Política

Denúncia: Itagimirim é alvo de investigações por fraudes de títulos de eleitor

Publicado em 10/06/2016, às 16h38   Tamirys Machado


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“Pense no absurdo, na Bahia há precedentes”, clichê ou não, a clássica frase do ex-governador Otávio Mangabeira cai bem na situação eleitoral do munícipio de Itagimirim, região do Sul baiano. Em contato com o Bocão News, o vendedor Orisvaldo Júnior afirma ter transferido irregularmente 150 títulos de eleitor a mando da própria prefeitura. O fato curioso é que, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cidade tem 7.384 habitantes, e destes, 6.468 são eleitores, segundo dados oficiais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Isso significa que no município há apenas 916 pessoas em idade entre 0 e 15 anos e acima de 70 anos. 
Orisvaldo Júnior revelou como começou, segundo ele, o esquema de fraude nos títulos eleitorais. “Conheci Rodrigo, chefe de gabinete do prefeito quando trabalhava em Eunápolis. Ele me informou que o pai dele, Valter Ferreira [vice-prefeito] queria conversar comigo. Me fez a proposta para eu transferir 100 títulos e em troca eles me pagariam R$ 1,2 mil para fazer o serviço, mais um terreno e um emprego na prefeitura”, conta. O prefeito do município é o pepista Rogério Andrade de Oliveira (PP), que assumiu após a morte do ex-prefeito Rielson Santos Lima, que foi assassinado em janeiro de 2015. 
A função de Júnior era procurar pessoas com necessidades financeiras, oferecer cesta básica, exames clínicos dentários, remédios, material de construção e até mesmo dinheiro e articular a mudança do título de eleitor. Os valores variavam entre R$ 50 a R$ 100. O vendedor acusa ainda vereadores ligados à prefeitura de terem participado do esquema. “Os vereadores Márcio e Júnior Andrade (irmão do prefeito) também faziam isso. Eles chegavam aqui na cidade com ônibus de gente para fazer transferência”, disse. 
O caso está sendo investigado pela promotora de Justiça, Valéria Magalhães de Souza. Ao Bocão News, o Ministério Público Estadual informou que abriu, no último dia 28 de março, inquérito civil para apurar a suposta ocorrência de transferências fraudulentas de títulos eleitorais para o município de Itagimirim. 
Conforme a promotora, “as transferências estariam sendo promovidas por pré-candidatos às eleições municipais, por meio do oferecimento de dinheiro, cesta básica e lotes de terras para famílias com oito votos ou mais, garantindo-lhes o transporte ao Cartório Eleitoral, agendamento de horário e comprovantes falsos de domicílio para a efetivação da transferência”.
Ainda segundo Valéria Magalhães, até agora foi constatada a realização de aproximadamente 1,2 mil transferências supostamente irregular, que “lotaram a pauta de agendamentos do Cartório e fizeram o número de eleitores de Itagimirim ultrapassar 6,5 mil pessoas, em um município com um pouco mais de 7 mil habitantes”. A promotora informou que o inquérito está “na fase final de investigação”. Segundo o MP, já foram ouvidas cinco testemunhas e um investigado e realizada inspeção in loco dos endereços fornecidos para as transferências. Mais sete investigados devem ser ouvidos durante esta semana.
Questionado se existe essa quantidade alta de eleitores na cidade, comparado ao número de habitantes, e se isso poderia ser um indício de fraudes anteriores, a promotora informou que “vai fazer uma revisão geral de todos os eleitores, por conta desses dados, porém não existe nenhuma informação de fraudes em anos anteriores”, pontuou.  
A prática é considerada crime eleitoral e caso seja comprovada irregularidade, os denunciados responderão na Justiça Eleitoral. “É tipificado dentro da área eleitoral, caso seja identificada a irregularidade, mesmo que tenha crimes de falsificação de documentos, a finalidade foi burlar uma lei eleitoral”, explicou a promotora, por meio da assessoria do MP. 
Segundo relatos do vendedor Orisvaldo Júnior houve uma facilitação no cartório para fazer o trâmite. “De início eu transferi 40 títulos sem problema algum, eles não comparavam nem o nome do comprovante de residência com o do documento, no cartório eleitoral. Depois disso, eles travaram, dizendo que precisa de uma comprovação que as pessoas moravam no endereço. Foi então que ele [Rodrigo] pegava a xerox do comprovante de residência com o ponto de referência no punho, para que eu instruísse o pessoal a se alguém perguntar eles falarem a referência e dizer que morava no local a três, quatro anos”. “No cartório já tinha lista separada para Rodrigo, filho do prefeito. Eu chegava lá e pegava dez fichas de vez ”, revelou. 
Conforme Júnior, o chefe de gabinete, cadastrava o Número de Identificação Social (NIS) em branco com o nome da pessoa que iria transferir, porém com o endereço de Itagimirim. “O próprio Rodrigo assina como representante da Assistência Social”. Ele conta que Rodrigo (filho do prefeito) o entregou um envelope com comprovante de residência, da Coelba e Embasa com o endereço de Itagimirim e nomes de pessoas aleatórias. Ele não soube informar se os documentos eram falsos. 
O prazo estipulado pelo Tribunal Superior Eleitoral para alistamento e transferência terminou no dia 4 de maio. Conforme o vendedor, logo após o encerramento, os vínculos dele com a prefeitura municipal acabaram e a promessa de cargo não foi cumprida. Após a denúncia, Orisvaldo Júnior diz que está sofrendo ameaça de morte.
Ao Bocão News, o homem de nome Valter negou que tem qualquer vínculo com a prefeitura da cidade. Afirmou ainda que as ações contra ele são por motivações políticas. Ele se negou a prestar qualquer informação à reportagem do site. 
Rodrigo, que seria o filho de Valter não atendeu às ligações. A reportagem tentou contato com a prefeitura, mas não obteve êxito até o fechamento da matéria. 
O Tribunal Regional Eleitoral explicou que, “até o momento, não houve nenhuma denúncia do caso na Corregedoria do TRE, canal por onde poderia ter sido comunicado este tipo de situação”. O órgão informou ainda que “se tratando de eleições municipais, é um processo que deve estar sob a competência dos juízes eleitorais (que atuam nas zonas eleitorais)”. Sendo assim, só depois é que o processo chegaria a Corregedoria Regional Eleitoral (vinculada ao TRE).

Classificação Indicativa: Livre

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