Política

Salles e equipe são suspeitos de apoiar contrabando e perseguir agentes públicos

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Parte foi afastada para não atrapalhar investigação, após intimidação de servidores que colaboram com a PF  |   Bnews - Divulgação Lula Marques/Fotos Públicas

Publicado em 22/05/2021, às 07h30   Folhapress


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Sob o comando do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o suposto esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais, segundo a Polícia Federal, envolve desde a elaboração de pareceres técnicos, a emissão de licenças e a fiscalização até o julgamento das multas.

As associações do setor madeireiro Confloresta e Aimex, assim como as empresas Tradelink, Ebata e Wizi, são investigadas por pressionar agentes a regularizar cargas ilegais, em um esquema que teria envolvido 12 agentes públicos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e do MMA (Ministério do Meio Ambiente).

A Polícia Federal investiga a emissão de licenças retroativas —dadas após a exportação, o que inviabiliza a fiscalização e a extinção da obrigatoriedade de licença— em despacho assinado pelo presidente do Ibama após reunião do ministro com madeireiras. O processamento das multas também é suspeito de beneficiar empresas por meio de interferências do assessor especial de Salles, Leopoldo Butkiewicz.

A perseguição a servidores técnicos que geraram documentos contrários ao interesse do suposto esquema também é um dos motivos de afastamento dos nomes ligados a Salles.

A decisão do STF, que autorizou a operação de busca e apreensão feita pela Polícia Federal na quarta (19), detalha a participação de cada um dos 12 funcionários da pasta ambiental investigados no suposto esquema.


Foto: IBAMA

Ricardo Salles

O ministro do Meio Ambiente se reuniu, em 6 de fevereiro de 2020, com representantes das associações Confloresta (que reúne 11 concessionárias florestais, incluindo responsáveis pelas cargas exportadas pela Tradelink) e Aimex, que representa 23 empresas do ramo de exportação de madeiras, entre elas a Tradelink e a Ebata. O pedido das associações de extinção da licença de exportação foi recebido pelo Ibama no mesmo dia e atendido integralmente via despacho do presidente do órgão, Eduardo Fortunato Bim.

Eduardo Fortunato Bim

O presidente do Ibama assina o despacho que revoga a licença de exportação, contrariando a nota técnica elaborada pelos especialistas do órgão e contemplando o pedido das madeireiras, “legalizando, com efeito retroativo, milhares de cargas exportadas entre 2019 e 2020”, segundo o documento do STF.

Olivaldi Alves Azevedo Borges

Como diretor de proteção ambiental do Ibama, participou da reunião de Salles com madeireiros e teria conhecimento das irregularidades nas licenças.

Walter Mendes Magalhães Júnior

Como superintendente regional do Ibama no Pará, emitiu em fevereiro de 2020 certidões atestando a regularidade das exportações de madeiras da empresa Tradelink, apreendidas por autoridades americanas e europeias, e da Ebata. Ele também produziu uma nota informativa que, segundo análise do técnico do Ibama Carlos Egberto Rodrigues, teria informações falsas.

Artur Vallinoto Bastos

Analista ambiental do Ibama no Pará, foi responsável pela emissão da licença de exportação para a empresa Wizi em janeiro de 2020. A licença foi revogada após os questionamentos das autoridades americanas e, para a Polícia Federal, sua emissão “foi flagrantemente ilegal”.

João Pessoa Riograndense Moreira Júnior

Diretor de biodiversidade e florestas do Ibama, participou da reunião de Salles com madeireiras e elaborou uma segunda nota técnica para substituir a que contrariava o despacho favorável às empresas.

Rafael Freire de Macedo

Analista ambiental do Ibama e substituto de João Pessoa Riograndense, também colaborou na nota substituta que subsidiou o despacho favorável às madeireiras. Também elaborou um ofício para atestar a regularidade da carga da empresa Ebata, que foi apreendida por autoridades americanas.

Olímpio Ferreira Magalhães

Como superintendente do Ibama no Amazonas, foi responsável pela remoção de setor do servidor Carlos Egberto Rodrigues após o técnico ter apurado irregularidades nas informações fornecidas por Walter Mendes Magalhães Júnior.

Leslie Nelson Jardim Tavares

Coordenador de operações de fiscalização do Ibama, ele teria afirmado, segundo testemunhas, que a remoção do servidor Egberto Rodrigues teria sido uma resposta dada por ele e por André Heleno Azevedo Silveira ao fato do servidor estar em "contato direto com a Polícia Federal".

André Heleno Azevedo Silveira

O agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) teria participado da remoção do servidor com o objetivo de criar obstáculo a investigações da Polícia Federal.

Wagner Tadeu Matiota

O superintendente de apuração de infrações ambientais do Ibama teria intimidado o servidor Hugo Leonardo Mota Ferreira, que elaborou uma nota técnica relatando dificuldades no processamento das autuações do órgão.

Leopoldo Penteado Butkiewicz

Assessor especial de Salles, ele teria interferido diretamente em processos de autuação do Ibama. Para a Polícia Federal, sua ação “configuraria patrocínio direto de interesses privados de autuados perante a administração pública”.

“Servidores que atuaram em prol das exportadoras foram beneficiados pelo ministro com nomeações para cargos mais altos, ao passo que servidores que se mantiveram firmes em suas posições técnicas foram exonerados por ele", afirma a Polícia Federal em trecho destacado pela decisão do STF, que também afastou os agentes públicos suspeitos, à exceção do ministro, que conta com foro privilegiado, e Walter Magalhães, que foi exonerado do Ibama em novembro.

Outro lado

O ministro Ricardo Salles classificou a operação como desnecessária e exagerada. “Até porque todos, não só o ministro como todos os demais que foram citados e incluídos nessa investigação, estiveram sempre à disposição para esclarecer quaisquer questões", disse.

“Todos os produtos florestais da Ebata têm origem comprovadamente lícita”, disse em nota a madeireira. A empresa também afirmou que a revogação da licença para exportação foi tratada “exclusivamente no âmbito das associações de classe”.

Em nota conjunta, as associações Confloresta e Aimex, cujos associados incluem as empresas Ebata e Tradelink, afirmaram que os produtos exportados e investigados não podem ser rotulados como ilegais ou contrabandeados, porque contam com documentação dos órgãos ambientais e “foram exportados através de portos alfandegados, com desembaraço aduaneiro junto à Receita Federal”.

As associações também afirmam que a licença revogada pelo Ibama era “um instrumento de controle obsoleto que havia sido substituído pelo controle digital”.

A madeireira Wizi foi procurada por meio de emails e telefones, mas não retornou aos contatos da reportagem.

Os agentes públicos Eduardo Fortunato Bim, Olivaldi Alves Azevedo Borges, Artur Vallinoto Bastos, Leslie Nelson Jardim Tavares, André Heleno Azevedo Silveira, Olímpio Ferreira Magalhães e Rafael Freire de Macedo foram procurados por email, telefones fixos e celulares, mas não retornaram às tentativas de contato.

Leopoldo Penteado Butkiewicz, assessor especial do Ministério do Meio Ambiente, respondeu por telefone que não deve se manifestar até ter acesso ao processo da investigação.

A reportagem não conseguiu localizar os contatos do ex-superintendente do Ibama no Pará, Walter Mendes Magalhães Júnior.

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