Especial

Sob direção materna: mulheres superam o preconceito como motoristas de táxi e ônibus em Salvador

Carlos Alberto e Vagner Souza
O BNews acompanhou a rotina das duas mães; assista no interior da matéria  |   Bnews - Divulgação Carlos Alberto e Vagner Souza

Publicado em 11/05/2019, às 23h52   Brenda Ferreira


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Motoristas, mães e mulheres fortes. Este é o tema do especial de Dia das Mães do BNews deste ano. Maria do Socorro Queiroz e Fernanda Costa são condutoras de dois dos transportes mais utilizados na capital baiana. Na semana que antecede a data, a reportagem acompanhou uma parte do dia a dia das duas trabalhadoras. 

Socorro é motorista de ônibus há 18 anos e diretora do Sindicato dos Rodoviários da Bahia há dois anos. Já Fernanda, é taxista há sete anos e disse que sempre sonhou em trabalhar com táxi. 

Mãe de três filhos, a motorista de ônibus contou ao BNews que o dia começa 3h30. “É ônibus de manhã, vou para casa almoçar e volto para o sindicato, porque as vezes tem reunião e, quando eu chego em casa, tem janta para fazer e no outro dia estou no batente de novo para trabalhar”, relatou Maria do Socorro.

“É uma correria, porque o trânsito de salvador no dia a dia não é boa coisa. E por ser mulher, a gente tem dupla jornada. Eu digo que para mim é tripla”, revelou a motorista de ônibus. Para Socorro, a correria é gratificante. “A gente se sente útil na sociedade e a mulher tem um potencial enorme que nem ela mesmo se descobriu. Porque nós mulheres temos capacidade de fazer o que quiser, na hora que quiser”.

Maria do Socorro revelou que a profissão está no DNA.  “Meu pai era motorista, meus irmãos são caminhoneiros e eu vim ser motorista urbana”. Ela também falou sobre sua relação com o cargo e confessou que aconteceu “por acaso”. “A profissão me escolheu. Meu cunhado viu que eu dirigia muito bem e me chamou para fazer um teste em uma empresa que ele trabalhava. Eu fiz o teste e passei em tudo. Gostaram da minha direção”. 

Com o estresse do trânsito, ao longo dos 18 anos, Maria desenvolveu ansiedade. Atualmente ela é tratada por psiquiatra e psicólogo e disse que consegue controlar para tentar driblar as situações conflitantes do cotidiano. “Eu aprendi a controlar e dominar essa ansiedade. Quando vejo engarrafamento, penso: isso aqui é normal, eu vejo isso todos os dias. A gente já trabalha a cabeça. Antes eu não trabalhava. Tomo remédio e já me controlo. Já brinco com os passageiros, o tempo vai passando e eu tiro de letra”. 

Quando Socorro começou a dirigir, Gustavo, filho mais novo dela, tinha apenas dois anos. Ela relatou que foi a época mais difícil para a família. “Ele ficava com babá, mas eu não conseguia me concentrar no trabalho porque minha cabeça ficava o tempo todo lá em casa, em como ele estava. Foi muito complicado para mim”.

Já Fernanda Costa contou que quando ela começou, o filho Logan, de 15 anos, tinha seis, e ficava com a babá, porque não tinha como sair e ele ficar sozinho. 

A taxista também é mais uma mãe e profissional que começa o dia às 3h30. “Meu filho estuda pela manhã aqui próximo. Pela tarde ele já está em casa, mas antes de eu sair já tem comidinha pronta, o café da manhã, e eu me comunico com ele no decorrer do dia por celular, sempre. Falando sobre horários e o que ele faz”, declarou.

Segundo Fernanda, a relação de mãe e filho é ótima. “Ele é um menino muito bom, não me dá trabalho, acredite. Logan graças a Deus é uma exceção, uma benção na minha vida”. 

Como motorista de táxi, Fernanda é a única mulher do “ponto”, que fica localizado no Nordeste de Amaralina. Ela desenvolve um trabalho junto com outros colegas para moradores das comunidades de Santa Cruz, Nordeste, Chapada do Rio Vermelho e Vale das Pedrinhas. O “Táxi do Vale” é um serviço que atende moradores dentro dessas comunidades e não há taxa de deslocamento dos taxistas. E, segundo Fernanda, os táxis podem ser solicitados pelo aplicativo, por Whats App ou ligação. Para ela é gratificante. “Sabe quando você se casa com sua profissão? Eu amo dirigir, amo ter esse contato com cliente, conversas, várias histórias, várias pessoas. Eu gosto disso”.

Durante o trajeto até o bairro Barra, a reportagem também pôde constatar a surpresa de passageiros e pessoas na rua ao ver Maria do Socorro. “Nossa! Uma mocinha no volante, que lindo!”, disse uma senhora ao entrar no ônibus. Para Fernanda não é diferente. “Os clientes se sentem surpresos. Eu peguei um pessoal que falou: nossa! Uma mulher! Eu sempre pego, há tanto tempo e nunca fui atendida por uma mulher”. 

Veja o vídeo e acompanhe um pouco da rotina das duas mães. 

Preconceito e assédio no trabalho

Em profissões que são conhecidas por serem dominadas por homens, as mulheres continuam na luta para quebrar barreiras do preconceito para poderem se manter em cargos e profissões e, acima de tudo, serem respeitadas por isso. 
“O meu maior desafio foi romper os preconceitos. Por ser mulher. Por ser taxista em uma profissão masculinizada, achavam que não ia dar certo, mas eu queria muito ser taxista”, afirmou Fernanda.

“Eu acho que tem discriminação e, alguns deles - é a minoria -, se eu fizer algo pequeno, que é parar um pouquinho fora do ponto, que incomoda eles, pelo fato de ser mulher, já vira uma coisa enorme. Mas eu não estou nem ai, eu tiro de letra. Sou um profissional como qualquer outro deles”, declarou Maria do Socorro. 

Segundo a taxista, as mulheres são mais preconceituosas. “Quando veem, acham que o táxi é do meu marido ou do meu pai, mas não eu sendo a taxista. E assédio é rotineiro. Acho que essa coisa hoje já se tornou um pouco costumeiro, mas sei tirar de letrinha isso”. 

Apesar de todo o estigma e preconceito, as mamães conseguem evitar qualquer situação incômoda que apareça. 

“Dependendo da paquera, eu disfarço, finjo que não é comigo. Mas a gente também tem que agir de forma que a pessoa não se sinta desconfortável, mas que ela entenda que existe um ‘não’. Eu não estou disponível, eu estou trabalhando. Essa é a minha profissão”, desabafou Fernanda. 

“Eu ouço vários comentários. Ai eles falam: uau! Uma mulher! Eles olham e dizem: você é tão bonita! Acho que eles se assustam por causa da minha idade, porque eu já sou coroa. Apesar disso, eu trato eles muito bem. Eu sou muito brincalhona e levo as coisas na esportiva. Isso se torna uma convivência melhor e quando eu não estou na linha, eles perguntam por mim. Isso me anima, eu gosto”, disse Maria do Socorro se referindo aos passageiros. 

Classificação Indicativa: Livre

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