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Não justifique, denuncie: machismo contribui com sentimento de culpa em mulheres vítimas de violência sexual, diz psicóloga do Hospital da Mulher

Vagner Souza/ BNews
Bnews - Divulgação Vagner Souza/ BNews

Publicado em 27/04/2019, às 12h00   Yasmim Barreto


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A fragilidade emocional, insegurança e sentimento de culpa são características gerais de mulheres que passaram pelo trauma da violência sexual. Para a psicóloga do Serviço de Atendimento às Mulheres Expostas a Violência Sexual (AME) do Hospital da Mulher, Mariana Pinheiro, o machismo contribui para que as vítimas de violência sexual ‘’alimentem’’ esses sentimentos.

‘’A gente vive numa sociedade muito machista, então as coisas são colocadas de uma forma como se as mulheres procurassem aquilo que aconteceu, que são culpadas, esse é o sentimento que chega muito forte pra elas, medo de ser julgada, apontada pelas pessoas’’, afirmou a psicóloga. 

Na terceira reportagem da série Não Justifique, denuncie, a Mariana Pinheiro ressaltou que essas características [citadas acima] são gerais, ou seja, exclui as especificidades de cada caso: ‘’As características de como essas mulheres chegam é muito relativo, depende muito da idade, de qual foi a violência, de quanto tempo tem, de quem foi o autor da violência’’.

No AME, Mariana Pinheiro explicou que o trabalho realizado tem o intuito de ‘’dissolver’’ os danos causados pela violência sexual. ‘’O nosso trabalho é para que essa dificuldade seja menor cada dia que passa, que elas possam ir justamente trabalhando em cima dessas questões para que sejam dissolvidas’’.  

Durante esse processo, os profissionais do AME, junto com o Hospital da Mulher, trabalham para mostrar às vítimas outras perspectivas e possibilidades de recomeçar. ‘’O produto final do nosso trabalho é a perspectiva de poder ajudá-la a ressignificar o que ela viveu, que é algo que não tem como esquecer, não tem como apagar da memória, mas com o tempo vai aprender a lidar com isso da melhor forma possível. Ou seja, pensar junto com ela quais são os recursos que pode utilizar para ir aos poucos, dentro do limite do dela, perceber que a vida continua. Porque quando a gente passa por uma situação muito difícil, que pode considerar como traumática, a sensação que temos é que acabou ali, que não tem mais perspectiva de nada, então o nosso trabalho é devolver essa perspectiva para essas mulheres para que possam ir percebendo, mesmo numa situação como essa, que ainda podem ser felizes’’, relatou Mariana Pinheiro.

O trabalho feito em rede, com profissionais da enfermagem, serviço social, psicologia, e, principalmente, a ajuda de familiares e amigos, são vistos como um apoio essencial para as mulheres em situação de violência sexual, segundo a coordenadora do AME, Mariana Brito.  

Assista ao vídeo:

Acolhimento – No Serviço de Atendimento às Mulheres Expostas a Violência Sexual (AME), do Hospital da Mulher, o trabalho é realizado de forma humanizada e com atenção por se tratarem de casos que demandam cuidado com a vítima para que ela retorne e continue com o tratamento. ‘’Antes mesmo de pensar no nosso lugar enquanto profissional, a gente tem que pensar como mulheres. Somos mulheres atendendo outras mulheres que chegam até nós fragilizadas, mobilizadas pela situação que aconteceu e isso por si só requer de nós um acolhimento, independente de sermos psicólogas, assistentes sociais, enfermeiras, médicas, todas as funções passam primeiro para o acolhimento com aquelas mulheres, com as questões delas, as demandas, com o sofrimento, então nós enquanto mulheres estamos ativas nesse processo de cuidado’’, afirmou Pinheiro.  

A coordenadora do AME destacou que todas as mulheres, independente de quando aconteceu o ato de violência sexual, pode receber atendimento no serviço. ‘’A paciente vem via porta aberta, como a gente chama, qualquer mulher que tenha passado por esse tipo de situação pode chegar até aqui, então ela vai ser atendida pela enfermagem, vai ser acolhida a partir da sua história, ela vai passar pelo médico e, a partir de então, que é feito esse primeiro acolhimento, a gente vai ver qual o melhor protocolo que se aplica ao atendimento dela’’, explicou.  

Perfil dos agressores – Quando a violência sexual atinge mulheres adultas, seus agressores se dividem entre pessoas desconhecidas, que abordam as vítimas nas ruas, ou seus companheiros, segundo a psicóloga Mariana Pinheiro. Entretanto, quando se trata de crianças e adolescentes, os criminosos apresentam um grau de proximidade maior com suas vítimas. ‘’Quando a gente vai direcionar esse olhar para crianças e adolescentes normalmente esses agressores são do convívio familiar e aí pode ser um vizinho ou um parente, um amigo da família, são pessoas que são mais próximas daquela criança ou adolescente’’.

Dados – A violência contra a mulher pode se manifestar de diversas formas e, algumas delas, é através do estupro. Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA), em 2018, a capital baiana registra 352 estupros contra mulher; em segundo lugar com 131 casos vem Feira de Santana; seguido por Vitoria da Conquista com 118 e Camaçari com 73 registros.

Já os crimes que terminam com a morte dessas mulheres, denominados pelo Atlas da violência como homicídio, a Bahia ocupa o segundo lugar entre os estados que mais registraram esse crime no ano de 2016 com 423 casos; em primeiro lugar ficou o estado de São Paulo com 507 casos; e em terceiro lugar Minas Gerais com 375 registros.  

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