Cultura

Resenha: Ó Paí Ó 2 amadurece a narrativa sem perder a essência

Joilson César / BNews
Filme mantém a baianidade como centro, abrindo espaço para tratar de temas mais urgentes ao convívio social  |   Bnews - Divulgação Joilson César / BNews

Publicado em 18/11/2023, às 06h40   Marco Dias


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Mercado negro, dia de branco, preto de alma branca, a coisa tá preta, não sou tuas negas. Todas essas expressões, naturalizadas pelas pessoas, são carregadas de uma herança centrada no preconceito e na violência contra a população negra.

E, desde o lançamento de Ó Paí Ó, em 2007, o filme se propõe a questionar, ainda que de forma sutil, essa vertente ideológica, trazendo conceitos como “mercado branco”. 

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"Quando eu vim lá da África/ Fui vendido no mercado branco/ Simplesmente uma carga/ Negociada no mercado branco (...)”, diz um trecho da música performada pelo personagem de Lázaro Ramos no filme. 

O grande diferencial de Ó Paí Ó 2 em relação ao seu antecessor é o amadurecimento da trama. Quinze anos se passaram desde o primeiro filme, que focava nos personagens de um cortiço do Pelourinho, em Salvador, que só queriam curtir o carnaval. 

No longa de 2023, acompanhamos Roque (Lázaro Ramos) durante as gravações de uma música que ele acredita ser um sucesso garantido do próximo verão. Mas ao sair do estúdio, ele se depara com o pessoal do cortiço mobilizado, procurando por Neuzão (Tânia Tôko), que perdeu o seu tradicional bar/point da galera.

Enquanto isso, Dona Joana (Luciana Souza) vive atordoada após a morte de seus filhos, Cosme e Damião, e perambula pelo Pelourinho adotando jovens em situação de rua e levando-os para sua casa no cortiço. 

Decididos a ajudar Neuzão a recuperar o bar, Roque, Yolanda (Lyu Arisson), Reginaldo (Érico Brás), Maria (Valdinéia Soriano), mãe Raimunda (Cássia Vale), Matias (Jorge Washington) e vários novos moradores se juntam para criar um evento no dia da festa de Iemanjá, para arrecadar fundos e quitar a dívida do bar. 

A narrativa envelhece bem, sendo contextualizada com problemas contemporâneos, o que se deve, em grande parte, à passagem do tempo.

Temas como violência policial, falsidade ideológica, preconceito, racismo, saúde mental e tecnologia são tratados com leveza, mas o grau de profundidade aumenta diante do atual cenário brasileiro. Não à toa, Roque começa dizendo que o país está dividido - e realmente está - e os personagens enfrentam diversos problemas ao longo da história, mas sempre juntos. 

Se Dominic Toretto tem uma família para chamar de sua em Velozes e Furiosos, Roque faz da cortiço do Pelourinho e das pessoas que ali habitam o seu legado, a herança da comunidade preta, pobre e periférica do Centro Histórico de Salvador. 

Essa mudança de tom deixa claro que, apesar de ser uma comédia, o filme quer debater questões raciais, trazendo o cotidiano da vida da população brasileira negra. E passando uma mensagem clara para as novas gerações. 

O rejuvenescimento do elenco, apoiado no bando de teatro do Olodum, não é só um sinal de que os tempos mudaram, mas de que é preciso ensinar os jovens a luta diária que eles terão que enfrentar para se impor socialmente. 

Como diria a escritora Conceição Evaristo, “o importante não é ser o primeiro ou primeira, o importante é abrir caminhos”, e o roteiro do filme, assinado por Daniel Arcades, Viviane Ferreira, Elísio Lopes Jr e Igor Verde, com colaboração do Bando de Teatro Olodum cria um “metaverso preto”, onde não há mais espaço para se omitir diante de absurdos cometidos com a população afrobrasileira, em um país majoritariamente composto por negros. Como referências, a própria escritora, além do músico Marvin Gaye e da cultura local são fonte de construção para a trama. 

“O Ó Paí Ó é uma síntese de temas do Brasil ao longo de quinze anos que esse grupo de criadores do Bando de Teatro Olodum tiveram a oportunidade de trazer para cena para continuarmos a conversa”, diz Lázaro Ramos durante entrevista concedida ao BNews. 

Dialogando com o sucesso da banda BaianaSystem, o filme ainda traz um núcleo musical com novos artistas, como A Dama do Pagode, Nininha Problemática, Tiganá Santana, além da presença da atual ministra da cultura Margareth Menezes. Outro destaque musical é Clara Buarque, que interpreta Florzinha. 

Indo além de um simples entretenimento, um filme de comédia pura e simples, Ó Paí, Ó 2 traz a mensagem do “aquilombar-se” como forma de resistência (e sobrevivência) das pessoas pretas. 

Com estreia prevista para 23 de novembro de 2023, o filme terá sessões de pré-estreia na Bahia neste final de semana, do dia 18 ao dia 20

Ficha Técnica 

Ó Paí, Ó 2 

Direção: Viviane Ferreira

Roteiro: Daniel Arcades, Elísio Lopes Jr, Igor Verde, Viviane Ferreira e Bando de Teatro Olodum

Elenco: Lázaro Ramos, Érico Brás, Tânia Tôko, Luciana Souza, Clara Buarque e outros. 

Duração: 01h30min 

Gênero: Comédia/Drama 

Estreia nacional: 23 de novembro de 2023 

Classificação Indicativa: Livre

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