Direito de morrer

A vida é dom precioso. Todos merecem vivê-la intensamente e com plena dignidade. Mas a vida tem o seu ciclo natural, que se não interrompido em modo abrupto, há inevitavelmente de se extinguir um dia.

Todo ser vivo tem o direito de partir. Aos 85 anos, minha mãe caiu e fraturou o fêmur, foi operada e sofreu, por 25 dias, em leito de hospital, falência progressiva de órgãos. Aos poucos, foi-nos dizendo: estou partindo. Equipe médica, parentes e amigos fazemos tudo para que aquela vida permaneça vivida em dignidade, mas é necessária a lucidez para permitir, se chegada a hora, que a pessoa parta, por mais querida e importante que ela seja.

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DENÚNCIA

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Deixar partir também é um ato de amor. O moribundo merece um entorno de serenidade e respeito, para que, se assim o for, faça a sua passagem em paz. Tantas vezes o acanimento terapêutico atende mais às demandas de uma "medicina empresarial", indústria dos fármacos, carências de parentes/amigos, que às necessidades e desejos de quem sabe que a própria vida está se esvaindo, após longa jornada de existência.

Expressões como: "Quando você sair deste hospital...", "Quando você melhorar..." e "Fulano já está vindo de viagem para lhe ver..." geram falsas expectativas na pessoa que está morrendo e a fazem, para atender apelos externos, prolongar um vegetar entre dores e sofrimento.

Creio que, neste casos, a mais sábia seja a expressão popular: "seja feita a vontade de Deus" a ser ouvida por quem tem o direito de morrer em paz e com dignidade.

*Padre Alfredo Dorea escreve quinzenalmente para o BNews, e é arcebispo da Igreja Anglicana Tradicional do Brasil. Graduado em filosofia e teologia. Mestre pela Universidade Gregoriana de Roma. Atua no diálogo interreligioso, combate às violências, discriminações e preconceitos, defesa dos direitos humanos e das pessoas mais vulneráveis e empobrecidas, sobretudo as que vivem com o HIV AIDS.