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Sem registro não dá: As consequências jurídicas aos condomínios irregulares

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Bnews - Divulgação Arquivo pessoal

Publicado em 28/09/2021, às 08h00   Tiago Alves*



A comunidade é um elemento essencial buscado por diversas pessoas nos critérios de escolha de suas moradias. Residir em um ambiente comunitário, onde os vizinhos dividem despesas, compartilham determinados espaços, entendem ter direitos e limitações, costuma trazer maior segurança, economia e lazer. Tal estrutura, por si só, faz muitas pessoas pensarem que estão morando em um condomínio.

Nem sempre essa impressão é verdadeira.

De acordo com o direito condominial, o fato de haver repartição de despesas em uma comunidade de imóveis, além de uma placa a indicar: “CONDOMÍNIO”, não é suficiente para se entender que legalmente existe a estrutura de condomínio protegido por lei.

Nesse sentido, percebe-se que são necessários alguns requisitos para o condomínio operar de maneira plena. Longe desses requisitos, o morador estará diante de um condomínio irregular, com consequências a serem observadas.

Existe, pelo menos, duas hipóteses em que se configura um condomínio irregular.

Imagine-se, inicialmente, um conjunto de imóveis entregue por uma construtora, com habite-se regularizado, comissão de moradores que serve a gerir o condomínio, pagamento de taxas regulares e até delimitação de estacionamento. Tudo aqui “conspira” a ser um condomínio. Há, até uma convenção por escrito, aprovada por 2/3 dos condôminos. Por alguma hipótese, entretanto, essa convenção não foi levada a registro adequado.

Talvez por desorganização administrativa. Talvez porque o corpo técnico do condomínio registrou a convenção condominial no Cartório de Títulos e Documentos, mas não no Cartório de Registro de Imóveis, o local correto para registro da convenção. Talvez a gestão inicial tenha levado corretamente a convenção a registro, que foi devolvida pelo Cartório de Registro de Imóveis para correção e ficou por isso mesmo.

A ausência de registro adequado no Cartório de Registro de Imóveis, seja lá por qual motivo, é suficiente para tal estrutura não ser reconhecida como condomínio em sua forma plena.

De outro lado, imagine-se a constituição de diversos imóveis em uma grande área comum, em que os moradores decidiram por uma estrutura semelhante ao caso anterior: repartição de despesas, comissão de moradores, pagamento de taxas, delimitação de estacionamento. Novamente, até aqui tudo “conspira” a também ser um condomínio.

Percebe-se, entretanto, que todas as relações entre os moradores se dão através de um “acordo de cavalheiros”, sendo os direitos e deveres discutidos de modo meramente verbal. Nunca houve documento assinado, nem reunião a deliberar a respeito de mandato de síndico, infrações e multa ou até quórum de assembleias.

Aqui se está em situação muito mais delicada, pois a irregularidade não se deu por ausência de registro, mas por ausência de documentação.

Os condomínios irregulares dos dois exemplos sofrerão limitações práticas. Cada um ao seu modo, contudo, terão mais ou menos limitações, de acordo com as temáticas abaixo:

COBRANÇA DE TAXAS: No caso dos condomínios que tenham convenção escrita e aprovada, mas não registrada, o Poder Judiciário permite a sua cobrança frente aos moradores. Condomínios em que o acerto é puramente verbal, entretanto, não terão legitimidade para cobrar cotas e taxas de quem quer que seja.

REPRESENTAÇÃO FRENTE A TERCEIROS: caso o condomínio exista por convenção, mas não seja registrado no Cartório de Imóveis, a convenção não terá eficácia perante terceiros. De tal modo, em qualquer relação com pessoa estranha ao condomínio, a convenção não gerará efeitos jurídicos.

CADASTRO DE CNPJ: Para cadastrar o condomínio como pessoa jurídica, necessário é que a convenção do condomínio esteja devidamente registrada no cartório de imóveis. Sem o CNPJ o condomínio passa por diversas limitações, como em questões fiscais, trabalhistas, contratuais e outros. Até mesmo a conta de luz, por exemplo, ficará por cargo de um CPF (e o cadastro no SPC/SERASA também, por consequência);

ELEIÇÕES DE SÍNDICO: os condomínios sem convenção aprovada pelos seus moradores sofrerão dificuldades quanto a mandatos de síndico. Isso porque, ao não existir condomínio regular e nem sequer convenção aprovada, as regras de direito condominial não se aplicarão. É aquele caso do síndico que vai ficando por anos na administração, faz o que bem quer, e nunca é deposto.

DESVALORIZAÇÃO DO IMÓVEL: sem condomínio constituído, há menos segurança jurídica aos moradores. Dessa maneira, o mercado imobiliário vê tais condomínios com maior cautela, e o preço dos imóveis tende a baixar numa compra e venda.

Apesar de todas as limitações, verifica-se que essas situações podem ser resolvidas com estratégias corretas. Regularizar um condomínio é um passo essencial para valorização dos imóveis e para a boa conduta do condomínio. Caberá a administração a competência de levar a cabo as confecções, aprovações e registros de suas convenções, para que a efetividade jurídica condominial se dê em plenitude.

*Tiago Almeida Alves é advogado graduado em Direito pela UFBA, pós-graduado em Direito Imobiliário, Urbanístico, Registral e Notarial pela UNISC-RS, membro da Comissão de Condomínio do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (IBRADIM), e atualmente cursa o MBA em Gestão de Escritórios de Advocacia e Departamentos Jurídicos na Baiana Business School (Faculdade Baiana de Direito). 

Classificação Indicativa: Livre

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