Justiça

Mães de Haia: Justiça analisa caso de brasileira que teve filhas retiradas de casa e mandadas para Irlanda

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Raquel Cantarelli perdeu a guarda das filhas após decisão do TRF-2, com base na Convenção de Haia, determinar que as crianças fossem para a Irlanda  |   Bnews - Divulgação Arquivo pessoal
Thiago Teixeira

por Thiago Teixeira

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Publicado em 12/05/2025, às 18h25 - Atualizado às 18h50



No dia 14 de junho de 2023, a vida da nutricionista carioca Raquel Cantarelli mudou completamente quando suas filhas, Júlia e Isabella — hoje com 7 e 5 anos, respectivamente — foram retiradas de casa após uma operação da Polícia Federal (PF) por determinação da Justiça Federal do Rio de Janeiro.

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) determinou que as duas jovens retornassem ao seu país de origem e, com isso, passassem a morar com o ex-marido de Raquel, Trevor Maloney, que mora na Irlanda — onde ela o conheceu, em 2017. A nutricionista acusa o ex-companheiro de cárcere privado e afirma que decidiu voltar com as filhas para o Brasil, sem a autorização do pai, por ele por em risco a vida dela e das crianças.

O BNews obteve acesso ao processo. A decisão da Justiça Federal que fez com que as crianças fossem levadas para a Irlanda é baseada na Convenção Internacional de Haia — um acordo internacional no qual o Brasil faz parte e que busca proteger crianças em situação de ruptura familiar que tenham sido retiradas de seu país de residência.

Após perder a guardas das meninas, Raquel recorreu à Justiça e o Ministério Público Federal (MPF) encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) um recurso sobre o caso – que acionou o artigo 13B da Convenção, que desobriga as autoridades do Estado à repatriação quando existir um “risco grave de a criança, no seu retorno, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica".

Após três audiências, os cinco ministros aprovaram o recurso do MPF em 17 de dezembro de 2024. Em 20 de fevereiro foi publicado o acórdão. Contudo, após a Advocacia-Geral da União (AGU) recorrer, o caso precisará passar por uma nova análise que ocorrerá durante audiência nesta terça-feira (12). Em entrevista exclusiva ao BNews, Raquel Cantarelli, falou sobre estar esperançosa, porém entristecida com a postura da AGU.

Hoje eu me encontro com o coração aflito, mas também repleto de esperança para que o STJ mantenha a decisão. O que mais me entristece é o posicionamento da AGU, já que a mesma se comprometeu publicamente em não recorrer em processos onde há comprovadamente situações de risco e violência. E no meu caso apresentou embargos contra a decisão que reconheceu a gravidade em que minhas filhas se encontram”, afirmou a mãe ao BNews.

Pontos e contrapontos

A Defensoria Pública da União (DPU) — que representa Raquel contra a AGU — afirma que a ratificação da Convenção da Haia trouxe avanços para a proteção internacional de crianças, mas o retorno dos menores não pode ser a qualquer custo. Pela Advocacia-Geral da União, no entanto, o procurador de assuntos internacionais, Boni de Moraes Soares, defendeu a legalidade do tratado no Brasil.

Ele ainda informou que o tempo médio de retorno de menores é de dois anos e quatro meses. Para o procurador, os interesses dos menores são observados pelos órgãos brasileiros que atuam nos processos de devolução e o Brasil deve continuar cooperando com os demais países.

De acordo com Raquel, a postura da Advocacia-Geral da União é totalmente contraditória, “além de ser uma violência contra as famílias brasileiras que lutam por justiça e proteção”. A nutricionista afirmou confiar que o STJ vai manter a decisão e reafirmar o “dever do Estado brasileiro de proteger crianças e mulheres vítimas de violência”.

Confio que teremos uma decisão que olhe para o direito das crianças, para o direito à vida, à proteção e à dignidade. E eu não estou lutando contra a Convenção de Haia. Eu luto para que ela seja aplicada com a humanidade, com respeito e com a garantia do cumprimento das exceções que já estão previstas”, afirmou Raquel ao BNews.

O advogado de Raquel, o baiano Vinicius Melo, também conversou com a reportagem. De acordo com ele, a mãe tem sido impedida de conversar com as filhas, mesmo que por videoconferência. Apesar de não estar representando a nutricionista neste caso, Vinícius afirma que está acompanhando de perto todos os desdobramentos.

O último dia que ela [Raquel] falou com as filhas foi quando elas foram arrancadas dos braços dela. Então, esse tipo de atuação da AGU, ela é uma atuação que incorre numa vitimização secundária, que é basicamente fazer com que Raquel, que tanto já sofreu, seja revitimizada”, afirmou o advogado ao BNews.

A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Trevor Maloney. O espaço segue aberto e a matéria será atualizada em caso de eventual posicionamento futuro.

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