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Estudo diz que audiências de custódia priorizam mais tipificação do crime que violência praticada

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Em entrevista ao BNews, o Procurador da República Cláudio Gusmão analisou o cenário mostrado em pesquisa do CNJ  |   Bnews - Divulgação Reprodução

Publicado em 20/01/2018, às 05h50   Tony Silva e Eliezer Santos


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As audiências de custódia no Brasil puniram mais os suspeitos por prática de roubo do que os suspeitos de assassinato. De acordo com um levantamento contratado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 86,8% das detenções por roubo transformaram-se em prisões preventivas, enquanto 75% dos suspeitos de assassinatos tiveram prisões provisórias.

A pesquisa admitiu que a tipificação do delito teve mais relevância para manter a detenção do que a violência empregada nos crimes.

Em números gerais, as audiências de custódia converteram 54% das prisões em flagrante em prisão preventiva. Casos violentos somaram 34,8% dos flagrantes e outros 43,6% não envolveram agressões.

Em conversa com o BNews, o procurador da República, do Ministério Público Federal (MPF) na Bahia, Cláudio Gusmão, que já atuou como juiz e promotor de justiça na vara crime, comentou sobre os elementos da pesquisa.

“O que ocorre na verdade, é que sempre haverá um número de maior de casos submetidos às audiências de custódia envolvendo os crimes de furtos e roubos, porque os crimes contra o patrimônio ocorrem sempre em maior número”.

Gusmão ressaltou que geralmente os crimes de homicídio são apurados no curso do inquérito, o que influencia no resultado. "Não é tão comum haver flagrante em relação a crimes de homicídio. É natural que haja uma concentração ou que a própria rotina as audiências de custódia alcancem mais significativamente os crimes contra o patrimônio, ensejando a prisão daqueles que praticam os crimes mediante violência, que o caso do roubo. Além disso, esse aspecto não interfere na gestão da administração da Justiça”.

Segundo Gusmão, a tipificação do delito analisada na pesquisa, tendo como parâmetro o comparativo a violência, revela um equívoco na leitura, porque efetivamente são dois aspectos que serão considerados e que necessariamente implicarão em um número maior dos flagrantes em preventiva.

O procurador do MPF também comentou a análise publicada pelo CNJ que relaciona o histórico criminal e cor do suspeito como influência na decisão de prender.

De acordo com o levantamento do CNJ, dos detidos, 51% tinham antecedentes e outros 39% eram primários. Seguiram presos 65,4% dos reincidentes, enquanto o mesmo ocorreu para apenas 37,3% dos detidos sem registro anterior. Foi concedido o dobro de liberdades provisórias para primários (52,8%) do que para reincidentes (26%). Pessoas brancas ficaram presas em 49,4% dos casos e receberam liberdade provisória em 41%. Já entre pretos e pardos a prisão foi mantida em 55,5% das vezes e relaxada em 35,2%.

“Eu reputo também questionável a afirmação de que ser negro é outro fator que eleva a chance de seguir preso. Primeiro que os parâmetros adotados para quantificar percentualmente o número de prisões envolvendo negros e pessoas brancas, como está no estudo, o percentual não apresenta uma diferença tão significativa, uma margem de 5% de diferença, e na verdade pela minha experiência no sistema de justiça, sobretudo no âmbito federal, não há influência na análise na concessão ou não da liberdade provisória, em razão desse elemento, de se tratar de negro, branco ou mesmo pardo”, argumenta Cláudio Gusmão.

Igual raciocínio, segundo ele, se aplica aos suspeitos em situação de rua. Conforme o estudo, pessoas sem residência fixa ganharam liberdade provisória em 43,2% dos casos, taxa que foi de 52,9% para as demais. "O estudo desconstrói a percepção de que a situação de rua implicaria uma postura discriminatória, o que fragiliza a leitura acerca da diferença de tratamento em razão da cor da pele", concluiu. 

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