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Fabíola Mansur: 'Gestão de ACM Neto está aquém do que ele imaginou'

Imagem Fabíola Mansur: 'Gestão de ACM Neto está aquém do que ele imaginou'
Vereadora do PSB é a entrevistada do Bocão News nesta sexta-feira  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 23/08/2013, às 00h00   Marivaldo Filho



A entrevista desta sexta-feira (23) do Bocão News é com a vereadora Fabíola Mansur (PSB). A socialista, em entrevista ao jornalista Marivaldo Filho, avaliou a possibilidade da senadora Lídice da Mata candidatar-se ao Governo do Estado, a chance de correr ao cargo de deputada estadual nas próximas eleições e o desempenho do prefeito ACM Neto nos primeiros sete meses de gestão.

Apesar de fazer parte da base governista nos âmbitos estadual e federal, Fabíola Mansur, que é médica oftalmologista há 26 anos, criticou o Programa Mais Médicos, do Governo Federal, e a ansiedade pela escolha do candidato da situação para suceder Jaques Wagner. O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), a Lei de Ordenamento Uso e Ocupação do Solo (Louos), o Movimento Passe Livre (MPL), e a atuação na Câmara Municipal de Salvador também foram pontos marcantes da entrevista.

A Câmara Municipal de Salvador aprovou no dia 10 de julho o projeto para a regulamentação das rádios-postes no município. Qual a importância da criação de uma legislação específica para rádios de linha modulada em Salvador?

A regulamentação das rádios-postes não passa pelo Governo Federal. Essas rádios, na verdade, existem há mais de 90 anos. Elas são, na periferia, quem democratiza a informação. As pessoas que estão nos pontos de ônibus, nos pequenos centros comerciais, através dessas rádios comunitárias, ficam sabendo, por exemplo, de grandes campanhas de combate à dengue, informações sobre educação, segurança pública e sobre o que acontece no bairro. A importância é gigantesca. Outras cidades já tinham regulamentado e, na medida em que você regulamenta, é dada uma maior sustentabilidade a estas rádios, que antes estavam na clandestinidade. Antes dependiam apenas da paixão dos radialistas, grandes democratizadores da informação nos bairros. A regulamentação tem que ser sancionada pelo prefeito ACM Neto e vai facilitar  para que essas rádios possam receber, também, mídia oficial dos governos estadual e municipal.

Recentemente, o Governo Federal criou o Programa Mais Médicos que, através de medida provisória, que, entre outras medidas, prevê a polêmica importação de médicos. Como a senhora vê essa proposta, enquanto médica e, ao mesmo tempo, integrante do PSB, partido da base do governo Dilma Rousseff?


Antes de tudo, preciso que se diga que saúde não se faz só com médicos e a medida provisória da presidente Dilma, no meu entender, foi precipitada porque não teve o debate suficiente. Imagino que uma medida provisória deve acontecer como um assunto de urgência. Não foi debatido com as universidades nem com as entidades médicas. A gente entende que faltam médicos por má distribuição no interior e por ausência de uma carreira nacional para os médicos, como também para dentistas, enfermeiros e profissionais de saúde, em geral. Saúde se faz com uma equipe multidisciplinar. Outro ponto importante é que é preciso infraestrutura. Muitas vezes,não tem um médico naquele lugar, um interior, porque não tem a estrutura mínima. Faltam postos de saúde e emergências. O Programa Mais Médicos, veio sob forma de medida provisória, sem ser debatida da sociedade. Ele tem médicos estrangeiros sem o revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos expedidos por instituição de Educação Superior Estrangeira).Não somos contra a vinda de médicos estrangeiros, mas contra a vinda sem o revalida. O Programa Mais Médicos não resolve os problemas da infraestrutura e do subfinanciamento do SUS. Precisamos fazer com o atendimento do SUS seja pelo menos próximo do que foi idealizado na Constituição. Essa diferença passa por um maior financiamento e eu fico feliz por ter sido aprovado 50% dos royalties para a saúde. Passa, também, por uma melhor estrutura e por gestão de pessoas. Por tudo isso, os médicos se uniram. Sou uma vereadora da base, mas isso não quer dizer que eu não tenha uma opinião formada. Espero que a presidenta Dilma e o ministro Padilha sejam sensíveis aos clamores da população e revejam esta situação.


Na semana passada, o secretário estadual de Turismo, Domingos Leonelli, que é do mesmo partido que a senhora, afirmou que da forma com que o Partido dos Trabalhadores está conduzindo a sucessão de Wagner, com apenas três nomes, está “instigando” os outros partidos da base a lançarem candidaturas próprias em 2014. Citou, como exemplos, o PDT, com Marcelo Nilo, e o PSB, com Lídice. A senhora concorda que o PT está, de alguma forma, incentivando os partidos da bancada a lançarem candidaturas isoladas?

Bem... primeiro, eu lhe perguntaria: que partido da base não sonharia em ter o candidato encabeçando a chapa majoritária? Nesse sentido, o PSB também compartilha esse sonho.  Que partido, além de ter esse sonho, tem um quadro como a senadora Lídice da Mata, com toda a sua história política, não gostaria de encabeçar essa chapa? Mas existe uma diferença entre o que a gente quer e a gente antecipar uma discussão, quando a gente faz parte do Governo Wagner, que precisa viabilizar as candidaturas. Antes de tudo, precisamos viabilizar a gestão. Precisamos pensar no desenvolvimento da Bahia. Portanto, antecipar essa discussão me parece precoce e gera o que eu chamo de “eleitorização” da base, gerando uma ansiedade desnecessária. O que eu entendo é que é bom que o governador tenha em partidos aliados pré-candidatos do quilate da senadora Lídice da Mata e que possa, com calma, escolher quem será o ‘cabeça’. O que não podemos é simplesmente abrir mão de a senadora Lídice ser essa opção. Como os candidatos do PT, Rui Costa, Gabrielli e Pinheiro, a senadora Lídice se coloca com uma excelente alternativa para suceder o governador. O ideal é que cheguemos a um consenso para que a base parta unida. Se eu dissesse que não desejo que a senadora Lídice encabeçasse a chapa, estaria mentindo. Mas, é lógico que eu sei que a gente não tem o que a gente sonha. Temos o que é possível articular.


Ainda falando sobre as eleições de 2014, a senhora se elegeu para o seu primeiro mandato de vereadora em 2012. Quais são seus planos políticos para o ano que vem? Já pensa em alçar novos voos?

Olha... eu também não sou ansiosa, Marivaldo. Meu plano para 2014 é de fazer uma boa vereança em 2013. Em respeito a minha cidade, quero continuar a fazer um bom mandato. Fui candidata à deputada estadual em 2010, pela primeira vez, como você sabe. Fui muito bem votada, também, pelo meu histórico como médica oftalmologista, em defesa do SUS. Faço há 15 anos campanhas em prol do SUS sem nenhuma aspiração política. Se eu te dissesse que não penso ser deputada estadual, não estaria falando a verdade. Mas para ser deputada estadual, primeiro eu preciso ser uma boa vereadora.  Um passo de cada vez. Vamos espera um pouquinho para decidir.


O Movimento Passe Livre ocupou a Câmara Municipal de Salvador por mais de um mês e saiu da Casa Legislativa sem conseguir o desejado encontro com o prefeito ACM Neto, que alegou não dialogar com militantes políticos. Como a senhora vê essa falta de comunicação entre o gestor do município e o MPL?

Eu acho lamentável. O Movimento Passe Livre, lógico, é político, como todos os movimentos em busca de direitos. O MPL tem, em seu quadro, pessoas que fazem políticas filiadas a partidos políticos e tem, também, pessoas da sociedade civil que não são filiadas. É lamentável que ele não possa dialogar com militantes políticos de esquerda, porque, se é assim, ele também não pode dialogar com os vereadores de oposição. É importante que se diga que a oposição vem tentando articular junto ao prefeito ACM Neto para que eles ainda possam ser recebidos, que sua pauta de reivindicações possa ser realizada. Nós temos que dizer que a Casa fez uma audiência pública, recebeu as 21 reivindicações, que depois virou sete. A Mesa Diretora fez uma carta ao prefeito ACM Neto e ao governador Jaques Wagner fazendo essa interlocução equilibrada. Infelizmente, o prefeito ACM Neto não recebeu. Lamento profundamente e quero elogiar a postura democrática do governador Wagner, que recebeu o movimento. Entendemos que, no primeiro momento, era difícil recebe-los porque não existia uma comissão. Mas depois essa comissão foi formada e nem todos filiados a partidos. Limitar o Movimento dizendo que ele é político e desordeiro é não entender de política e é um retrocesso de Neto. O diálogo e a negociação são as bases de todos os avanços. As pautas do MPL melhoram a vida de todos os cidadãos.


O Tribunal de Justiça da Bahia decidiu anular os efeitos do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) e da Lei de Ordenamento, Uso e Ocupação do Solo (Louos). A Prefeitura de Salvador viu a medida com preocupação e alegou que prejudicará o crescimento da cidade e a consequente geração de emprego e renda. A senhora acredita que a decisão do TJ-BA representa e atende os anseios da população?

Eu não estava na legislatura passada, quando foram aprovados os dois projetos. Mas a minha preocupação é que o PDDU e a Louos são a espinha dorsal do planejamento de uma cidade. Para elas serem aprovadas, teriam que ter um amplo debate em audiências públicas com os vereadores e a população. Todos teriam que ter conhecimento das emendas que foram incorporadas. Se o formato das aprovações do PDDU e da Louos foi diferente disso, nós temos que fazer com que o PDDU e a Louos voltem para a análise devida e profunda da Câmara, a gente possa acelerar as votações, pedir que o TJ-BA acelere a análise do mérito para que a cidade possa andar. A insegurança jurídica existe para os dois lados: para o empresário que quer investir e também para o cidadão. Se há um desconhecimento da matéria, é preciso que a gente retome esse assunto de forma célere, mas de forma responsável. Eu defendo o desenvolvimento econômico da minha cidade com a preservação do meio ambiente, mas com desenvolvimento social, que possa promover uma Salvador sustentável.


Na Câmara Municipal, foi aprovada uma isenção de 5% do ISS às incorporadoras na votação da reforma tributária. A senhora acredita que Salvador, uma cidade que sofre tanto com os problemas de arrecadação, pode se dar ao luxo de fazer essa concessão para empresas que já lucram tanto ou acredita que é uma forma de incentivar nos investimentos e, consequentemente, geração de emprego e renda no município?

Veja só. Sabemos que Salvador não arrecada suficientemente para promover seu desenvolvimento socioeconômico.  Essa não arrecadação, que já vem da gestão anterior, em que bilhões de reais deixaram de ser arrecadados e milhões de pessoas sonegaram impostos sem que a Secretaria da Fazenda pudesse ter controle. A rigor, não é uma isenção, porque esse imposto não é cobrado. Essa cobrança do ISS às incorporações, na medida em que é inconstitucional, geraria uma insegurança jurídica. Isso, necessariamente, não seria uma ampliação da arrecadação. Procurei seguir o relatório do vereador Waldir Pires (PT), que elencou todos os pontos que eram inconstitucionais no projeto que ACM Neto enviou. Fiz um voto absolutamente técnico. Fui contra a criação das duas empresas de economia mista. Eu preferiria que os impostos a serem arrecadados fossem feitos pela Secretaria da Fazenda para que a pasta pudesse melhorar a sua gestão e não tivéssemos que dividir com a iniciativa privada.  Sou contra cobrança de novos impostos. Devemos melhorar a arrecadação dos impostos que já existem, combater a sonegação, gastar com o que a população mais precisa e, principalmente, lutar contra a corrupção, que todos nós sabemos que existe.

Nesse mesmo dia, foi aprovado um empréstimo de R$ 100 milhões para a Prefeitura para recapeamento asfáltico. Os vereadores da oposição alegaram que aprovar esse projeto sem saber como e onde seriam empregados esses recursos era o mesmo que dar um “cheque em branco” ao prefeito ACM Neto. No entanto, o empréstimo foi aprovado com os votos dos vereadores da oposição. A senhora considera que foi dado um “cheque em branco” ao gestor do município?

Todos nós da oposição, inclusive eu, pontuamos que esse programa de pavimentação do município de Salvador deveria ser mandado antecipadamente à Câmara para que nós soubéssemos quais seriam as áreas que seriam contempladas por esse programa. Infelizmente, mais uma vez, não tivemos essa antecipação.  Chegamos a pedir que tivesse um programa bem planejado e que o critério utilizado fosse o de contemplar as maiores avenidas, as mais estragadas, e que não houvesse favorecimento político. Mas aprovei porque sabemos a situação em que Salvador está, cheia de buracos. A gente não poderia se furtar de um empréstimo que poderá beneficiar milhares de soteropolitanos. Isso é fazer uma oposição propositiva ainda que nós não tenhamos tido com antecedência uma lista de como seria esse programa e que a gente tenha achado que essa votação também tenha sido açodada.


Nesses sete primeiros meses de gestão gostaria que a senhora fizesse uma avaliação dos pontos positivos e negativos da administração de ACM Neto e qual nota a senhora daria para o prefeito ACM Neto até agora?

Não podemos desconsiderar a cidade que ele encontrou. O subfinanciamento de várias áreas, a cidade totalmente desestruturada, e esperar que alguém, em sete meses e sem dinheiro, faça um milagre. O prefeito apresentou vários decretos, anunciou prazos para cumpri-los. Não se pode fazer um choque de gestão sem dialogar com as forças que interagem com a cidade, incluindo as demandas do MPL. Após sete meses, acredito que o desempenho do prefeito ACM Neto esteja aquém do que ele próprio esperava quando anunciou os decretos. Eu não darei nota, mas a avaliação de ACM Neto é ainda menor porque ele não dialoga com o MPL. Não deu uma demonstração de nobreza política para receber o movimento. Desejo que a cidade progrida e evolua. Minha expectativa é que ele amplie o diálogo com os movimentos sociais e que ele tenha a independência para gerir a cidade de forma a contemplar quem mais precisa em Salvador.


Qual é a parcela de culpa do Governo do Estado para Salvador está nesta situação?

Muitas coisas que o Governador Jaques Wagner fez precisam ser ditas. Salvador não tem hospital municipal, mas o Hospital do Subúrbio, construído pelo Governo do Estado, hoje, talvez, é o que mais atende urgências e emergências. Fora o grande lastro de obras. Se não houve um investimento que a cidade percebeu, com certeza está percebendo agora. Bases comunitárias para melhorar a segurança pública, UPAS, enfim. Muito foi investido em Salvador. Agora não cabe ao gestor estadual. Cabe ao gestor municipal com a colaboração do gestor estadual. O governador Wagner tenta governar para toda a Bahia. A gente considera que essa parceria entre o Governo do Estado e a Prefeitura de Salvador possa ter planejamento de onde gastar e de como gastar. Eu fico muito feliz por estar acontecendo esse diálogo. Acredito que a boa articulação faz com que as coisas evoluam. Não adianta não flexibilizar e não dialogar.

Para finalizar, gostaria que a senhora fizesse uma autoavaliação do seu mandato na Câmara Municipal de Salvador.

Como falamos anteriormente, foram fundamentais a aprovação na Câmara Municipal de Salvador do projeto para a regulamentação das rádios-postes em Salvador, as diversas audiências públicas para debater o direito das pessoas com deficiência, as visitas à Estação da Lapa, onde denunciamos descasos. Tivemos também, como causa prioritária, o Centro de Referência LGBT (Lésbicas, Gays Bissexuais e Transexuais) e isso é muito importante porque foi uma parceria com a secretária municipal da Reparação, Ivete Sacramento, para viabilizar um orçamento para essas questões primordiais. Propus um projeto de emenda à LOM, que amplia o voto aberto para vetos e cassações de mandato na Câmara. Fiz um mandato focado na defesa dos direitos humanos. Vários projetos nas áreas da saúde, deficiência, LGBT, e na área das mulheres. Marco com meu discurso a defesa das minorias e de determinadas bandeiras que ninguém quer defender. Meu mandato é propositivo, com atitude e não tem medo de errar e de se posicionar. O cidadão quer seriedade, trabalho e transparência. Aos 51 anos, não poderia me propor a nada que não fosse continuar com os mesmos compromissos éticos, com valores,  transparência, moral e atitude. Tive muitas frustrações. Não é fácil, num processo democrático, ser vereadora de oposição. A minoria não vence, mas é parte da democracia e a gente tem muito a aprender e crescer com esse processo democrático. Espero poder ser bem sucedida nessa tarefa de transformar a vida das pessoas através da política. 

Classificação Indicativa: Livre

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