Coronavírus

Diretor de farmacêutica diz à CPI que gastou R$ 717 mil em anúncios de ivermectina mesmo sem estudos

Jefferson Rudy/ Agência Senado
Segundo Barbosa informou em seu depoimento, a empresa faturou R$ 15,7 milhões em 2019, quantia que passou para R$ 470 milhões no ano passado  |   Bnews - Divulgação Jefferson Rudy/ Agência Senado

Publicado em 11/08/2021, às 16h52   Folhapress


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Em depoimento à CPI da Covid, nesta quarta-feira (11), o diretor do laboratório Vitamedic, Jailton Barbosa, afirmou que a empresa destinou R$ 717 mil para anúncios na mídia que defendem o tratamento precoce contra a Covid-19.

Por outro lado, Barbosa também reconheceu que a empresa não realizou estudos para verificar a eficácia da ivermectina para tratar a doença. O medicamento é considerado carro-chefe do laboratório, que multiplicou a venda durante a pandemia do novo coronavírus.

Segundo Barbosa informou em seu depoimento, a empresa faturou R$ 15,7 milhões em 2019, quantia que passou para R$ 470 milhões no ano passado.

Mesmo sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19, a Ivermectina integrou o chamado "kit Covid" e muitos negacionistas passaram a indicar o vermífugo para tratar a doença. Um dos principais defensores da ivermectina foi o presidente Jair Bolsonaro.

No entanto, Barbosa afirmou não ser possível medir o impacto das falas de Bolsonaro na venda de comprimidos de ivermectina.

A Vitamedic entrou no radar da CPI por causa de seus ganhos durante a pandemia. O colegiado já quebrou os sigilos do proprietário da empresa, José Alves. O empresário era quem compareceria para o depoimento na comissão. No entanto, a defesa da empresa pediu a substituição por Barbosa, alegando que ele é o diretor-geral.

Barbosa confirmou reportagem do jornal Folha de S.Paulo que mostrou que a Vitamedic financiou a publicação de um manifesto da Associação Médicos do Brasil, em defesa do tratamento precoce. O diretor revelou à CPI que foram investidos nesses anúncios R$ 717 mil, uma ação de divulgação que não havia sido implementada nas quatro décadas de existência da empresa.

"A realidade mudou. A gente entendia que uma publicação de cunho médico-científico poderia ter o nosso interesse de patrocinar, e foi isso que delineou a nossa decisão", afirmou.

O diretor ainda afirmou não haver desvio ético na ação, uma vez que o tratamento precoce não envolve apenas a ivermectina.

Os membros da comissão questionaram o fato de que muitos desses anúncios foram publicados em fevereiro, após o colapso do sistema de saúde de Manaus. A apuração da CPI indicou que o Ministério da Saúde buscou disseminar o tratamento precoce na capital amazonense, durante a crise sanitária, sem sucesso.

"Esse manifesto é após a morte de mais de 200 pessoas por dia na cidade de Manaus. E nem isso sensibilizou o laboratório em perceber que era um engodo, que era uma mentira, que eram fake news. Visou lucro, mancomunado com alguns médicos. Se isso não for crime, não tem mais nenhum crime para a gente investigar aqui nesta CPI", afirmou o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM).

Os senadores da comissão ainda ressaltaram que a Vitamedic realizou direta ou indiretamente outras formas de propagação do tratamento precoce. A empresa pertence ao mesmo grupo que também controla uma universidade, chamada Unialfa. 

A instituição de ensino realizou uma série de palestras e lives em defesa do uso de medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19. Muitos dos vídeos figuram José Alves, proprietário da empresa.

"O senhor José Alves não é médico, mas faz a recomendação, faz contato com prefeito, busca médicos para lucrar com a venda da ivermectina. E depois, a Unialfa, que é a universidade do grupo, faz uma live com o Médicos pela Vida, apresentando a plataforma do Médicos pela Vida. Qual o detalhe? É que a Unialfa entra em uma campanha em favor da Vitamedic, que vai lucrar com isso", disse o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Por outro lado, o diretor da Vitamedic reconheceu que o laboratório que desenvolveu a ivermectina, a americana Merck, publicou estudo no qual atesta que o medicamento não tem eficácia comprovada para o tratamento da Covid-19.

O próprio Barbosa também disse que a empresa que representa não buscou financiar estudos para verificar a eficácia da ivermectina, antes de propagar o tratamento precoce.

O diretor afirmou que não foram fornecidos comprimidos para o governo federal. No entanto, a empresa mantém contratos com estados, inclusive para o fornecimento de ivermectina. Por causa disso, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) pediu o bloqueio dos bens da empresa, enquanto durar a investigação da comissão. O pedido foi acatado pela cúpula do colegiado, que vai ingressar na justiça com pedido de medida cautelar.

"Em que pesem as tentativas do depoente de informar que apenas atendeu a demanda do mercado, essas compras são claras violações ao interesse público e às normas que regem as compras públicas no País. Eu sugiro que seja feito um pedido cautelar à Justiça Federal pra que bloqueie recursos suficientes pra garantir o ressarcimento aos cofres públicos enquanto durar essa investigação. Eu acho que essa é uma medida cautelar que a CPI deve tomar", disse Contarato.

Em alguns momentos da sessão, houve discussão entre os senadores, uma vez que alguns deles defendem os medicamentos sem eficácia comprovada no tratamento da Covid-19. Luis Carlos Heinze (PP-RS), defensor do kit covid, quis mostrar um vídeo para rebater Otto Alencar (PSD-BA), que nem estava presente neste momento da sessão e se recupera da Covid-19. Foi impedido por Eliziane Gama (Cidadania-MA), que presidia a sessão. A senadora ainda afirmou que não era pertinente a atitude de Heinze, que ainda foi chamado de propagador de fake news.

Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse que iria acrescentar essas falas negacionistas de Heinze ao processo no Conselho de Ética.

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