Educação

Dia do Escritor: Jovens escritores baianos despontam na literatura

Divulgação/Cultura RJ
Além de ser oportunidade para exaltar grandes nomes, o Dia do Escritor também abre espaço para mostrar novos talentos  |   Bnews - Divulgação Divulgação/Cultura RJ

Publicado em 25/07/2022, às 06h00   Daniel Brito


FacebookTwitterWhatsApp

Hoje, 25 de julho, é comemorado no Brasil o Dia Nacional do Escritor. A data comemorativa teve sua origem em 21 de julho de 1960, ou seja, quatro dias antes, quando o então ministro da Educação e Cultura, Pedro Paulo Penido, assinou um documento determinando a sua criação. É que no dia 25 daquele mesmo mês e ano, seria realizado no Rio de Janeiro o primeiro Festival do Escritor Brasileiro, promovido pela União Brasileira de Escritores (UBE).

62 anos depois, a data continua sendo importante para homenagear e enaltecer quem, como o próprio nome diz, usa as palavras como sua principal ferramenta de trabalho. A Bahia, como se sabe, é berço de grandes nomes que marcaram a história da literatura brasileira, como Jorge Amado, João Ubaldo Ribeiro, Zélia Gattai, Myriam Fraga, entre outros. Não à toa, tamanha tradição baiana também abre espaço para nomes de uma nova geração que quer conquistar seu espaço, em diferentes gêneros e estilos de trabalho.

Estudante de comunicação, Luana Minho Rabelo tem 23 anos e desde criança gostava de criar personagens e histórias bastante elaboradas para os bonecos com os quais brincava. Ela, que parou de brincar de boneca aos 12 anos, quando efetivamente começou a escrever, não conhecia o mercado literário brasileiro, principalmente o independente.

Por isso e por algumas inseguranças que sentia, para ela, se tornar escritora naquele momento ainda era um sonho distante e só poderia ser realizado caso um dia saísse do país.

Dessa forma, Luana acabou não investindo na carreira durante a adolescência, mas continuou escrevendo e prometendo a ela mesma que, um dia, publicaria um livro. “Um dia, eu entendi que eu mesma estava me atrapalhando e comecei a me interessar por autoconhecimento; sempre gostei de resolver problemas e tratei minha autossabotagem como um. Comecei a estudar sobre autoconhecimento e saúde emocional, descobri o que estava por trás da minha autossabotagem, comecei a reconhecer padrões e a quebrá-los”, conta ao BNews.

Nesse período, ela terminou o ensino médio, entrou e saiu da faculdade, resolveu trabalhar com comunicação e com marketing, se interessando por empreendedorismo justamente por sempre ter tido o objetivo de tocar ela mesma tudo relacionado ao negócio por trás dos seus livros. Durante a pandemia, aproveitou para se reconectar com o lado artístico do processo, se reuniu com alguns amigos roteiristas e com um amigo escritor, com quem passou a conversar regularmente sobre suas histórias.

E foi no início deste ano que ela decidiu enfim que era "agora ou nunca". Em junho, após tantas idas e vindas, ela publicou o romance “O Último Primeiro Amor”, com direito a evento de lançamento. Trata-se uma adaptação de “Romeu e Julieta”, só que inspirada em colégios de Salvador, onde dois jovens de personalidades bem diferentes, Helena e Pedro, apaixonam e precisam lidar com todos os desafios que o amor traz.

"Quando eu era adolescente, eu achava o máximo as histórias que eu ouvia, vivia ou testemunhava, e prometi a mim mesma que, um dia, escreveria um livro no qual eu conseguisse me reconhecer e reconhecer os lugares, os personagens da minha adolescência. Nunca gostei de filme, série ou livro adolescente porque eu nunca me sentia representada. E, se não consegui encontrar a história que queria ler, escrevi-a eu mesma", revela Luana sobre sua inspiração para a obra.

Pouco tempo depois, mas de forma virtual, ela lançou "Como É que Vai Ficar Meu Coração?", obra que, essencialmente, fala sobre a vida adulta não ter se tornado o que alguém esperava, mas ao mesmo não se saber o que fazer para escapar da maneira corrida como se vive. A história é sobre um casal que se divertia bastante quando ambos eram mais novos, mas agora mal têm tempo pra conversar e acabaram se desencontrando.

"Quando eu escrevi esse conto, eu estava fazendo dois freelas ao mesmo tempo, e não tinha tempo pra investir nos meus sonhos, então me sentia super desconectada deles. E a pandemia ainda estava rolando, então é um conto que fala sobre saudade, porque eu amo São João, e passei dois anos sem", diz. Seus livros foram impressos em uma gráfica, mas foram lançados pela sua própria empresa, a Lua Story.

