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Inventário: MP-BA fecha delação com investigado, pede domiciliar e Justiça nega; veja detalhes

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Pedido foi baseado em delação de outro réu, que deveria ser sigilosa  |   Bnews - Divulgação Divulgação

Publicado em 09/04/2021, às 21h10   Yasmin Garrido


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O Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Gaeco), iniciou tratativas de um acordo de colaboração premiada com a defesa técnica do advogado Marco Aurélio Fortuna Dórea, preso em 10 de setembro do ano passado no âmbito da Operação Inventário, que investiga fraudes milionárias em processos de partilha de bens do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA).

A possibilidade de delação motivou o MP-BA a solicitar, em petição acessada com exclusividade pelo BNews, à Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa de Salvador a substituição da prisão preventiva de Marco Aurélio por domiciliar, pedido negado em decisão proferida em 10 de março de 2021. No entanto, o órgão estadual insistiu na tentativa de substituir a preventiva, em petição anexada aos autos em 22 de março.

No documento, assinado por sete promotores do MP-BA, o argumento utilizado é que a situação do réu, que está custodiado no Batalhão de Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador, dificulta a obtenção de provas, tanto testemunhas quanto documentais, por parte do MP-BA.

Em razão da pandemia da Covid-19, “o acesso aos encarcerados, inclusive pelos seus advogados foi sobremaneira restringido, numa perspectiva de distanciamento físico que acentua a dificuldade, até mesmo, das narrativas corretas de nomes, documentos, datas e valores relacionados ao objeto do acordo por Marco Dórea”, escreveu o MP-BA.

Ainda, segundo o órgão estadual, o advogado já relatou ter “sofrido ameaças dentro do sistema prisional, numa sistemática lamentável em que o candidato a colaborador, como regra, é tido como dedo duro a merecer represálias dos internos, em verdadeiro, permissa vênia, tribunal de ética do crime”.

Detalhes do acordo
De acordo com petição do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), que o BNews teve acesso na íntegra, as tratativas por e-mail com o Gaeco e a defesa de Marco Aurélio tiveram início em 12 de janeiro de 2021, quando foi manifestado “interesse jurídico em buscar uma linha de defesa técnica calcada no instituto da colaboração premiada”.

O órgão estadual deixou claro que, em momento algum o acordo foi condicionado ao pedido de liberdade do réu e que a domiciliar foi solicitada para manter a segurança do acusado e da própria investigação.

Além de assumir os fatos descritos na Ação Penal que apura as suspeitas da Operação Inventário, “a defesa técnica de Marco Dórea vem narrando diversas outras fraudes similares ocorridas, a gerar uma ampliação subjetiva e objetiva do desdobramento investigativo”.

Segundo o MP-BA, “em virtude da prisão preventiva o colaborador está impossibilitado de acessar e reforçar o material probatório do acordo, a dificultar em muito a colaboração com a Justiça na apuração dos fatos narrados nos anexos”. 

O órgão ainda ressaltou que, em respeito à necessidade de sigilo da delação, “não há condições adequadas para que, na unidade prisional onde se encontra Marco Dórea ocorra uma análise minuciosa da apresentação dos dados e documentos importantes para fundamentar o acordo de colaboração premiada com o Gaeco”.

Outro argumento utilizado pelo MP-BA para solicitar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar do advogado investigado na Operação Inventário é que na residência dele “haveria melhores condições para viabilizar a segurança pessoal e de informação para o desenvolver desta fase de estruturação e celebração do acordo”.

Primeira negativa
O juiz Vicente Reis Santana Filho negou o pedido feito pelo MP-BA, sob o argumento de que ainda estão mantidos os fundamentos ensejadores da prisão preventiva aplicada a Marco Aurélio Fortuna Dórea.

Quando abordada a revogação da prisão de João Carlos Santos Novaes, advogado apontado também como participante das fraudes milionárias em inventários na Bahia, o magistrado afirmou que “avaliou como adequada a condição jurídica de conceder a liberdade e foi fundamentada naqueles termos, sobretudo na segurança do mesmo, posição jurídica que este juízo então reputou como adequada”.

