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Tratar pets como criança é prejudicial para saúde dos animais, afirmam especialistas

Natasha Barbieri por Pixabay
Tratar animais como criança pode não ser a melhor forma de demonstrar amor pelo seu bichinho  |   Bnews - Divulgação Natasha Barbieri por Pixabay
Adelia Felix

por Adelia Felix

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Publicado em 07/06/2021, às 08h00 - Atualizado em 20/11/2022, às 11h00


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Colocar o cachorro ou gato saudável em carrinho para bebês durante um passeio na praça, deixar o pet sufocado com roupinhas de criança. Até que ponto humanizar um animal doméstico é considerado normal? Especialistas ouvidos pelo BNews explicaram cientificamente que esses hábitos podem afetar de forma negativa o bem-estar do pet. 

Segundo o médico-veterinário, Zenildo Prazeres, adestrador há 50 anos e instrutor de cinotecnia da Polícia Militar da Bahia, esse comportamento pode desenvolver uma série de patologias nos animais.

"Pode desencadear dermatites, lambeduras, síndrome de ansiedade por separação e até copofragia [ingestão de fezes]. Os cães passam a não querer se alimentar com comida de cães e preferem sorvetes, passam a ter gosto pelo açúcar. Começa a ter paladar seletivo pela alimentação humana. Têm animais que pedem excessivamente para ficar no colo, não conseguem ficar sozinhos em casa", explica.

A zootecnista e doutora em ciência animal, Ana Carolina Ferreira, que também atua como consultora comportamental e adestramento, alerta que os pets necessitam de regras. A especialista esclarece que as pessoas associam a humanização de um animal ao bom cuidado com o cão ou gato, mas há diferenças. Além disso, os pets não leem isso como afeto, e sim, como fraqueza.

"Um animal que tem todas as suas vontades atendidas, aquele conhecido como mimado. Também aquele que não tem nenhuma  regra para cumprir em casa, e aqueles que lhes são atribuídos sentimentos humanos, como ciúme. Muitos tutores fazem a leitura disso como amor, e acabam estimulando esse comportamento, que é na verdade, um comportamento de possessividade que deve ser corrigido para que ele fique mais equilibrado e feliz", diz.

O médico-veterinário e clínico comportamental, Luis Carlos Sousa, destaca uma modificação no perfil dos tutores atuais que têm transferido para cães e gatos a responsabilidade de desempenhar o papel de filhos.

"Há uma mudança no perfil de tutores que não têm filhos e fazem uma transferência dessa maternidade ou paternidade muito intensa, uma carga emocional muito grande em cima desse animal. A gente não está falando de não cuidar do animal e não tratar com tudo que ele mereça. Mas, às vezes é colocada muita emoção e muita responsabilidade para o pet atender. Tratar um animal como bebê ou criança torna ele muito dependente, apegado", alerta.

A doutora Ana Carolina reforça que esse tipo de postura gera no pet inabilidade social tanto com outros animais quanto com outras pessoas, além de problemas como a possessividade. 

"As pessoas precisam entender que os animais não querem ser tratados com regalias e mimos, sobretudo, os cães apreciam as regras e disciplinas, é assim que eles se sentem confortáveis no ambiente em que vivem e tornam-se ou se mantêm equilibrados. Os gatos precisam ter condição de expressar seu comportamento natural da espécie, como caçar, nem que seja um ratinho de brinquedo, escalar. Os cães precisam ter regras definidas e 'trabalhar' para ter as coisas em troca. Eles  precisam e eles adoram", detalha.

O veterinário Zenildo acrescenta que o período do desenvolvimento físico e psicológico da criança é completamente diferente do cão ou gato. "Quando nós fazemos um paralelo, um cão adulto corresponde a uma criança de dois ou quatro anos, a comparação é para avaliar as questões de cognição daquele animal como uma criança, mas quando a gente faz esse paralelo e achamos que é da mesma espécie, falhamos", afirma.

Roupinhas e acessórios


Sobre o uso de acessórios, roupas e fantasias, o veterinário Luis Carlos afirma que a utilização desses objetos não humaniza o cachorro ou gato, no entanto, ele alerta: "É a forma como a gente coloca. Se esse animal não está acostumado, isso deve trazer um desconforto para ele. Colocar uma roupa muito abafada em um cachorro em um dia quente, vai ser algo que vai aumentar a temperatura dos cães. Têm animais que vão se sentir super confortáveis, mas aqueles que não têm esse costume se sentirão desconfortáveis".

De acordo com a zootecnista Ana Carolina, alguns animais não se incomodam, outros, como os cães das raças Crista Chinês e Galgos, até precisam usar roupinhas nos dias de baixa temperatura por serem muito sensíveis ao frio. Mas, ela ressalta que o importante é observar o comportamento do cachorro e gato e respeitá-lo.

"Se ele demonstrou desconforto com esses acessórios e não é nada que precisamos fazê-lo aceitar, como uma fantasia de Carnaval, que serve apenas para divertimento humano, não tem motivo para forçá-lo a isto, mas se ele está a vontade tudo bem", orienta.

O veterinário Zenildo argumenta que o uso de acessórios é algo que está além da necessidade básica do animal. "Nenhum animal dentro do aspecto natural se sente bem com algo em cima do seu corpo. Isso é um comportamento humano de transgredir. O que vejo é um cão que se acostumou a determinados adereços e acessórios".

Como demonstrar amor de forma saudável?
A notícia boa é que há muitas formas de mostrar afeto e fortalecer a ligação com o animal estimação. Para a doutora Ana Carolina, a melhor maneira é respeitar as necessidades particulares da espécie, um canino ou um felino, ou seja, dar ao pet o que ele efetivamente precisa. 

"Muitas pessoas pensam que por amar tanto seu cachorro ou gato, devem tratá-lo como se ele fosse uma coisa que ele não é, uma pessoa. Não há declaração de amor maior do que tratar quem você ama com respeito ao que ele é, ao invés de tentar transformá-lo em outra coisa", afirma.

O veterinário Luis Carlos reforça que é necessário ter um lar que atenda às necessidades do pet. "A gente precisa atender ao comportamento de caçar, de morder. O tutor pode demonstrar amor, carinho, brincar muito com esse cachorro ou gato. Tutores de gato precisam ser incentivados a brincar mais com eles. Isso vai construir uma experiência melhor entre o animal e o dono", afirma.

O veterinário Zenildo avalia que o tutor deve apostar na socialização do animal, adestramento com reforços positivos e boa educação sanitária. Além disso, o especialista adverte que o ser humano também precisa estar bem com ele mesmo antes de adotar um animal.

"Uma pessoa que não é feliz, não pode fazer ninguém feliz. Você não pode pegar um animal para suprir  as suas carências e necessidades. O animal precisa de cuidados, ração de qualidade, idas ao veterinário, você precisa ter uma boa relação com vizinhos. E, é importante reforçar que não humanizar o animal não é maltratar, pelo contrário, quando você humaniza, você maltrata", alerta.

Ou seja, cães e gatos têm uma comunicação diferente da nossa e precisam de outros sinais para entender o nosso "eu te amo". Mas, uma relação de afeto saudável e respeitosa é capaz de demonstrar isso. Além de fortalecer o vínculo especial entre tutor e pet, o carinho ainda traz diversos benefícios para você e seu amigo.

Classificação Indicativa: Livre

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