Narrativas negras

De uma outra perspectiva, a trajetória acadêmica pode ser um ponto de partida para se encontrar na escrita, e não apenas nos livros físicos ou virtuais. Esse foi o caso de Samira Soares, de 27 anos, que encontrou na escrita uma forma de dar voz às mulheres negras na literatura.

Ela, que também é uma mulher negra, começou a trilhar por esse caminho através do processo de oralidade de sua avó, Junilia, da cidade de Lençóis, na Chapada Diamantina, onde viveu a maior parte da sua vida. Foi através dela que pôde entender a importância das letras negras em sua construção intelectual.

"Quando entrei na universidade, senti uma grande invisibilidade das mulheres negras na literatura. É por isso que escolhi como campo de pesquisa e produção intelectual a literatura negra", contou ao BNews.

Seu primeiro autor negro foi Machado de Assis, por quem acabou se apaixonando. Depois, conheceu Conceição Evaristo, que classificou como uma grande mudança na sua perspectiva de leituras, já que ela falava sobre a resistência de mulheres negras e a importância da humanização de seus corpos, sobretudo no local que elas ocupam. "Antes eu lia autores brancos e não me identificava com aquelas narrativas. Era muito distante da minha realidade", acrescenta.

Embora ainda não tenha lançado livros físicos de autoria própria, Samira utiliza as redes sociais como plataforma para falar sobre sociedade, autocuidado, literatura negra, organização, estudos e estilo de vida. Em seu perfil no instagram, com quase 14 mil seguidores, ela, que recentemente foi aprovada no doutorado, expõe a importância de falar sobre os seus.

Possui também textos publicados na plataforma Diálogos Insubmissos de Mulheres Negras (DIMN), voltada à literatura negra de mulheres pretas, como o próprio nome diz. Em um deles, intitulado "Amar outra mulher preta é um gesto de auto amor", citando Audre Lorde, pensadora negra e lésbica, fala sobre o amor romântico entre mulheres pretas e a importância de não se falar de corpos negros apenas de forma negativa. "Quem disse que só de dor vive a mulher preta?", questiona logo no início.

Um dos seus trabalhos mais recentes foi a publicação, no final de 2021, do conto "Laranja Doce", no livro "Abrindo a boca, mostrando línguas", coletânea organizada pela professora do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Milena Brito. Nele, Samira fala sobre afetividades entre mulheres negras utilizando a linguagem criativa e elementos, como o cheiro e os cristais, para ressaltar, mais uma vez, a importância de se retratar de maneira positiva a imagem da mulher negra na literatura, quebrando estereótipos de apenas sofrimento.

Samira também é palestrante sobre relações raciais, gênero, questões LGBTs e literatura. Recentemente, defendeu sua dissertação de mestrado, onde falou sobre a representação de empregadas domésticas em textos de Clarice Lispector e Conceição Evaristo. Para aumentar seu repertório, está construindo em sua casa uma biblioteca cujas obras são majoritariamente de autoras e autores negros. 

Planos futuros e inspiração

Luana e Samira têm trajetórias, caminhos e universos diferentes, mas se há algo comum entre as duas, é a determinação e a vontade de seguirem em frente. Em suas falas, elas mostram que ainda desejam muito realizar, alcançar mais objetivos e a crescer.

"Meu trabalho atual demanda que eu saiba gerir minhas tarefas e meu tempo de maneira autônoma, e demanda que, às vezes, eu tenha de fazer coisas que eu nunca fiz antes. O empreendedorismo é assim, e eu estou acostumada com essa parte. Tenho esse perfil de ir atrás das coisas, de fazer, de construir mesmo as soluções, então, apesar de desafiador, eu cresci bastante nesse processo. Quando você escreve um livro e você publica, e não pode mais editá-lo, você não tem escolha a não ser confiar que você fez um trabalho excelente e seguir em frente. Você não pode deixar o perfeccionismo te atrapalhar ou te encher o saco", ressalta Luana.

Samira, que revelou ter muita timidez para publicar o que escrevia e pensava, descobriu que tudo isso fazia parte de um contexto de silenciamento e agora não quer mais perder tempo. "Os meus planos futuros são de publicar o que eu produzo enquanto literatura, enfrentar inclusive esse sistema que é racista e sexista, e me tornar entre tantas outras escritoras negras mais uma a contar essa história a partir do que é de fato a nossa ancestralidade. Acredito que a gente pode valorizar ainda mais as nossas escritas negras, investir em literatura negra é um passo fundamental para garantir a nossa representatividade na literatura brasileira", pontua.

Siga o TikTok do BNews e fique por dentro das novidades.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp