Política

Especialistas analisam os efeitos da absolvição de Lula para o tabuleiro político na Bahia e no Brasil em 2022

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Edson Fachin anulou as condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em processo da 13º Vara Federal de Curitiba, no âmbito da Lava Jato  |   Bnews - Divulgação Divulgação Guia Sul 21

Publicado em 09/03/2021, às 14h29   Raul Aguilar


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A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, de anular todos as condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em processo da 13º Vara Federal de Curitiba, no âmbito da Lava Jato, ato que restabeleceu os direitos políticos de Lula, deverá afetar o tabuleiro político nacional e na Bahia em 2022. 

O BNews foi ouvir especialistas para entender como essa decisão do STF poderá impactar a disputa à presidência da República e ao governo da Bahia nas eleições que ocorrerão no próximo ano.

No cenário nacional, a tendência é que o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), deve se candidatar à reeleição, podendo enfrentar o ex-presidente Lula, ressuscitando assim o sentimento de polarização entre petistas e bolsonaristas, como ocorreu nas eleições de 2018.

“Imediatamente, a elegibilidade de Lula causa um rearranjo no cenário de 2022 no Brasil. Lula é uma liderança nacional com recall, tem voto, competitividade eleitoral. A questão é que essa chegada de Lula também mexe na base bolsonarista. É bom lembrar que houve uma migração de parte do lulismo. A inegibilidade de Lula, em 2018, fez com que parte de sua base migrasse para Bolsonaro, conseguimos perceber isso; Bolsonaro teve, sim, parcela de voto de eleitores lulistas, que votaram no PT nas eleições anteriores”, explica o cientista político e professor da Unilab, Cláudio André.

O professor acredita que, caso o ex-presidente se candidate, deve ocorrer um movimento de retorno de parte desses eleitores que estão em desencanto com o governo Bolsonaro, que prometeu diversas medidas de efeito social, a exemplo na redução no custo de alimento e no gás, e que não cumpriu. André cita também o processo da imunização, que, segundo acredita, caso o presidente da República não se movimente, deverá afetar sua avaliação e sua base eleitoral até 2022. 

 A avaliação do cientista político é de que com Lula, a direita radical, encarnada em Jair Bolsonaro, e a direita liberal, ainda com muitos representantes, deverão se movimentar, sob risco de enfrentarem uma esquerda fortalecida. 

“O enfraquecimento do bolsonarismo pode tirar da zona de conforto a direita liberal, forçando a se apresentarem com uma candidatura alternativa aglutinadora. O centrão, o DEM e PSDB esperavam que o enfraquecimento de Bolsonaro levaria ao fortalecimento de uma terceira via, com a chegada de Lula, o ‘fator Lula’ pode provocar um enfraquecimento de Bolsonaro e o fortalecimento da esquerda. A Direita liberal sai da zona por um hipotético segundo turno. Isso vai de alguma maneira forçar com que as negociações, articulações para esse nome que vai ocupar a terceira via precisa ser colocada com brevidade”, destacou o professor da Unilab. 

Para o professor da UFBA e especialista em história política, Carlos Zacarias, o cenário de 2022 ainda é incerto, e o mesmo ocorre ainda com elegibilidade de Lula, que até lá será julgado pela Justiça Federal do Distrito Federal, bem como o caso do juiz que decretou sua prisão, Sérgio Moro, que terá condução apreciada de sua suspeição. Ele aponta que, com um segundo turno entre Lula e Bolsonaro, haverá o retorno da polarização vista em 2018.

“Em cenário em que o PT lance a candidatura de Lula e Jair Bolsonaro seja o candidato a presidente, que é o cenário provável, essas duas candidaturas vão polarizar a eleição; não digo polarizar no sentido de que são dois extremos, não, há um extremo que é o Jair bolsonaro e há o tradicional, a política comum que é do PT. Então há uma polarização no sentido de que qualquer de duas candidaturas que vão para o segundo turno vão polarizar os votos”, sinaliza o professor da UFBA.

Bahia

Carlos Zacarias avalia que uma disputa entre o atual presidente da República e Lula irá impactar significativamente o pleito ao Governo da Bahia: “Isso certamente impacta na Bahia, porque o DEM de ACM Neto tem um forte candidato que é o próprio ACM Neto a disputa do pleito em 2022 e ACM Neto está avaliando como ele se aproxima ou não de Jair Bolsonaro, está medindo muito bem politicamente os prós e os contras desta aproximação”.

Ele aponta que Neto ficou enfraquecido após o imbróglio envolvendo a eleição para presidente da Câmara, onde seu partido havia declarado apoio para o deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e por fim terminou, por decisão da maioria, declarando a isenção. Ele acredita que o foco de ACM Neto seja em seduzir o Partido Progressista (PP) e o Partido Social Democrático (PSD) buscando ampliar sua base de apoio.

