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Denúncia: Em conversa gravada, deputado do PP cobra apoio de conselheiro tutelar em eleição de Dias D'Ávila

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Durante a conversa, o parlamentar teria sugerido que o conselheiro fizesse um “jogo duplo”  |   Bnews - Divulgação BNews/Arquivo

Publicado em 07/10/2020, às 18h06   Marcos Maia e Luiz Felipe Fernandez


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Uma disputa pelo apoio do Conselho Tutelar e do pastor da Assembleia de Deus em Dias D'Ávila virou motivo de briga na cidade e troca de acusações. Em uma conversa gravada e obtida pelo BNews, o deputado federal Cláudio Cajado (PP) cobra de um conselheiro tutelar o apoio à candidatura da sua esposa, Andreia Xavier, à Prefeitura de Dias D’Ávilla.

Durante a chamada, o conselheiro identificado como Rafael Correia reluta em concordar com o apoio à ex-prefeita, nomeada em janeiro para assumir a direção financeira da Desenbahia. Membro da Igreja Assembleia de Deus, ele alega que conversou com o Pastor Uziel Couto, que recomendou que apoiasse o candidato Geraldo Requião (PSD), que é vice-prefeito da cidade há 8 anos e candidato da base da atual prefeita Jussara Márcia (PT).

O argumento do pastor, segundo Rafael, é de que a igreja apoiou a sua indicação ao Conselho Tutelar, que teria sido responsável por “80% dos votos”.

Do outro lado, o parlamentar repete que gostaria de se reunir com os outros membros do Conselho Tutelar para discutir o apoio à candidatura pepista. Em certo momento, Cajado questiona que o “jogo” poderia ser feito para que nem Rafael, nem a igreja ou o pastor, fossem “se prejudicar”.

Rafael, então, diz que o encontro não depende apenas dele e que precisa passar a situação para os outros membros do colegiado - formado por cinco pessoas. "Tenho que conversar com eles para ver realmente o que vai decidir", disse. 

O parlamentar sugere que Rafael converse individualmente com os colegas. O conselheiro explica que tem conversado com os demais integrantes de forma remota, em virtude da pandemia da Covid-19, e que eles estão trabalhando em um regime de escala que não permite que todos estejam juntos no mesmo dia. 

"Se vocês fizerem isso a gente bate um papo sobre a questão de vocês aí do conselho tutelar, que eu acho que é importante, [...] mas é importante também ver se tem diferentes apoios ou não para a gente poder se organizar. Se declara apoio e vai à campo, é um cenário. Se não declara, e não vai para campo, é outro. Entendeu? Vocês têm um grupo que tem interesses junto a prefeitura", diz Cajado.

Em seguida, o deputado propõe que Rafael faça um “jogo duplo”, no qual finja que está apoiando Geraldo Requião, quando “na verdade não está”.

"Seguindo a orientação de Uziel, e Andreia ganhando, onde ele estiver, nós estaremos contra. Eu achava que você teria de fazer com Uziel um jogo - dizer que está e na verdade não está. Agora, eu preciso saber se você tem interesse ou não de estar com a gente, como seu pai está", questiona.

Segundo o deputado, era preciso que o conselheiro agisse como “bandido”, já que estava lidando com outro “bandido”, que seria o Pastor Uziel.

Rafaela diz que o Pastor argumentou que ele não poderia apoiar um grupo político com o qual a igreja não está. Cajado, por sua vez, contra-argumentou que a totalidade da igreja não apoia Geraldo. "Para mim é uma forçação de barra que não reflete de fato o que está acontecendo dentro da igreja. Ele foi para Geraldo por interesse pessoal", acrescentou.

O parlamentar então argumenta que Correia precisa ter habilidade para negociar com o pastor, porque fazer o que Uziel quer vai acabar prejudicando a ele mesmo, já que ganhando, teria “condições de estruturar melhor o conselho”.

“Vocês têm interesse como membros de um conselho tutelar. Eu tenho condições de estruturar melhor o conselho. Quero conversar com vocês para ouvir quais são as demandas e avaliar. [No que] Andreia ganhando, a gente pode fazer. Agora, se vocês e os demais se posicionam contra Andreia, tudo bem. É uma opção. Agora, não contem com a gente", advertiu.

O conselheiro segue relutante em passar por cima da autoridade do pastor, e Cajado diz que Uziel fez "jogo duplo" com ele no passado - "mentindo e enganando" -, sem entrar em detalhes. Por fim, Cajado aconselha que os membros do Conselho Tutelar explicitem se vão apoiar alguém ou não nas eleições, para que fique claro "quem ajudou na construção ou não".

Em entrevista ao BNews na tarde desta terça-feira (6), Rafael Correia explicou que gravou a conversa - ocorrida há pouco mais de um mês - por "preocupação", "receio" e "medo". "O deputado acusou o meu pastor de várias e várias denúncias, e meu pastor, sem prova alguma, não pode rebater", diz. Ele completa que gravou para garantir que não houvessem dúvidas da postura que havia adotado durante a conversa com o parlamentar.

