Salvador

Com investimento de quase R$ 5 milhões, elevadores para cadeirantes em Salvador continuam sem funcionar

Vagner Souza / BNews
Esta semana, a equipe de reportagem do BNews voltou aos dois locais e relembrou denúncias feitas desde 2017  |   Bnews - Divulgação Vagner Souza / BNews

Publicado em 19/04/2019, às 08h17   Brenda Ferreira


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Depósito para lixo, tela para pichação e refúgio para moradores em situação de rua. Essa é a funcionalidade de oito elevadores construídos em 2013 para atender cadeirantes em quatro passarelas na Via Expressa, em Salvador, ao custo de R$ 4,9 milhões.  

O equipamento também foi instalado na passarela que dá acesso ao estádio de Pituaçu e deveria facilitar a vida de pessoas com dificuldade de locomoção. Após seis anos, os elevadores continuam sem funcionar, mesmo com a estrutura pronta.

Esta semana, a equipe de reportagem do BNews voltou aos dois locais e relembrou denúncias feitas desde 2017. Até hoje, o caso segue sem resposta concreta por parte dos responsáveis pelo equipamento.

Apesar das estruturas conterem pichações, fios arrancados, botões quebrados e falta de iluminação, a Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder) garantiu que “todos os equipamentos estão com a infraestrutura concluída e aptos para a operação, sob o ponto de vista técnico”.

A Conder ainda justificou que, na época, o atraso registrado ocorreu pelo ineditismo da implantação de elevadores em passarelas, o que demandou um tempo a mais do que o previsto no desenvolvimento dos projetos. Assim como no processo de fabricação e instalação.

Mas, para quem anda a pé, ainda existe a possibilidade de atravessar a passarela pela rampa. E quem anda sozinho, com cadeira de rodas? Como atravessar por uma Via Expressa, onde não há semáforo ou faixa de pedestres?

Quem respondeu aos questionamentos foi José Rocha, 60, atleta de dança e mestre de capoeira, que virou cadeirante após sofrer uma secção medular* há 31 anos. Atualmente ele convive com os desafios diários de locomoção na capital baiana. “Um elevador naquela via [Expressa] funcionaria até que horas? Qualquer pessoa, não só deficiente físico, ia ser uma vítima. Subir e descer o elevador qualquer hora do dia numa via daquela? Eu não me arriscaria. Preferiria passar direto do que subir um elevador daquele”, criticou.

José relatou ao BNews que, na maioria das vezes, sai de casa sozinho e sugeriu que todas as passarelas de Salvador deveriam ter elevadores que funcionassem. “Os elevadores [dos ônibus] ajudam bastante, não podemos falar mal. Mas a manutenção é horrível”, denunciou, ao citar as plataformas elevatórias dos ônibus, que segundo ele é outro desafio.  

José também precisa sair porque frequenta as rodas de capoeiras pela capital, além de atuar na área artística da Associação Baiana dos Deficientes Físicos (Abadef). De acordo com a associação, os cadeirantes correspondem a 24% da população da Bahia. Ao BNews, a presidente da Abadef, Luiza Câmera, 75 anos, avaliou o não-funcionamento dos elevadores das passarelas da Via Expressa como um “desleixo”.

“Na época fomos conhecer o modelo. Da minha experiência, é uma falta de respeito e que se caracteriza um desleixo. Limita o acesso e tanto faz se estivemos naquele lugar ou não”, criticou Câmera.

Ela ainda sugeriu que deveria haver uma consulta prévia da quantidade representativa de cadeirantes, para que fossem instalados mais equipamentos desses em outros locais da capital baiana. “É tudo muito limitado. E a população aumenta. A do Iguatemi está quebrada. Não foi consertada ainda, na Lapa ainda está quebrada e no Shopping Paralela. O pessoal reclama muito comigo também da Rótula do Abacaxi”.

Luiza Câmera ainda pontuou sobre os elevadores quebrados: quando um equipamento desse estraga tem que fazer reparo de imediato. As pessoas que tem deficiência agora estão estudando, com direito a faculdade e estamos aí para isso, se reinventando. Queremos respeito e não caridade.

À Conder, a reportagem enviou os seguintes questionamentos:

Qual o custo destes elevadores?; Qual empresa foi responsável?; Quais critérios foram utilizados para a instalação dos elevadores e por que foram colocados nestas vias?; Há possibilidade de colocar outros em locais diferentes da cidade?; Por que após seis anos de instalados, os elevadores ainda estão sem funcionar?; Existe previsão para o início do funcionamento?; Nossa equipe constatou que alguns elevadores estão vandalizados com pichações, botões e iluminação quebrados. Existe alguma perspectiva de requalificação destes elevadores, se eles, de fato, voltarem a funcionar?

Algumas perguntas não foram respondidas. Confira a nota na íntegra:

1. No total, os projetos de acessibilidade nas passarelas construídas pela CONDER contemplam 08 elevadores nas 04 passarelas existentes ao longo do trajeto da Via Expressa Baía de Todos os Santos (investimento de R$ 4,9 milhões - data base julho de 2012);

2. Todos os equipamentos estão com a infraestrutura concluída e aptos para a operação, sob o ponto de vista técnico. O atraso registrado ocorreu pelo ineditismo da implantação de elevadores em passarelas, o que demandou um tempo a mais do que o previsto no desenvolvimento dos projetos, bem como no processo de fabricação e instalação;

3. Os elevadores passaram por vistoria da Semob - Secretaria Municipal de Mobilidade, realizada no dia 16 de outubro de 2017, após reiteradas solicitações da CONDER (ofício 59/2016) e do envio do ofício 74/2017 em anexo encaminhado pela casa Civil do Governo do Estado ao Secretário da Casa Civil do município de Salvador;

4. O parecer de conformidade à utilização dos elevadores pelos portadores de necessidades especiais foi comunicado à CONDER pela Semob, desde dezembro de 2017. Vale registrar que todas as informações solicitadas acerca da infraestrutura instalada, bem como o uso e operação dos mesmos foram fornecidas à Administração Municipal, desde o final de 2015.

Embora a Conder tenha transferido a responsabilidade dos elevadores para a Secretaria de Mobilidade de Salvador (Semob), o órgão informou, também através de nota ao BNews que não tem nenhuma responsabilidade, administrativa ou de fiscalização sobre os elevadores instalados na Via Expressa pela Companhia de Desenvolvimento Urbano (Conder). 

*A secção medular, citada no início da matéria, é uma ruptura da medula, que se for total provoca uma perda irreparável das funções nervosas abaixo do ponto da lesão. 

Os acidentes de viação, de trabalho, desportivos ou de qualquer outro tipo que provoquem uma lesão ou um movimento brusco da coluna vertebral podem originar traumatismos na medula espinal situada no canal raquidiano. 

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