Já quanto ao risco de vida de Marco Aurélio ao fechar delação e permanecer detido, o juiz ressaltou que “o acordo de colaboração premiada é um instituto sigiloso, sendo de conhecimento apenas das partes envolvidas, situação que não implicaria em risco à vida do colaborador”, que está no Batalhão de Lauro de Freitas, local de maior segurança que o Centro de Observação Penal da Mata Escura, onde estava João Carlos.

Ao final, o juiz afirmou que os acordos de delação premiada são todos sigilosos, porém, ao expedir decisão que revogou a prisão do réu João Carlos Santos Novaes, o magistrado plantonista, que dispensou o uso de tornozeleira eletrônica, “expôs a tratativa do referido acordo pelo então paciente”.

Nova tentativa
Após a negativa de domiciliar pelo juízo da Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa de Salvador, os advogados de Marco Aurélio novamente insistiram na substituição da prisão preventiva.

Para o MP-BA, a manutenção da prisão preventiva inviabiliza a produção de provas e a “filtragem de toda documentação em seu poder, sobretudo ante a diversidade de arquivos digitais produzidos”, assim como a obtenção das provas pelo órgão estadual.

De acordo com a legislação brasileira, há o sigilo de todos os dados apresentados pelo colaborador até o momento do recebimento da denúncia. “Assim, no caso posto em mesa, não há condições de logística adequadas para que, na unidade prisional onde se encontra Marco Dórea ocorra uma análise minuciosa e checagem de informações, acerca da apresentação dos dados e documentos importantes para fundamentar o acordo de colaboração premiada com o Gaeco”, disseram os promotores.

Ainda, o MP-BA argumentou que não se fazem presentes os requisitos necessários para a manutenção da preventiva contra Marco Dórea, uma vez que ele possui “tendo endereço certo e ocupação definida”.

Segunda negativa
Em resposta ao novo pedido de substituição da prisão preventiva por domiciliar, o juiz Vicente Reis Santana Filho afirmou que “o conceito da colaboração premiada passou a ser desvirtuado no momento em que iniciou-se o surgimento de favores extralegais, dentre eles a concessão de liberdade provisória”.

O magistrado expôs que o Gaeco, “trouxe a informação de que não mais encontram-se presentes os requisitos que fundamentaram o decreto preventivo em desfavor do réu Marco Aurélio, afirmando que, ao se comprometer com o acordo de colaboração premiada, ele teria assumido o compromisso de cooperar com a justiça, além de ter endereço certo e ocupação definida, e que a instrução será suavizada com as evidências probatórias trazidas”.

Ainda, o juiz afirmou que, embora haja um acordo de colaboração premiada em trâmite entre o MP-BA e a defesa de Marco Aurélio, a Justiça fica restrita às informações prestadas no âmbito das duas denúncias relativas à Operação Inventário, quando “mostram-se ainda presentes os mesmos requisitos que autorizaram a custódia preventiva”.

Recurso
Após as negativas de substituição da preventiva pela domiciliar, a defesa de Marco Aurélio Fortuna Dórea entrou com Habeas Corpus perante o segundo grau do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), na tentativa de modificar a decisão expedida pelo primeiro grau de jurisdição. 

A desembargadora Soraya Moradillo, da 2ª Câmara Criminal da 1ª Turma, no entanto, entendeu que “não houve equívoco na análise do pedido liminar”. Ainda de acordo com a magistrada, os elementos trazidos pela defesa de Marco Aurélio não se mostram suficientes para a concessão da liminar e, consequentemente, substituição da prisão preventiva por domiciliar.

O juiz Vicente Reis, nesta quarta-feira (7), enviou ofício ao Segundo Grau prestando todos os esclarecimentos sobre os motivos que o levaram a negar o pedido feito pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA). Já nesta sexta (9), foi aberta vista ao órgão estadual.

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