Justiça

Promotor monta quarto dentro de sala de Promotoria em Santa Maria da Vitória; ele nega

Leitor BNews
Estantes com processos deram lugar a camas e guarda-roupa; MP-BA diz que espaço apenas armazenou móveis  |   Bnews - Divulgação Leitor BNews

Publicado em 17/07/2019, às 15h09   Bruno Luiz e Marcos Maia


FacebookTwitterWhatsApp

O home office é uma tendência cada vez mais crescente nas relações de trabalho. No entanto, um promotor de Justiça da cidade de Santa Maria da Vitória, no Oeste baiano, parece ter levado o conceito ao pé da letra, mas ao contrário: montou um quarto para dormir dentro da sala da Promotoria do município. Ele nega. 

A denúncia foi feita ao BNews por uma figura com trânsito na sede do Ministério Público da Bahia (MP-BA) na cidade e confirmada pela reportagem junto a outras fontes locais. Elas preferiram não se identificar, por medo de retaliações. Segundo os relatos, o quarto improvisado foi montado em uma sala da 3ª Promotoria, no município do Oeste baiano.

Para isso, foram retiradas do espaço as prateleiras que guardavam documentos processuais, removidos para outro local. A medida foi tomada para atender o promotor Antônio Eduardo Cunha Setúbal, designado em portaria de maio deste ano no Diário Oficial da Justiça, como coordenador da Promotoria de Justiça Regional de Santa Maria da Vitória. 

Na sala, as pilhas de processos cederam lugar a duas camas box e a um guarda-roupa. De acordo com os relatos, os móveis foram colocados no local nos dias 26 e 27 de maio. Entre 27 e 30 de maio, o atendimento ao público chegou a ser suspenso na Promotoria. A reportagem não encontrou nenhuma portaria no Diário Oficial comunicando da interrupção das atividades, como é comum ocorrer. Um vídeo mostra como ficou o quarto:

No local, o promotor dormiu nos dias 28 e 29 de maio, já que, no dia 30, deixou a promotoria rumo a Vitória da Conquista, onde pegou, no dia seguinte, voo de volta a Salvador. De acordo com os relatos das fontes ouvidas pela reportagem, no quarto dormiu também a assistente dele, Adrielle Cardoso Said. 

O espaço teve fim no dia 4 de julho, quando os móveis foram retirados da sede por homens em uma caminhonete. A ordem de desfazer o quarto foi dada pelo promotor Clodoaldo Silva da Anunciação, suplente de Setubal na coordenadoria. De acordo com pessoas com trânsito na Promotoria, a atitude foi gerada por um temor de que a história se espalhasse pela cidade e chegasse até a Corregedoria do MP-BA ou ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), onde o promotor poderia se tornar alvo de processo disciplinar. Um vídeo obtido pelo BNews mostra o momento em que câmeras de segurança da região registram a retirada dos móveis.


Quem confirma os relatos é Nilcélia Maria da Silva, ex-funcionária terceirizada da Promotoria, demitida em 3 de julho, um dia antes da remoção das camas e do guarda-roupa. “Eles fecharam o portão [no dia que os móveis foram colocados], não teve expediente nesse dia. Quando foi por volta das 16h, o caminhão levou as duas camas, o guarda-roupa. Eu fiquei esperando o rapaz montar os móveis, até umas 17h [...] Fui demitida porque sabia do quarto, tanto eu quanto meus colegas foram demitidos”, contou.

Além dela, um estagiário da Promotoria também foi demitido e uma servidora concursada, que já tinha acordado com o MP-BA voltar para trabalhar em Salvador no fim de julho, teve o retorno antecipado para o início do mês, sem receber mais explicações. Segundo Nilcélia, desde que o promotor chegou, o clima de trabalho passou a piorar. “Está pesado, pior que no velório”, disse. O BNews confirmou a situação junto a outras pessoas que acompanham de perto o caso, mas que preferiram não se identificar. Há receio de retaliações por parte dos promotores, caso a história se espalhe. 

O outro lado
Procurado pela reportagem, o CNMP informou que não há nenhum processo contra Setúbal e nem contra Clodoaldo tramitando no órgão. Questionado também se a conduta do primeiro promotor poderia ser alvo de procedimento disciplinar, o Conselho disse que só poderia se posicionar contra casos concretos. 

O BNews também solicitou entrevista com os promotores, mas, segundo a assessoria do MP-BA, eles preferiram se pronunciar apenas via nota. No posicionamento, eles explicaram que a aquisição dos móveis foi feita para “mobiliar um imóvel residencial que seria locado por eles no município.”

“Segundo eles, a primeira tentativa de locação foi frustrada e, em virtude do retorno dos mesmos a Salvador, os móveis comprados foram temporariamente armazenados na sede da Promotoria de Justiça, onde ficaram por um período de 30 dias. O material foi retirado da Promotoria de Justiça no início deste mês, na oportunidade em que os promotores de Justiça retornaram à cidade, já com outro imóvel locado”, disse a nota. O MP ainda encaminhou uma cópia do contrato de aluguel. 

A assessoria também enviou ao site o número de duas notas fiscais emitidas pelo hotel Portal do Corrente - uma em nome de Clodoaldo e outra em nome de Eduardo Cunha Setubal. Entramos em contato com o estabelecimento, que confirmou a veracidade das notas e disponibilizou o período ao qual estas são correspondentes. De acordo com o hotel, Clodoaldo Silva esteve hospedado no hotel entre os dias 3 e 5 de julho. Já Eduardo Setubal, usou os serviços do local de 22 a 28 de maio deste ano. Questionamos também sobre a existência de registros de presença dos dois anteriores aos períodos informados e a resposta foi negativa.

A dupla também esteve, segundo a assessoria do órgão, instalada no Hotel Carranca. Em contato com o estabelecimento, que confirmou a veracidade do documento e informou que Clodoaldo usufruiu de apenas uma diária. O check-in foi realizado em 27 de junho, enquanto o check-out ocorreu no dia seguinte. O Hotel Carranca ainda afirmou que Anunciação não esteve hospedado em suas dependências antes deste período. Vale lembrar que promotores recebem verba para moradia caso atuem em outras cidades fora de onde são lotados originalmente. 

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp