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Uma caixa de ferramentas para o condomínio

Imagem Uma caixa de ferramentas para o condomínio
Bnews - Divulgação

Publicado em 09/02/2021, às 17h41   Tiago Almeida Alves


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Como você prenderia um prego na parede para pendurar um quadro?

Afixar um quadro em uma parede não é das tarefas mais difíceis. Mede-se a área. Prepara-se os pregos. Golpeia-se com força. E lá está. A tarefa cotidiana torna-se um transtorno, entretanto, quando a única ferramenta que se tem nas mãos é uma chave de fenda. Já imaginou? 

A analogia se aplica bem no direito, ainda mais se pensarmos em condomínios. Explico: a convivência em comunidade é um grande desafio dos nossos tempos. E junto a todos os benefícios de morar em um condomínio também aparecem suas dificuldades: inadimplência, arranhões nos carros, barulhos, pets, reformas... isso sem falar nas discussões em assembleias.

Sem piscar, vem à mente do morador a primeira alternativa de resolver os problemas: o processo judicial. Como principal ferramenta utilizada no Brasil, o processo jurídico figura, às vezes, como a única solução cabível para solucionar uma controvérsia. Se um síndico recusa de todo jeito a prestar contas de sua atuação, por exemplo, a solução se dá pela ação judicial de prestação de contas.

Como toda ferramenta, o processo judicial tem sua utilidade, mas não serve para resolver todos os problemas de um condomínio. Seria como utilizar uma chave de fenda para consertar todos os defeitos de uma casa – inclusive afixar um quadro em uma parede –, tendo uma caixa com outras ferramentas à disposição. Pode-se até martelar a cabeça do prego com o cabo da ferramenta, mas dá um trabalho...

E é aqui onde se encaixam os métodos alternativos de solução de conflitos – ou MASC. Já é entendido no mundo jurídico que, para cada controvérsia, existe uma ferramenta adequada, de modo mais efetivo, mais rápido e – sem dúvidas – mais barato.

Imagine-se uma disputa de um grupo de moradores que se opõe aos interesses da gestão, embargando toda assembleia possível para que os pontos de pauta não sejam apreciados, até que o muro da fachada seja pintado de laranja. Um processo judicial – ou um conjunto deles, como costuma acontecer – só inflamaria ainda mais as relações, sem contar o custo financeiro envolvendo custas judicias e honorários advocatícios, além das batalhas anos a fio na justiça, com recursos e mais recursos.

Ao invés disso, a ferramenta da mediação buscaria resolver o problema central: a falta de diálogo entre os grupos. Através de profissionais especializados, a mediação busca reestabelecer o diálogo entre as partes, ao ponto de estabelecer um espaço saudável de discussões. Evita-se, assim, ações em massa – e as custas, os honorários, os anos na justiça e os recursos.

De modo semelhante, imagine-se um condomínio que convive com considerável inadimplência – a grande vilã dos síndicos. É possível – e, às vezes, necessário – ingressar na justiça para cobrar o atraso. Talvez, entretanto, não seja a primeira alternativa a se pensar. Pensando-se na efetividade, no custo e no tempo, há uma ferramenta a se pensar: a negociação. Através de concessões mútuas – seja conduzida pela equipe do condomínio ou por profissionais especializados –, a negociação pode viabilizar o pagamento por parte do devedor e permitir um maior fluxo de caixa nas contas do condomínio. Um alívio financeiro necessário em tempos difíceis na economia.

Seja através da mediação, ou pela via da negociação – duas de várias ferramentas da caixa do direito, que ainda incluem a via administrativa, a conciliação, a arbitragem e outras –, percebe-se ser possível o aumento da eficácia na resolução do problema, onde se busca resolver o problema em si ao invés de investigar quem detém razão ou não, pela boca do juiz.

E nada impedirá, caso haja frustração das alternativas, que se utilize da fórmula do processo judicial posteriormente. 
Há um interessante ditado chinês em que se diz: “Ao morrer, evite o inferno. Em vida, evite os tribunais”.  Exagero. Não se pode imaginar uma vida na comunidade moderna sem o Poder Judiciário. De outro lado, o ditado faz refletir que o processo judicial não é a única forma de resolver problemas de forma civilizada. E nem resolverá tudo de modo efetivo.

Ainda bem que o direito é uma caixa recheada de outras ferramentas.

Tiago Almeida Alves é colunista do BNews, advogado formado pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS.

Classificação Indicativa: Livre

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