Política

Sigilo é "inconstitucional", diz ministro do STF

Imagem Sigilo é "inconstitucional", diz ministro do STF
Marco Aurélio Mello defende transparência nos gastos da Copa e Olimpíadas  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 17/06/2011, às 22h01   Redação Bocão News


FacebookTwitterWhatsApp

A Medida Provisória 527 tramita no Congresso Nacional e causa muita polêmica em todo o país. O objetivo maior é dar "carta branca" ao governo para não tornar público o orçamento das obras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Os críticos da MP 527 ganharam o reforço de peso do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. De acordo com o magistrado, além de "inconstitucional" o sigilo "é uma sinalização péssima, que tem uma leitura muito terrível e cáustica por parte dos cidadãos em geral". Leia entrevista concedida por Marco Aurélio ao Terra Magazine.

Qual é a opinião do senhor sobre a transparência relativa que o governo pretende dar aos orçamentos da Copa?

A publicidade é um princípio básico na administração pública. E é ela que permite aos contribuintes em geral acompanharem o dia a dia da administração pública. A 'coisa pública' não pertence a quem quer que seja, ela é do coletivo, do povo. E evidentemente tem que se primar pela transparência. Eu não concebo o sigilo em qualquer setor. Também não concebo, por exemplo, essas despesas do Planalto, que não vêm à tona e são guardadas, de certa forma, a sete chaves a partir de um pretexto.

Qual é e o que o senhor acha dele?

O pretexto de preservar a segurança de um dignitário, um dirigente. Meu Deus do céu! O dia em que eu não puder sair à rua, não puder estar na vitrine sendo visto por todos, terei que reexaminar meus atos para ver onde errei. Esse problema das obras da Copa peca de início pelo escamoteamento que querem fazer e pela falta absoluta de razoabilidade. Foi o que o procurador geral da República (Roberto Gurgel) disse, é um absurdo, não entra na cabeça dos cidadãos, que hoje vivem sob os ares constitucionais da Carta de 1988.

A MP 527 prevê um "segredo" dos orçamentos prévios da Copa...

A quem interessa esconder o jogo, usando uma expressão futebolística? A quem atende esse sigilo? Ao interesse público? Não. Aí, se seguir o sigilo, é possível até mesmo proceder-se de forma extravagante, com desvios e outras coisas. A publicidade tem o objetivo de buscar a eficiência mediante um acompanhamento pela imprensa, população...
Tem outras questões referentes à Copa, como flexibilizar licitações para agilizar o processo. O que o senhor acha disso?
Isso é péssimo porque abre um buraco. Hoje, se excepciona para isso, amanhã para outra coisa e daqui a pouco não teremos mais parâmetros. Nós não podemos cogitar de flexibilização de lei que busca justamente a lisura.

O argumento do governo é de que se houver publicidade nos preços, haverá acerto, acordão entre empreiteiras. O que o senhor acha dessa defesa da manutenção do sigilo?

Penso que o mercado tem uma sadia política: a concorrência. Eu não posso, a priori, partir do excepcional. Não posso pressupor que todos sejam salafrários até que provem o contrário. Vamos adotar o mecanismo para evitar esses conluios. Mas não o mecanismo do sigilo. A transparência é um valor que fala mais alto.

Esse sigilo pode ser chamado de inconstitucional?

Sim, a menos que se feche a Carta da República a qual todos se submetem. A publicidade é um princípio básico e que está na Constituição Federal. Podem coabitar o mesmo teto a publicidade e o sigilo? São coisas antagônicas.

O que isto significa para a democracia?

Paga-se um preço e o preço é o respeito às regras estabelecidas. É uma sinalização péssima, que tem uma leitura muito terrível e cáustica por parte dos cidadãos em geral. É um retrocesso.

Se essa mudança for mantida, os órgãos controladores como Tribunal de Contas da União só saberão das previsões dos gastos se o governo achar conveniente. Como o senhor avalia o tratamento dado aos órgãos de controle?

Pois é... Não tendo acesso, você vê que o sistema feito para a publicidade está primando pelo sigilo. Todo homem público e setor público que manuseia recursos públicos está compelido a prestar contas. Prestar contas a si mesmo não é prestar contas.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp