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Condonectados: Os condomínios e as assembleias virtuais

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Bnews - Divulgação Arquivo pessoal

Publicado em 23/03/2021, às 08h00   Tiago Almeida Alves


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Quando o mundo parou com a pandemia, muito ao que se refere às comunicações também se transformou. O presencial foi substituído pelo virtual em tudo que se pôde. Congressos, simpósios, reuniões, assembleias e outros eventos foram readaptados – quando não cancelados – para caberem no formato de videoconferências no Brasil e mundo afora.

Para que dizeres como: “oi, vocês estão enxergando minha tela?” também se tornassem frequentes nas reuniões e assembleias de condomínio, o direito brasileiro passou por um caminho de incertezas.

Com o início dos decretos sanitários, uma das primeiras medidas tomadas pelas autoridades foi a proibição de reuniões presenciais e demais aglomerações. O calor das prestações de conta e das eleições de síndico cessou – e a resolução dos problemas também. Por certo tempo, deliberações importantes para a vida comunitária ficaram em suspenso, junto ao clima de incerteza do início de 2020.

Com a edição do Regime Jurídico Emergencial Transitório (RJET), houve uma luz. Tal legislação federal, que regulou as relações privadas no início da pandemia, permitiu expressamente que os condomínios realizassem assembleias virtuais. Aos poucos, as assembleias foram retomadas através das plataformas de videoconferência, e as deliberações coletivas puderam funcionar com plenitude.

Uma vantagem interessante aos condomínios foi a maior adesão do público às assembleias. Com a comodidade virtual, pessoas que antes mal se interessavam sobre as discussões da vida comunitária passaram a participar com frequência, voz e voto de tais reuniões, sendo algo bastante positivo à gestão. Até mesmo os condôminos de casas de veraneio ou de campo, por exemplo, tiveram oportunidade de opinar e votar com maior adesão.

É importante considerar, contudo, que as assembleias virtuais devem se portar à semelhança das práticas vistas nas assembleias condominiais presenciais. Embora seja um método mais prático, a assembleia virtual não pode impor que os condôminos ou seus representantes sejam obrigados a apresentar suas manifestações apenas de modo escrito – se assim não é no presencial, não pode ser no virtual. Do mesmo modo, impedir inscrições de última hora, proibir eventual retirada de dúvida de condômino em momento pertinente, ainda que em nome da ordem e da praticidade, podem gerar até mesmo nulidade do ato.

O RJET, por sua vez, teve seus efeitos limitados no tempo em razão do seu caráter transitório. De acordo com a lei, as indistintas assembleias virtuais de condomínio tinham vigência autorizada até 30 de outubro de 2020, quando a lei cessou os seus efeitos. Com isso, surge-se uma dúvida honesta: como se dá a permissão atual das assembleias virtuais nos condomínios?

Interpretando-se a lei brasileira, percebe-se claramente não haver proibição quanto a assembleias virtuais em condomínios. O que é necessário, entretanto, é que a convenção do respectivo condomínio permita e regule as assembleias em plataformas digitais. Na falta de previsão, as convenções podem ser alteradas nesse sentido através de assembleia convocada para esse fim, com quórum de 2/3 dos condôminos.

Desrespeitar a convenção, contudo, pode trazer graves consequências ao condomínio. Imagine-se, por exemplo, a eleição de um síndico através da plataforma digital em um condomínio cuja convenção não previa assembleias virtuais. Sua eleição e seus atos podem ser questionados judicialmente e até mesmo invalidados, causando transtornos à comunidade.

É de se levar em consideração, entretanto, a existência de propostas legislativas em discussão que facilitariam tal cenário. O Projeto de Lei nº 5.563/2020 mantém-se em discussão na Câmara dos Deputados, cujo objeto seria de tornar permanente as assembleias virtuais, com pequenos ajustes na lei federal. Enquanto o quadro não se modifica – isto é, se de fato houver modificação – vigorará o respeito às convenções.

Neste mês de março, que marca um ano desde quando o país parou, vê-se com assombro o aumento de mortes e casos no Brasil, o que levou às autoridades a intensificarem medidas proibitivas. De tal maneira, observa-se que as assembleias virtuais continuam a ser um relevante modo de deliberação da vida comunitária. 

Enquanto o país enfrentar esse quadro, muito mais seguras serão as deliberações virtuais – ainda que a tela trave ou que o som abafe. Que sejam seguras, portanto, não apenas sanitária, mas sobretudo juridicamente.

Tiago Almeida Alves é colunista do BNews, advogado formado pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS.

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