Coronavírus

Governo adquiriu Covaxin por preço 1.000% mais alto do que o estimado pelo próprio fabricante

Divulgação
Documentos sigilosos do Ministério das Relações Exteriores apontam para situação  |   Bnews - Divulgação Divulgação

Publicado em 22/06/2021, às 07h25   Redação BNews


FacebookTwitterWhatsApp

O governo federal comprou a vacina Covaxin, imunizante indiano contra a covid-19, por um preço 1.000% maior do que, seis meses antes, era anunciado pela própria fabricante. É o que aponta um telegrama sigiloso da embaixada brasileira em Nova Délhi que o jornal Estado de São Paulo teve acesso.

O documento do Ministério das Relações Exteriores, datado de agosto do ano passado, informava que o imunizante produzido pela Bharat Biotech tinha o preço estimado em 100 rúpias - US$ 1,34 a dose.

Meses depois, em dezembro, outro comunicado diplomático dizia que a vacina “custaria menos do que uma garrafa de água”. Já em fevereiro deste ano, o Ministério da Saúde pagou US$ 15 por unidade - R$ 80,70, na cotação da época.

Desta forma, a Covaxin é a mais cara das seis vacinas adquiridas pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) até agora. A ordem para a aquisição do imunizante  partiu pessoalmente do chefe do Executivo.

Também de acordo com o periódico, a negociação ocorreu em um prazo bem mais curto que os demais acordos - aproximadamente três meses. No caso da Pfizer, por exemplo, foram quase onze meses, período em qual o preço oferecido não se alterou - US$ 10 por dose. 

Mesmo mais barato que a vacina indiana, o custo do produto da farmacêutica americana foi usado como argumento pelo governo Bolsonaro para atrasar a contratação, só fechada em março deste ano.

O Ministério da Saúde fechou o contrato para a aquisição de 20 milhões de doses da Covaxin por R$ 1,6 bilhão em fevereiro, por US$ 10 a dose em ambos os casos, antes mesmo de assinar com a Pfizer e com a Janssen.

As duas últimas já concluíram os testes de seus imunizantes, enquanto os estudos de fase 3 da Covaxin – a última etapa – ainda estão incompletos. O acordo previa o fornecimento de 6 milhões de unidades já em março, mas condicionava a um aval da Agência Nacional Nacional de Saúde (Anvisa), que só foi dado no último dia 4 de maio.

Ainda assim, órgão impôs uma série de condições para que o governo distribua a vacina, como um plano de monitoramento de quem receber as doses - o que ainda não foi apresentado.

Diferentemente dos demais imunizantes, negociados diretamente com seus fabricantes, a compra da Covaxin pelo Brasil foi intermediada pela Precisa Medicamentos. A empresa virou alvo da CPI da Pandemia, que na semana passada autorizou a quebra dos sigilos telefônico, telemático, fiscal e bancário de um de seus sócios, Francisco Maximiano.

O depoimento do empresário na comissão está marcado para a próxima quarta-feira (23).

Os senadores querem entender o motivo de o contrato para a compra da Covaxin ter sido intermediado pela Precisa, que em agosto foi alvo do Ministério Público do Distrito Federal sob acusação de fraude na venda de testes rápidos para covid-19. 

Na ocasião, a cúpula da Secretaria de Saúde do governo do DF foi denunciada sob acusação de ter favorecido a empresa em um contrato de R$ 21 milhões. A Precisa tem como sócia uma outra empresa já conhecida por irregularidades envolvendo o Ministério da Saúde – a Global Gestão em Saúde S. A. 

Ela é alvo de ação na Justiça Federal do DF por ter recebido R$ 20 milhões da pasta para fornecer remédios que nunca foram entregues. O negócio foi feito em 2017, quando o ministério era chefiado pelo atual líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas).

Passados mais de três anos, o ministério diz que ainda negocia o ressarcimento.

Em depoimento ao Ministério Público, um servidor do Ministério da Saúde aponta “pressões anormais” para a aquisição da Covaxin. O funcionário relatou ter recebido “mensagens de texto, e-mails, telefonemas, pedidos de reuniões” fora de seu horário de expediente, em sábados e domingos. Esse depoimento está em poder da CPI.

Questionada pela reportagem, a Precisa informou que “o preço da vacina é estabelecido pelo fabricante”, mas não informou se recebeu comissão pelo negócio. 

"O mesmo preço praticado no Brasil foi estabelecido para outros mercados. Em agosto, quando a vacina estava na fase 2 de testes clínicos, não havia ainda como dimensionar o preço final. Em janeiro, a Bharat Biotech comercializou a vacina internamente, para o governo indiano, praticando um valor menor do que o comercializado para fora da Índia. Isso porque o país é co- desenvolvedor da vacina e disponibilizou recursos para auxiliar no seu desenvolvimento", diz, em nota.

Sobre a denúncia de irregularidades na venda de testes ao governo do DF, a empresa diz ter cumprido “todas as exigências legais” e que já prestou esclarecimentos às autoridades. Também procurado, o Ministério da Saúde se limitou a dizer que o pagamento das vacinas será feito “somente após a entrega das doses”.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp