Entretenimento
Publicado em 20/11/2020, às 19h45 Rafael Albuquerque
Diversos setores importantes para a economia brasileira foram afetados com a inesperada chegada do novo coronavírus ao Brasil. Ainda sem conhecer os reais riscos da Covid-19, diversos gestores no país se apressaram, de forma considerada acertada, em baixar decretos e estabelecer medidas contra a proliferação do perigoso vírus. O objetivo era a proteção à saúde pública e, sobretudo, à vida, dois dos mais importantes bens jurídicos tutelados pelo Estado.
Acontece que cerca de oito meses após as primeiras restrições impostas pelo poder público, o setor de eventos, o primeiro a parar e um dos que mais sentiram o nefasto impacto econômico da doença que assolou o Brasil e o mundo, continua sem previsão de retorno. Na Bahia, desde que o governador Rui Costa (PT) baixou o decreto 19.586, em março deste ano, milhares de empresários, artistas, produtores, assessores, iluminadores, músicos, roadies, técnicos de som e outros membros dessa importante cadeia produtiva estão sem poder trabalhar.
O tempo passou, muito se discutiu sobre pandemia, lockdown, restrições, uso de máscara e cloroquina, etc. Alguns ramos voltaram a funcionar parcialmente, outros estão completamente reestabelecidos. Mas o setor de entretenimento segue sem previsão de retorno, o que tem causado insatisfação na categoria.
O empresário Fábio Almeida, que trabalha com Ivete Sangalo, uma das mais respeitadas artistas do Brasil, é um dos atuantes do setor que pede a volta das atividades. E vai além ao propor que o debate seja ampliado. "A gente comete um erro de falar exclusivamente de Carnaval, Réveillon e em artistas de um porte de visibilidade maior. Os eventos compreendem uma cadeia gigantesca além dessa que é noticiada na imprensa", disse em entrevista ao BNews. "Temos que fazer uma contribuição mais estruturada, entendendo os eventos de pequeno e médio porte. Temos que reconceituar o que são os eventos de médio porte", completou.
O empresário afirma que esta "não é uma pauta político-partidária" e ressalta que a sociedade está "rumando para um cenário de organização e maturidade diante do vírus, de a gente poder ter eventos com mais segurança". Fábio pondera que nossa realidade atual não permite eventos para milhares de pessoas, mas que está na hora de "discutir a volta de forma gradual": "tem a parte de nos educarmos mutuamente para a situação que estamos vivendo. Hoje temos um protocolo de Salvador pra 200 pessoas. Vamos pleitear para 300? Para 400? Vamos fazer uma quantidade X de eventos por semana? Isso é mais palpável e eu entendo dessa forma".
Almeida afirma, ainda, que o setor de entretenimento está pronto para retomar suas atividades sem colocar a vida das pessoas em risco. "Não tenho dúvidas de que os produtores, de modo geral, querem fazer o que é correto, cumprir regras e protocolos. Isso não é uma dúvida pra mim, pelas conversas que tenho".
Fábio entende que o poder público tem diversas pautas importantes ligadas à pandemia do novo coronavírus, mas defende que o setor de entretenimento também faça parte do protagonismo, uma vez que há uma grande pauta atrelada ao ramo. "O poder público é um agente que tem várias pautas. A escola é uma pauta, tem muita criança sem estudar. Mas a gente também tem uma pauta grande. Sem dúvida tem que falar em entretenimento", continua.
Apesar de defender o retorno gradual das atividades, Fábio Almeida relata que entende o posicionamento do prefeito ACM Neto e do governador Rui Costa. "Não acho maduro qualquer um que tenha interesse em transformar isso em pauta político-partidária. Eu não entendo que ACM Neto e Rui Costa estão fazendo isso. Entendo que a iniciativa é no intuito de fazer o melhor", finaliza.
Sócio da Salvador Produções e presidente da Associação Brasileira de Entretenimento - Bahia (ABRE-BA), o empresário Marcelo Britto também se posiciona pela retomada gradual das atividades. "Temos convicção de que podemos voltar com a retomada de forma gradativa, segura, e pensando na saúde e segurança, seguindo todos os protocolos. Temos produtores competentes e com capacidade técnica para retomar", afirmou à reportagem.
Marcelo alerta que a retomada gradual dos eventos na Bahia vai fazer com que diminuam as festas clandestinas, como os paredões e eventos em chácaras, que não seguem protocolos sanitários e colocam a vida das pessoas em risco. Questionado sobre como os empresários estão se preparando para retornar, na prática, com os eventos, o empresário explicou: "vamos fazer uma retomada gradativa com eventos pequenos, com lounges para 6 ou 10 pessoas, com higienização, distanciamento, com protocolo nos bares e restaurantes dos eventos. Podemos fazer os lounges menores ou mesas, mas temos condições de realizar. Isso já está acontecendo em várias cidades".
O empresário diz que a categoria precisa ser ouvida e ressalta que há um diálogo aberto com a prefeitura de Salvador e o governo para que haja novidades entre o final de novembro e o início de dezembro. "O diálogo tem avançado, temos tido alguns encontros. Estávamos esperando passar essas eleições", afirmou.
Apesar de contar com a compreensão de alguns empresários, o governador Rui Costa tem causado muito burburinho nos bastidores do entretenimento e da política com suas declarações terminantemente contra realização de eventos de réveillon na Bahia.
Em sua conta oficial no Instagram, o petista postou: "Continuamos em guerra contra a #Covid19. Não vamos permitir que confraternizações de final de ano tragam como consequência à #Bahia uma 2ª onda da pandemia. Quero lembrar que há um decreto em vigor, válido em todos os 417 municípios, que proíbe eventos com mais de 200 pessoas. Na Bahia, não haverá festa com aglomeração no Natal, no Réveillon ou em qualquer outra data comemorativa enquanto não tivermos vacina. Eventos sem autorização da Vigilância Sanitária poderão ser cancelados com prejuízo aos envolvidos. Vamos trabalhar sem descanso para salvar vidas".