Para Cláudio André, ACM Neto terá que avaliar como irá se comportar eleitoralmente com Lula na disputa. Se irá apostar na polarização ou se irá suavizar o discurso se colocando como uma terceira via ao lulismo e ao bolsonarismo. Ele avalia que no cenário com Lula na disputa à presidência, o nome do atual senador pelo PT, Jaques Wagner, ganhará força.

“Vejo que Wagner se tornou o favorito, até pelo recall, por ter sido eleito senador em 2018, governador duas vezes, por ter uma margem significativa de aprovação de seu governo entre os baianos. O fator Lula vai impactar aqui. É importante destacar como fica a aliança local PT-PSD-PP, esse arranjo político com candidatura de Lula pode pavimentar retorno de Wagner ao governo estadual”, opinou Cláudio André.  

Polarização

O filósofo e professor da UFBA, especialista em comunicação política, Wilson Gomes, esclarece que o conceito de polarização está sendo empregado erroneamente na análise de um eventual embate entre o lulismo e o bolsonarismo. “Cuidado com esse conceito de polarização. A polarização supõe radicalização das posições por um ou mais dos polos políticos, e o abandono, por parte pelo menos de uma fração significativa dos participantes do debate público e do eleitorado, das posições intermediárias, quer dizer, mais moderadas e mais propensas a estabelecer compromissos”, explica Gomes. 

Wilson lembra que Lula “por anos, pelo menos desde 2002, a posição centro-esquerda do espectro político” e portanto, “bem longe da radicalização”.

“Quem tem uma posição permanentemente radical é Bolsonaro é o bolsonarismo, que precisam necessariamente criar tensão, buscar posições extremas e distanciar-se de qualquer tipo de moderação. O bolsonarismo é que atraiu o eleitor de centro e de direita para a extrema-direita. E o lavajatismo fez com o que o restante do centro desertasse do PT, que foi empurrado para a esquerda, mas muito longe de uma posição polarizada, quer dizer, radicalizada”, destacou Gomes. 

O professor da UFBA pontua que “quem está no extremo”, os outros é que estão longe da posição justa, “e não ele”. Ele acredita que no sentido da polarização ligado à radicalização, o PT e Lula não iriam ser enquadrado: “Não há qualquer sinal disto no horizonte, se quisermos ser honestos politicamente. Talvez esperar o perfil “Lulinha Paz e Amor” seja demais, com tanto ressentimento no ar, mas um Lula extremista, entrincheirado em um dos polos, é um espantalho que os jornalistas e os seus adversários precisam inventar porque o temem”.

Wilson Gomes classifica como lances as especulações o “risco Lula” do mercado ou o argumento de que Lula “é o adversário ideal para Bolsonaro”: Ele pontua que “não são fatos, algo que se possa demonstrar”, mas que “são lances, jogadas para enfraquecer um adversário, forma de espantar o eleitorado dele e nada mais”.

Redes sociais

Rodrigo Carreiro, Pesquisador do instituto nacional de ciência e tecnologia em democracia digital (INCT.DD) e doutor em comunicação e cultura contemporâneas, acredita que nas redes sociais, principal palco da disputa à presidência de 2018, pleito esse que está sendo apurado pela Comissão Mista de Inquérito que investiga o uso de Fake News, o clima deverá ser menos bélico e de uma patrulha maior no ambiente virtual, já que estratégias adotadas naquele período, legais e ilegais, não poderão se repetir, dada a mudança na legislação e em protocolos e algoritmos das redes sociais.   

“Por um lado, haverá mais patrulha e cuidado para tentar dissolver o poder das fake news e da desinformação, que correu solto em 2018. Isso será feito por meio de legislação e de novas práticas adotadas pelos órgãos eleitorais (se vai dar certo é outra história). Por outro lado, o modelo de organização das forças conservadoras, que em certa medida estavam dispersas pré-2018, é um ponto a ser observado por todos”, pontuou Carreiro. 

O doutor em comunicação e cultura contemporâneas acredita que houve um aprendizado no campo da esquerda do modus operandi dos bolsonaristas e que disputa nas redes deverá ser mais acirrada, com ambos os lados conhecendo os mecanismos.

“Obviamente que os apoiadores do presidente permanecem na ativa e estão se fortalecendo ao longo desses anos. Mas a oposição se volta, de alguma maneira, para entender como esses grupos conseguiram se capitalizar e utilizar as mais diversas ferramentas digitais para tal, explorando suas funcionalidades ao máximo. Diante disso, o embate nas redes promete ser mais acirrado, uma vez que não há mais o fator novidade de Bolsonaro e seus apoiadores. O jogo está mais claro para todos”, ressalta o pesquisador do INCT.DD.

Classificação Indicativa: Livre

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