"Foi mais uma questão de querer me amedrontar ou me persuadir. E o tempo todo eu falava que não, que não aceitava os métodos que ele usa para conquistar um apoio. E entendo que esse apoio que ele queria era apenas para afetar o meu pastor", continuou. 

Ele admite que enviou a gravação para “pessoas de confiança”, mas garante que não teve envolvimento com o vazamento. 

Frequentador da Assembleia de Deus no município, ele conta que é conselheiro tutelar desde janeiro deste ano - o mais jovem de Dias D'Ávila, sendo eleito aos 21 anos. Ele afirma que o primeiro contato com o parlamentar aconteceu na residência de Cajado para tratar sobre a campanha de seu pai, que na época era pré-candidato a vereador da cidade pelo PSB. 

O pai, o pastor Sinval, acabou abrindo mão da disputa e, quando foi avisar a Cajado, o deputado teria expressado o desejo de ter o apoio do conselho tutelar. Rafael, contudo, reforça que qualquer apoio seria “pelo cidadão Rafael”, não como conselheiro, já que faz parte de um “órgão federal”, onde os membros devem ser “neutros”.

Sinval procurou a reportagem para contar a sua versão e disse que o filho serviu como "massa de manobra" do pastor Uziel. Ele defende o deputado Cláudio Cajado e diz que foi ele quem procurou o parlamentar e em nenhum momento houve o pedido de apoio do Conselho Tutelar. "Eu não contribuo com essa farsa", declarou.

Ele critica o argumento que teria sido utilizado por Uziel para convence Rafael de apoiar Requião, de que a maior parte dos seus votos tinham sido "da igreja".

De acordo com Sinval, as diretrizes na Assembleia de Deus mudaram e o pastor passou a misturar "política com religião". Apesar de ter ensinado o contrário, agora afirma ser necessário que o filho "se volta contra o seu líder".

"A vida toda eu, como pastor, ensinei que não deveria der desobediente ao pastor. Mas com esse ato inusitado que ele tem que se voltar contra o seu líder, que botou na mente dele que ele foi eleito pela igreja, mas ele foi eleito pelo povo", ponderou.

O QUE DIZ O DEPUTADO

O deputado Cláudio Cajado reconheceu a veracidade da conversa e diz que tanto a gravação quanto o vazamento têm objetivo político de prejudicar a candidatura de Andreia Xavier. 

O apoio pedido na conversa telefônica seria somente a Rafael Correia e a outros membros do Conselho como indivíduos, não como órgão federal.

“Algo inadequado, gravando a conversa, achei uma coisa maldosa. É interesse político”, disse Cajado, que listou obras feitas durante o mandato da esposa. “Em Dias D’Ávila não tem política social, saúde de qualidade, educação”, completou.

Ao BNews, o parlamentar explicou que em nenhum momento fez ameaças a Rafael nem ao Conselho Tutelar. As promessas de melhoria, segundo ele, seriam pela própria qualidade da gestão de Andreia.

De acordo com o pepista, o pastor teria inicialmente declarado apoio à Andreia, mas que recuou posteriormente após Geraldo Requião “oferecer” uma secretaria a um candidato a vereador que também é membro da igreja do Pastor Oziel.

Cajado alega que Andreia não tem como prática a negociata de secretariados e por isso a conversa com Oziel não progrediu.

O QUE DIZ O PASTOR

Do outro lado, o pastor citado na conversa nega que em algum momento tenha declarado apoio a Andreia. Ele confirma que existiu uma conversa, mas que não foi para frente pois ele pediu “espaço no governo”, o que foi recusado.

Pastor Uziel reiterou que o seu apoio é pessoal e não se estende aos fiéis da Assembleia de Deus. “O povo da igreja pode votar em quem quiser”, garantiu.

O líder religioso lamentou a situação em que envolve o deputado, com quem diz nutrir até então “uma boa relação”. 

“Não precisava falar mal de mim, isso não é nem palavreado de um deputado”, criticou.

DINHEIRO EM TROCA DE APOIO

Segundo Pastor Uziel, o deputado do PP chegou a oferecer uma quantia em dinheiro em troca do seu apoio, que foi negada por ele.  “Disse que só tinha interesse em uma pasta”, pontuou.

Cajado nega a acusação e diz que o próprio pastor pode ter ido “pedir dinheiro” a alguém da campanha, mas que o fato ele nunca teria oferecido.

"Essa história de dinheiro foi outra pessoa. Não sei se pediu, mas pra mim não teve essa história. A secretaria, de fato, ele tentou negociar. Andreia - que deveria responder por isso - pelo que sei ela não negocia secretaria. Eu também acho sujo, já que o interesse da cidade fica em segundo plano", assegurou.

*Matéria atualizada dia 8 de outubro de 2020, às 12h50

Classificação Indicativa: Livre

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