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Moro manteve portaria de deportação sumária apesar de advertência da AGU

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Procuradoria-geral quer que Supremo declare norma inconstitucional por violar presunção de inocência  |   Bnews - Divulgação Pedro Ladeira / Folhapress

Publicado em 14/09/2019, às 07h49   Folhapress


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O Ministério da Justiça manteve inalterado o texto da portaria 666, que determina a deportação sumária de “pessoas perigosas”, mesmo após advertência da Advocacia-Geral da União (AGU).

A portaria 666, anunciada em 26 de julho pelo ministro Sergio Moro, prevê que pessoas consideradas perigosas ou suspeitas de crimes podem ser impedidas de entrar no país ou alvos de deportação sumária.

Em nota técnica sobre o texto da regra, a AGU alertou que a definição de “pessoa perigosa” se apoiava em legislação que não definia exatamente o que levaria uma pessoa a receber essa classificação. ​

Segundo a nota, a lei também não especificava que instrumento legal seria usado e qual autoridade seria competente para determinar se uma pessoa é “perigosa”.

Além de representar a União em processos judiciais, a AGU é responsável pela consultoria e pelo assessoramento jurídico do Executivo.

A portaria 666 determina que serão classificadas como “perigosas” todas as pessoas suspeitas de envolvimento com terrorismo, grupo criminoso, tráfico de pessoas, drogas ou armas de fogo, pornografia ou exploração sexual infantojuvenil, além de torcedores com histórico de violência em estádios.

A portaria foi alvo de diversas críticas de entidades de defesa de migrantes e refugiados e chegou a ser questionada pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur).

De acordo com o Acnur, a portaria viola leis internacionais e brasileiras de proteção aos refugiados, e uma pessoa só deveria ser deportada se tivesse “sido condenada após uma sentença final por um crime particularmente grave e represente um perigo para a comunidade”.

O ministério admite que houve o alerta da AGU, mas afirma que a conclusão da nota técnica foi de que a portaria poderia veicular o conceito de “pessoa perigosa”.

“É verdade que, em determinado trecho de parecer jurídico, foi mencionado que a portaria poderia vir a ser questionada”, afirmou o ministério em nota. “Contudo, o próprio signatário do documento, logo nos itens subsequentes, responde a tais possíveis questionamentos, deixando claro que: apesar dessa consideração, entende-se pela possibilidade de veiculação desse conceito em portaria.”

O ministério afirma que o texto sofreu alterações para que o conceito questionado ficasse bem claro e definido. Mas as mudanças foram superficiais.

Os documentos referentes à tramitação da portaria foram obtidos via Lei de Acesso à Informação a pedido do deputado Ivan Valente (PSOL-SP).

“O conceito de 'pessoa perigosa' da portaria 666 tem dois riscos principais. Primeiramente, há uma ameaça ao devido processo legal e uma violação ao princípio da presunção de inocência ao se definir ‘pessoa perigosa’ como aquela que seja suspeita de praticar certos atos”, diz Valente.

“Além disso, nem o conceito de ‘pessoa perigosa’ nem o instituto da ‘deportação sumária’, também criado pela portaria 666, existem no ordenamento jurídico brasileiro. As inovações normativas da portaria são veementemente contrárias à Lei de Migrações, ao direito processual penal, à Constituição Federal e aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil neste tema.”

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