Empresários como Filipe Risse (WorkShow), que trabalha com a cantora Marília Mendonça, têm se manifestado contra as declarações de Rui. "As autoridades fecham as portas e fazem como Rui Costa, tomam decisão unilateral. A gente quer tentar fazer acontecer. Falta total de boa vontade. Se querem que fiquemos parados, que nos subsidiem. Pagamos impostos, geramos empregos. Agora milhares de pessoas estão passando necessidade e ninguém faz nada. Já propomos retorno, mas não há o diálogo. E o que você vê são eles nos impedindo de trabalhar. É triste", afirmou ao BNews.
Filipe ressaltou que enquanto os profissionais do entretenimento estão há quase nove meses parados, todos os outros setores da economia brasileira estão voltando a funcionar ou já estão em funcionamento: "desde que a pandemia começou, o setor de eventos foi o primeiro a parar. Depois disso, milhares e eventos foram cancelados no Brasil. E aí os contratantes e empresários de artistas foram cancelando gradativamente as coisas. Estamos completando nove meses sem trabalho"
"O mais triste é ver o mercado todo voltando ao normal, shoppings, aeroportos, supermercados, comércios, praias, tudo voltando gradativamente ou até mesmo 100%, e nós não. O mercado de eventos e entretenimento está revoltado porque estão nos proibindo de trabalhar. Todo mundo tem responsabilidade para trabalhar, e nós também temos. Somos capazes de fazer algo consciente, com responsabilidade, que proteja da melhor forma possível o cidadão", completa.
O empresário reconhece que não dá para ter 100% de controle no ambiente de eventos, mas garante a segurança dos frequentadores: "assim como qualquer outro lugar, no shopping e no bar, por exemplo, às vezes não dá para controlar porque tem gente que simplesmente decide não usar a máscara. Então, não dá para controlar 100%, e dentro de evento também vai acontecer. Mas garanto que o mercado da música, os produtores em si, têm a mesma responsabilidade de cobrar e orientar as pessoas, assim como todo o mercado no geral está fazendo".
Outro aspecto levantado pelo empresário da música sertaneja é que o setor de entretenimento está acostumado com as cobranças. "O mercado da música sempre viveu de excesso de cobranças. Para se fazer um evento depende de exigências da prefeitura, dos Bombeiros, etc. A gente está acostumado a seguir protocolos. Para nós vai ser fácil seguir o protocolo da retomada com todos os equipamentos".
O empresário musical e produtor de eventos, Wagner Miau, afirmou à reportagem que o poder público e iniciativa privada devem convergir as ideias e dar o pontapé inicial da retomada com um evento teste, que deve servir de modelo para outros. "Acho que nossos governantes precisam sentir confiança no nosso potencial de produzir eventos com todos os protocolos exigidos pelas autoridades sanitárias. Temos um excelente gestor público da BahiaTursa, que é Diogo Medrado, e que pode ser nosso grande elo para formatar um evento teste", disse.
O presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), Doreni Caramori Júnior, também comentou sobre a retomada das atividades. “Nós vamos voltar, pois a alegria do Brasil vai voltar. E essa alegria depende do nosso setor. É a alegria da menina que compra a roupa nova para ir no evento, do motorista de aplicativo que consegue o seu dinheiro transportando as pessoas, da atração de abertura que tem a oportunidade de mostrar o talento que pode estourar nacionalmente. Vai voltar pois não tem coisa melhor no mundo do que ver a vida ao vivo”, afirmou.
Renan Nóbrega, empresário do fenômeno sertanejo Wesley Safadão e sócio da Luan Promoções, também concedeu entrevista ao BNews e foi certeiro quando destacou: "Na realidade, o que a gente tem a fazer é cuidar realmente do público". Ele disse que o setor tem plenas condições de realizar a retomada de maneira responsável, e citou um exemplo que deu certo. "Em Natal, na Arena das Dunas, todos os protocolos estão sendo seguidos, o Ministério Público está de acordo, há o distanciamento de um metro e meio entre as mesas. Tudo foi feito de forma responsável para que o público possa interagir sem correr riscos", disse.
Segundo Renan, membros do poder público são sensíveis à causa dos empresários, mas não cedem para a retomada. Além disso, parte do público entende mal a proposta deles: "a gente já teve algumas reuniões com lideranças, prefeitos, secretários, governadores. Tivemos na Paraíba e em Pernambuco, por exemplo. A gente vê eles sensíveis, mas não liberam. Além disso, tem parte do público que fala mal do nosso retorno, pois eles pensam logo em aglomerações. Mas eles não pensam nas possibilidades que podemos proporcionar, com distanciamento, eventos menores, com toda segurança possível. Pedimos que as autoridades deixem a gente trabalhar, em espaços abertos, amplos".
O empresário também fala do papel dos artistas, como Safadão, nessa história. "Os artistas foram sensíveis na pandemia, inclusive fazendo lives e deixando o povo em casa durante o lockdown. E hoje eles estão sendo a última opção na abertura de mercado. Temos possibilidade, competência e compromisso para fazer tudo dentro dos protocolos", salientou. Renan finalizou passando uma mensagem para a população brasileira: "somos trabalhadores formais, somos responsáveis e não vamos passar exemplo ruim para o Brasil".
Enquanto os empresários demonstram sua insatisfação e pedem compreensão dos governantes após meses parados, a prefeitura de Salvador e governo da Bahia ainda não deram indícios sobre a liberação do retorno das atividades do ramo de entretenimento.
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