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Triste Bahia, ó quão despreparada és!

Publicado em 24/01/2011, às 12h24   Rodrigo Lopes


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A Bahia é, com toda certeza, um dos estados da federação brasileira que, especificamente nesta época do ano, quando o sol escolhe o nordeste para tirar férias, se torna o destino turístico preferido de muitos brasileiros e estrangeiros em férias. Não bastasse o nosso vastíssimo litoral de águas mornas e coqueirais infinitos, o território baiano conta com outras tantas regiões de beleza singular e imenso potencial turístico.

Uma dessas regiões é a maravilhosa Chapada Diamantina, de história antiga, como se pode observar através de seus casarões coloniais da época do ciclo dos diamantes, no início do século XIX, suas ruas calçadas de pedras irregulares e suas trilhas no meio das serras, que nos levam à grutas, cachoeiras e corredeiras que impressionam pela beleza e estado de preservação.

Em janeiro, Lençóis, principal destino da Chapada Diamantina, torna-se uma cidade agitada. Os dias e noites agradáveis convidam os visitantes a sair às ruas para comprar lembranças, comer pratos típicos, beber e aproveitar os dias de descanso; mas até chegar às cidades da Chapada e aproveitar todas essas delícias, o turista enfrenta alguns percalços e situações bastante chatas e desnecessárias.

Começando pelo acesso ao Parque Nacional da Chapada Diamantina. Saindo de Salvador em direção à Lençóis, os viajantes incautos, como eu, podem iniciar a viagem com a agradável surpresa de encontrar estradas bem conservadas e com acostamento (e isso realmente é uma surpresa em se tratando de rodovias estaduais), especificamente os trechos da BA 052, a Estrada do Feijão, entre Feira de Santana e Ipirá e dali até a cidade de Itaberaba.

Da terra do abacaxi até Lençóis são aproximadamente 130 Km de rodovia federal, a BR 242 que liga a Bahia aos estados do Centro Oeste, como Goiás e Tocantins. Como toda BR que se preze, é corriqueiro aos que se aventuram por elas enfrentar um tráfego intenso de caminhões e outros veículos pesados, e é justamente neste ponto, que os problemas surgem aos mais desavisados.

A BR 242 é uma rodovia com uma conservação razoável até o trecho do Parque Nacional da Chapada Diamantina, porém com uma sinalização bastante deficiente, é notável a falta de placas sinalizando a distância entre as cidades mais visitadas da região, como Lençóis, Mucugê, Andaraí, Seabra e Iraquara. Chega a ser aflitivo a ausência de informações.

Como a rodovia tem muitas entradas transversais, que dão acesso a cidades e povoações, nós turistas, simplesmente não sabemos se continuamos a seguir a via principal, ou se já não deixamos escapar a entrada dessas localidades. A alguns quilômetros de Lençóis, por exemplo, existe uma indicação do Aeroporto Horácio de Matos, que recebe vôos de pequeno porte com turistas, mas logo depois não existe nenhuma indicação se Lençóis fica na direção do aeroporto ou se devemos seguir em frente. Decidi seguir a BR, e somente 20 Km depois, surge o desvio para a cidade; é quando encontrei alguma indicação de por onde seguir, parcialmente coberta pela vegetação da encosta, fui pego no susto.

Fico pensando na dificuldade que outros turistas, que vêm de fora da Bahia, têm ao tentar chegar de carro na cidade. Mas enfim, aos trancos e barrancos cheguei ao meu destino.

Agora um segundo problema que demonstra a falta de preparo dos responsáveis pela administração dos pontos turísticos das cidades baianas. Como turista, um dos maiores prazeres ao chegar em uma localidade que não conheço é andar por suas ruas e me informar sobre sua história. Como quaisquer cidades históricas, uma bela maneira de aprender sobre o local é através do nome de suas ruas e logradouros, que geralmente fazem menção a acontecimentos ou pessoas ilustres dali.

Lençóis não foge à regra, mas peca pela omissão de informações. Um exemplo: a praça principal da cidade, que conta com o antigo mercado municipal e belos casarões históricos, possui uma placa indicativa com o nome “Praça Aureliano Sá (antiga Praça das Nagôs)”. Mas porque o nome “das Nagôs” foi substituído, ou porque a praça chamava-se assim? Seria salutar aos responsáveis pelo Patrimônio, seja o IPAC ou o IPHAN, que instalassem placas informativas em casos como esse. É um agrado ao turista, que se sente respeitado por ter acesso à informação, da mesma forma que o é para a população do lugar, que não sabe informar quando interpelada sobre o fato. Este tipo de situação acontece em outros logradouros.

O destino natural da Bahia, com seu litoral maravilhoso e seu diverso sertão, com suas riquezas culturais e arquitetônicas, é o turismo histórico e ecológico. Porém, da mesma forma que acontece em Salvador - cidade Patrimônio da Humanidade - que carece de cuidados com os elementos patrimoniais materiais e imateriais que lhe deram fama, e que estão relegados ao abandono, encontram-se os sítios turísticos da Chapada Diamantina.

Não gosto de estabelecer comparações entre lugares tão diferentes, mas os grandes centros culturais e históricos do mundo, seja na Roma e Veneza italianas, na clássica Atenas, nas andinas Lima e Cuzco, e até na capital do nossos “hermanos” argentinos, a consciência de preservação patrimonial e da importância do turismo como fonte de renda, conseguiu criar um know how que já faz parte da consciência social coletiva.

E nós baianos, que nos gabamos de ser praieiros e festeiros, simpáticos e receptivos como nenhum outro povo deste país, que dependemos em grande medida do turismo para gerar receita para nossa Bahia e que possuímos, talvez mais que qualquer outro estado brasileiro, História com H maiúsculo, pois parimos a nação, não conseguimos nos apropriar disso tudo e transformar todo esse potencial em um crescimento e receita muito maior do que temos agora.

Isso me lembra que, nesta semana, houve uma grande polêmica em relação ao povo da Bahia na web, através da declaração da cantora Gal Costa no twitter, dizendo que o baiano é preguiçoso. Bairrismos à parte, tenho que concordar com Gal. Os prestadores de serviço na Bahia pecam pela falta de profissionalismo, isso me remete de volta à questão da falta de investimento ou interesse em nosso patrimônio cultural por parte dos órgãos responsáveis, que reflete diretamente no savoir faire do povo baiano.

Para sair da targiversação e voltar ao tema, penso que a preguiça referida por Gal é a preguiça de se aprimorar, de sofisticar o atendimento, de chegar ao máximo de otimização do serviço, seja o balconista da padaria, o vendedor da loja, o taxista ou os administradores públicos da “terra do axé e do carnaval”, da “boa terra”, eu, consumidor e cidadão, percebo isso nitidamente.

Não sei porque (ou talvez saiba bem), me ocorre finalizar essa divagação com uma uma frase de um baiano retado de muitos anos passados, mas sempre atual desde que foi cunhada, “...Triste Bahia, ó quão dessemelhante és!”.

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