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Rilza Valentim, prefeita de São Francisco do Conde

Imagem Rilza Valentim, prefeita de São Francisco do Conde
Para gestora, na falta do que falar a oposição vive de “denuncismo”  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 05/08/2011, às 00h00   Luiz Fernando Lima



A prefeita de São Francisco do Conde, Rilza Valentim (PT), está no olho do furacão da política baiana. Na última semana o Tribunal de Contas do Município (TCM) resolveu fazer uma auditoria na cidade para apurar diversas denúncias que chegaram aos conselheiros. Em conversa com a reportagem do Bocão News a gestora, que foi professora de Química, se defende das acusações e afirma que está mudando a história de São Francisco do Conde. Confira.

O TCM autorizou uma auditoria em São Francisco do Conde, que segundo o presidente do tribunal, Paulo Maracajá, foi motivada por uma série de denúncias, principalmente, sobre obras irregulares e inchaço da máquina pública. Em entrevista recente ao Bocão News, a senhora afirmou que muitas dessas denúncias são oriundas da oposição, que começa a se mobilizar no intuito de fragilizá-la para eleição de 2012. Há alguma possibilidade de serem detectadas irregularidades nas contas e nos procedimentos da prefeitura?

Rilza Valentim – A gente tem dito no município que o papel do tribunal é acompanhar, é fiscalizar e acreditamos que uma auditoria termina sendo um instrumento para que se verifiquem eventuais equívocos. Até porque se existirem coisas erradas e a gente detectar quem está fazendo é claro que vamos entrar com as ações pertinentes. Já o papel da oposição é tentar fazer denúncias. São Francisco do Conde passou muito tempo sem que muita coisa acontecesse, sendo uma cidade muito mal vista. Hoje, eu sei que é muito difícil as pessoas acreditarem que todas as ações estão acontecendo aqui, que a quantidade de obras que estão sendo realizadas é verdadeira. Então, é importante que uma instituição, com a credibilidade do TCM, possa estar aqui para verificar “in loco” tudo o que está acontecendo. A auditoria vai ser direcionada para obra e para pessoal. Eu não acredito que nós possamos ter alguma irregularidade, mas acredito que possamos ter algumas falhas e se estas forem detectadas é claro que vamos dar as soluções

Um dos pontos citados nas denúncias é quantidade de pessoal na administração pública, em cargos de confiança, algo em torno de 31% dos cidadãos da cidade em idade trabalhistas. Isto é normal?

Quando a gente assumiu São Francisco do Conde a folha da prefeitura tinha 11 mil pessoas. Atualmente, nós temos sete mil. Pode até ser considerada uma quantidade grande se nós não colocarmos estas pessoas para dar conta de serviços. No entanto, hoje a cidade tem vários projetos funcionando. A ideia da gente é tentar recuperar nestes quatro os 20 anos que a cidade ficou sem ter produtividade e para isso a gente precisa acelerar o crescimento. Nós estamos dentro dos limites que a lei permite para a folha de pagamento, que nós temos respeitado, e nós estamos tentando dar ocupação ao povo do município. Nós temos, por exemplo, o Programa de Acolhimento Social de Complementação de Renda (PAS), através do qual buscamos contratar todas as assistentes sociais formadas que são da cidade. Os professores, os enfermeiros, para todos os cargos de nível superior nós fizemos contratação através do Regime Especial de Direito Administrativo (Reda), para que estas pessoas pudessem trabalhar. Nós temos atualmente 15 unidades do Programa Saúde da Família (PSF), temos um hospital que tem todas as especialidades e que funciona 24horas. Nós temos vários projetos aonde aproveitamos a mão de obra daqui.

E os cargos comissionados. Há, de fato, um excedente?

Nós fizemos uma auditoria já. Não é que exista um excedente. Na verdade, para alguns cargos, termina mais pessoas ocupando do que tem previsto na atual Lei Administrativa do município. Para conter isso nós estamos adotando as medidas cabíveis

Como assim prefeita?

Por exemplo, eu tenho 200 cargos de gerente dentro da prefeitura. Às vezes, durante a gestão, percebo que preciso de mais uma pessoa para gerenciar determinada área e isto não estava previsto. Tanto é que nós estamos fazendo um estudo para reformular a nossa Lei Administrativa. Porque a gente vai aprendendo fazendo. Nós criamos um organograma para uma secretaria específica e no decorrer dos trabalhos descobrimos que alguns setores precisam de mais atenção ou que não estão funcionando como deveriam e ai precisamos colocar pessoas para trabalhar.

Outras denúncias se referem ao valor do contrato para o consumo de combustível dos veículos da prefeitura. Tem procedência este levantamento?

Não entendi até agora de onde veio isso. Foi feita uma licitação normal e o consumo é normal, não existindo problema nenhum. O que existiu foi um “denuncismo”(sic).

As três últimas contas da prefeitura, antes da sua gestão, foram reprovadas pelo Tribunal de Contas. No seu primeiro ano de governo as contas foram aprovadas com ressalvas, no entanto, as denúncias não pararam. Ao que a senhora atribui isto?

São Francisco do Conde é uma cidade que desperta muitos interesses. É uma cidade que tem uma arrecadação alta e que muita gente gostaria de estar dirigindo. Pela primeira vez na história o município está com uma prefeita mulher, negra, dando conta da cidade. E as pessoas não vão ficar de braços cruzados esperando que a prefeita se perpetue lá. Então, existem as ações dessas pessoas querendo descobrir algo ou inventar algo para tentar tirar a credibilidade da gestão. Por isso que eu tenho dito às pessoas que a melhor forma de perceber a maneira que estamos administrando a cidade é indo a São Francisco do Conde.  Para algumas pessoas é muito difícil acreditar que estamos transformando a história da cidade.

Gostaria que a senhora falasse um pouco sobre o PAS, que é um programa de transferência de renda municipal. Algumas das criticas mais agudas à sua gestão está relacionada a este programa, sob o argumento de que seria uma política de “dar o peixe” e angariar votos. O que a senhora acha desta avaliação?

Primeiro, quero deixar claro que o PAS é um programa de acolhimento social. Ele é um programa, então, ele garante uma porta de entrada, um preparo para estas pessoas que entram e uma porta de saída, para que elas possam dar conta das vidas delas. Porque é muito fácil falar que precisa-se ensinar a pescar, é lógico que precisamos ensinar a pescar, mas não se pode ignorar o fato de que para ensinar leva um tempo. Eu me pergunto se durante este tempo as pessoas precisam morrer de fome?  Sou da opinião que não e a ideia do PAS é exatamente evitar que isso ocorra.

Como funciona o programa?

As famílias que têm uma arrecadação per capita inferior a meio salário mínimo (R$ 272.5) recebem até 80% de um salário. Este “até” é em função de uma série de fatores, como a quantidade de dependentes e de quão inferior é esta renda. Estas famílias que estão no PAS, os pais e as mães que não são alfabetizados entram em uma política de alfabetização do município e do programa Todos pela alfabetização (Topa), que a gente aproveita. Estes familiares e, principalmente, aos filhos destas famílias nós entramos com algumas políticas de capacitação profissional e assim que a gente tem alguma oportunidade de emprego dentro dessas grandes obras tentamos inserir estas pessoas no mercado de trabalho. Assim fechamos o ciclo com a porta de saída do PAS. Então, garantimos a sobrevivência destas pessoas enquanto ensinamos a pescar. É muito fácil para quem nunca passou fome alimentar apenas discursos.

Prefeita como andam os projetos de capacitação dos jovens e de educação na cidade?

Antes de estar prefeita eu fui secretária de educação. Naquela época nós instalamos um dos primeiros, se não o primeiro, curso pré-vestibular gratuito do estado. Tanto é que o formato do programa pré-vestibular do estado foi estudado a partir do modelo que tínhamos aqui. Na época, a secretária estadual Anaci Paim, que era reitora da Uefs, isto em 2001, esteve aqui para discutir o assunto. Em função deste projeto, São Francisco do Conde tem atualmente cerca de mil pessoas fazendo curso superior fora. Nós colocamos diariamente 18 ônibus divididos nos três turnos para levar e trazer os estudantes de nível superior. Hoje, nós temos dentro da cidade uma equipe de profissionais formados que podem estar ocupando a grande maioria das funções. É claro que em alguns casos nós precisamos contratar técnicos específicos. Até porque São Francisco do Conde é uma cidade complexa. Eu diria que das contratações da cidade, 92% são pessoas do próprio município.

A área de petróleo e gás é um dos pontos altos de São Francisco, este segmento emprega muita gente da cidade?

Para entrar nestas empresas, refinarias, por exemplo, são feitos concursos públicos então a quantidade de mão de obra maior neste caso é direcionada para as terceirizadas, na parte de manutenção, caldeiraria, solda, ampliação, pedreiro. Porque a outra mão de obra termina tendo menos controle no sentido de emprego local, pois depende de concurso. A própria Petrobras quando abre um concurso, geralmente, são oportunidades a nível federal.  Mas a cidade é industrial. Nós passamos muito tempo ouvindo destas empresas, que mesmo para os trabalhos a que me referi, não havia em São Francisco mão de obra especializada. Hoje, nós temos o cuidado de investir em qualificação para buscar este espaço. Mas é um mercado competitivo. O fato de a gente capacitar os nossos jovens não significa que as empresas necessariamente só vão contratar mão de obra local. Nós, às vezes, entramos em polêmicas com empresas instaladas aqui para tentar garantir a empregabilidade das pessoas da cidade. Nem sempre a gente vence, mas avançamos. Tanto é que para diversos acordos que estamos firmando com empresas que querem se instalar em São Francisco a condição número 1 é que se contrate a mão de obra daqui e se esta mão de obra tiver que ser especializada, nós entramos na parceria para ajudar na formação. Levantamos estrutura, sala de aula e pedimos que tragam o instrutor.

O aporte da prefeitura no São João da cidade provocou grande polêmica. Quanto foi gasto total?

Antes do São João começou esta polêmica. Então, nós contratamos uma empresa para pesquisar o evento. Para que nós tivéssemos um parecer concreto se é gasto ou investimento. Claro, que chegamos à conclusão de que foi investimento. Até porque, a sede da cidade recebeu diariamente cerca de 80 mil pessoas. Agora, imagina dentro de uma sede em que moram em torno de 18 mil pessoas circular esta quantidade de gente. Chegou um momento em que tudo que se colocou para vender foi vendido. A maioria das pessoas juntou a família numa casa e alugou a outra, os aluguéis em torno de R$ 2 mil. Quem tinha sua cerveja, sua alimentação, tudo que funcionou muito bem. Nós temos dados de pesquisas que afirmam isto. Então, foi sim um grande investimento, em termos de recurso. Diria também que para o município foi muito importante, porque mostrou São Francisco em termos de cidade. Muita gente foi até lá e viu uma cidade vivendo outra realidade. Tem outra coisa que é importante nisto tudo. O povo não quer só comida, o povo quer comida, quer diversão e quer arte. Eu preciso cuidar das pessoas da minha cidade de uma forma inteira. Eu preciso gerar emprego, melhorar a educação, melhorar a saúde, mas o povo também precisa de lazer.

Há um tempo houve um estremecimento na Câmara Municipal da cidade. Agora, apenas um vereador se declara de oposição ao seu governo. A senhora é do PT e é muito próxima ao chefe da Casa Civil de Salvador, João Leão (PP), como está esta conjugação de força e como a senhora avalia a sua situação política?

Eu sou uma prefeita do PT, acredito na ideologia do meu partido, e estou para defender o meu partido. Agora, eu também acredito em pessoas, respeito pessoas. Eu acredito que a gente não é só política, que a gente não é só partido. Então, penso que se você é meu amigo, você pode ir para onde quiser que continuará a ser meu amigo. Penso que nesta vida a gente tem é que se feliz, mas que temos que ter o cuidado para não atrapalhar a felicidade dos outros na busca da nossa.

E a Câmara?

Os vereadores viveram o momento deles. Se existe a possibilidade de uma disputa para ocupar determinado cargo é natural que as discussões aconteçam. Agora, é preciso ter o cuidado para que durante a disputa não se perca o respeito, porque a disputa passa e o trabalho continua. A Câmara viveu o momento em que se disputava a presidência do Legislativo o que é normal. Só que acabou gerando uma crise muito grande e ficou aquela indefinição: duas eleições e dois presidentes. Eu como prefeita, mesmo não cabendo ao Executivo interferir nos processos do outro poder, chamei os vereadores, os nove, e disse que este tipo de disputa acaba trazendo prejuízos ao município. Traz mídia negativa. Disse que estava trabalhando, nos últimos dois anos e meio, para tirar esta mídia negativa histórica. Outro dia li uma reportagem que dizia que São Francisco tem a maior arrecadação per capita do país e que tem um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) ruim. Me perguntei se o IDH divulgado em 2009 se referia a qual ano.

