, a venda dos negócios do grupo não é simples - Atvos, OR, Ocyan, OEC, Latinvest, OTP, OR, Enseada e Usina Santo Antônio. Alguns terão de ser liquidados, como é a expectativa para o estaleiro. 

Dentre os ativos, a Braskem é o único com valor positivo relevante - nos demais a dívida é incompatível com a operação. Não por acaso, a petroquímica têm sido o muro de arrimo de todo o conglomerado. O ativo sobre o qual a empresa conseguiu alongamentos de dívidas e até novos recursos.

Há 15 meses, o grupo negocia a venda da Braskem ao grupo holandês LyondellBasell. As ações detidas na petroquímica estão dadas em garantia a cinco dos seis credores nacionais - Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, BNDES e Santander.  

Confira nota da Odebrecht na íntegra:
"Depois de três anos de profunda transformação, em que reconheceu erros, mudou governança, aprimorou sistemas e processos internos, uniu seus integrantes sob o compromisso de atuar sempre com ética, integridade e transparência e colabora com as autoridades em vários países, a Odebrecht está concentrada, atualmente, na reestruturação de dívidas de ade dívidas de algumas de suas empresas controladas e na busca de eficiência e excelência operacional de outras que estão em fase de crescimento e identificação de oportunidades de reinvestimento de resultados. 

Nesta fase, a holding Odebrecht S.A. e as empresas controladas OEC e Atvos negociam com credores condições adequadas para manter o equilíbrio entre geração de valor e o nível de endividamento. 

O Grupo está confiante no avanço das negociações, que são complexas, demandam tempo e, como ocorre em temas dessa natureza, estão sujeitas a interpretações ou especulações. 

Ao mesmo tempo, o Grupo se dedica também a fazer desde já um planejamento estratégico de longo prazo para atuais e futuros negócios. A Odebrecht acredita que a sociedade se enriquecerá com negócios inovadores e transformadores. 

As realizações das próximas gerações só serão possíveis se o mundo evoluir para um modelo com menos desperdício de recursos naturais, menos emissões de carbono e mais energia renovável. Um mundo em que as cidades, por exemplo, sejam mais inteligentes e a infraestrutura contribua para melhorar a qualidade de vida e reduzir as desigualdades sociais. 

Ao mesmo tempo em que se empenha para superar as dificuldades atuais, a Odebrecht está de olho nesse horizonte de infinitas possibilidades, certa de que esta será uma parte do seu futuro."

Classificação Indicativa: Livre

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