A senhora acredita que este quadro vai mudar quando uma nova pesquisa for feita?

Eu não tenho a menor dúvida disso. Quando investimentos em educação, informação e qualidade de vida são feitos com certeza o IDH tem que aumentar. Habitação. Imagine pensar em uma família com várias crianças morando em uma casa de taipa numa cidade que tem a arrecadação de São Francisco do Conde.

Como é que pode uma cidade como esta ter pessoas vivendo em situação de extrema pobreza?

Em pouco mais de dois anos de gestão posso afirmar que nós temos um programa de bolsa aluguel, com a qual tirei um monte de pessoas que estava morando em situação de risco. A gente já entregou 350 novas moradias e a gente conclui em breve outras 300, sem contar outras 320. Isto entre construções nossas e do programa Minha Casa, Minha Vida. Mas a gente não tem como resolver os problemas de 20 anos com um estalar de dedos. É preciso ter um orçamento, porque pegamos um município cheio de prioridades.

Quais são as prioridades de São Francisco do Conde?

A primeira prioridade de um município rico é não deixar o povo passar fome. Esta é a primeira prioridade. Depois disso, temos que melhorar a qualidade da educação, porque ai se constrói a possibilidade das pessoas mudarem as suas vidas com suas próprias pernas. Quando eu assumi a cidade, constava lá no Ministério da Educação como município prioritário. Isto significa que na área de educação estávamos abaixo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), estava em uma situação que precisava de cuidado especial. Nós, atualmente, temos livros e fardamento completo para todos os estudantes do ensino infantil.

Por falar em educação, e as questões das borrachinhas. Não foi na sua gestão, mas a senhora era secretária à época. O que aconteceu de fato naquele episódio?

Quando eu assumi a secretária de Educação, nós não tínhamos o processo de licitação dentro da estrutura da pasta. Era somente uma comissão de licitação dentro da secretária de Administração e Fazenda. Ainda em 2001 foi feita uma tomada de preço para comprar material de escritório. Quando chegou no início de 2002 foi feito um termo aditivo para que a secretária de Educação pudesse comprar material didático através desta mesma tomada de preço. Esta tomada de preço, que não foi feita pela minha pasta, tinha o item elástico de dinheiro (borrachinha). Este processo funciona da seguinte forma: levantam-se todos os itens que se quer comprar, a quantidade de cada item e ai se pública e as empresas acham que estão aptas a fornecer os materiais apresentam os documentos preenchidos com os valores unitários e valor total. Esta tomada de preço para dois anos foi de cerca de R$ 600 mil. Neste documento, tinha o item 5 toneladas de elástico para dinheiro, que dava R$ 25 mil. Neste momento, vale a ressalva que nós não gerenciávamos a tomada de preço, um dos itens que nós pedimos foi o Etil Vinil Acetato (E.V.A), que é um emborrachado para fazer artesanato, e pedimos também papel metro branco, estes materiais foram entregues na secretaria de Educação. Quando o fornecedor apresentou a nota fiscal para a nossa secretaria tinha lá 3 mil quilos de elástico. Eu questionei o item, mas ouvi como explicação do fornecer que os itens (E.V.A e papel metro) não constavam na tomada de preço, e por não estar lá não poderia estar também na nota fiscal. O que ele me disse foi que pegou o valor referente aos elásticos e colocou o material que nós havíamos solicitado. Na oportunidade, pedi que um documento fosse feito para registrar isso. Eles me fizeram uma errata explicando a situação. Quando a Controladoria Geral da União (CGU) chegou ao município e que pegou as notas fiscais foi nas escolas perguntar aos diretores se haviam recebido as “borrachinhas”, e eles prontamente disseram que não. Quando a CGU perguntou a mim, secretária, eu mostrei os documento. Mas ai o sensacionalismo já estava feito.


Fotos: Gilberto Júnior // Bocão News

Classificação Indicativa: Livre

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