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Samarco prepara volta após desastre de Mariana, diz executivo da BHP

Imagem Samarco prepara volta após desastre de Mariana, diz executivo da BHP
Empresa prevê reconstruir vilarejo em até 2 anos e retomar mineração em MG  |   Bnews - Divulgação

Publicado em 21/08/2018, às 07h05   Folhapress


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Agora que a licença ambiental para a construção do novo vilarejo de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), foi expedida, a Samarco pode se preparar para voltar à operação. Mas isso deve demorar ainda pelo menos dois anos.

A avaliação é de Bryan Quinn, executivo da anglo-australiana BHP Billiton, sócia da brasileira Vale na mineradora responsável pelo desastre de 5 de novembro de 2015.

Presidente do setor de joint ventures não operadas diretamente pela BHP, portanto responsável pela participação na Samarco, Quinn reclama de entraves burocráticos que não permitiram acelerar o processo de remediação ambiental e o pagamento de indenizações após o rompimento da barragem de Fundão, que matou 19 pessoas.

No entanto, Quinn se anima com o aval dado pela Justiça em 8 de agosto ao último acordo com o Ministério Público Federal, dois anos e meio após o acordo firmado com o governo federal.

O novo documento impõe maior participação dos atingidos nas decisões tomadas pela Fundação Renova, criada pelas mineradoras para fazer a recuperação social e ambiental.

“Não me parece necessariamente certo ver a mineração acontecendo e Bento não acontecendo. Isso é muito importante para nós”, afirma Quinn.

Na estimativa da Renova, a construção do novo Bento deve demorar entre 22 e 24 meses. Em paralelo, a Samarco tentará obter nova licença operacional e resolver problemas estruturais internos, além de encontrar soluções de segurança para os rejeitos, a fim de voltar a minerar.

Quinn nega que a empresa soubesse de problemas estruturais na barragem que poderiam ter levado à ruptura, como acusa a Procuradoria.

No fim de 2016, BHP, Vale e Samarco e 21 executivos das três mineradoras viraram réus sob acusação de homicídio com dolo eventual. As empresas também são acusadas de crime ambiental. 

A VogBR, que inspecionava a barragem, e um dos seus engenheiros respondem pelo crime de falsificação de laudo ambiental. 

A seguir, os principais trechos da entrevista realizada em 9 de agosto.

Responsabilidade da BHP

Li o relatório [de especialistas contratados pelas mineradoras] dois anos atrás, quando foi publicado. Ele é muito abrangente em termos da série de coisas [que contribuíram para o rompimento]. Não tenho como fazer mais comentários, mas creio que o relatório aponta exatamente todos os ingredientes.

Não sou um especialista em barragens nem em rejeitos, mas lendo o relatório e o tipo de coisas que eles arrolam, não estou seguro de que haja uma conclusão [sobre a responsabilidade por falhas].

O relatório é a melhor informação que temos. No nosso entendimento, ninguém tinha informação para dizer que sabia que a barragem iria falhar. Na operação sempre há pequenas coisas que saem errado, as pessoas agem e corrigem, não diria que isso é algo incomum em qualquer indústria pesada.

Não posso fazer comentários sobre a mudança [de eixo da barragem, local do rompimento]. Para ser franco, não sei. Vi no relatório também, mas, se recordo, foi uma das coisas que se somaram, uma combinação de questões que não estava sendo vista pelas pessoas.

As pessoas que trabalhavam para a BHP [e são acusadas de homicídio], em geral, continuam a trabalhar. Alguns escolheram sair, alguns se aposentaram. Nós damos todo o apoio a essas pessoas, eles não fizeram nada de errado.

Não concordamos com as especulações [de que a BHP sabia dos riscos e nada fez] e vamos nos defender custe o que custar.

Por que BHP demorou a falar

[Agora] temos coisas positivas em duas frentes: a ratificação do acordo de governança, ontem [08/08] e, em segundo lugar mas muito importante, a licença para o reassentamento de Bento Rodrigues concedida semanas atrás. A preparação para as obras de construção está andando, uma notícia fantástica.

De início, antes de a Renova entrar em cena, pusemos nosso foco, energia e esforços em resolver o problema, em consertar com segurança a barragem. Era o foco de nossa companhia, assegurar que a Samarco mantivesse o foco nisso.

Depois, quisemos garantir que a Renova se estabelecesse e fosse eficaz em remediação e compensação.

Vantagens de novo acordo

É frustrante que as coisas estejam demorando tanto, frustrante para nós e para a pessoa que está esperando pela compensação [indenização] ou pela remediação [recuperação ambiental]. Não estou criticando, só gostaríamos de ver as coisas andando muito mais depressa.

Acreditamos que o acordo de governança assinado com todas as partes pode reuni-las todas e, tomara, seguir em frente. Não quer dizer que sempre será sem obstáculos, mas acho que permite um caminho melhor.

Não podemos desfazer o que aconteceu. Tudo que podemos fazer é corrigir isso, em termos de remediação e compensação. As melhores características do acordo estão no fato de as comunidades agora terem envolvimento em todos os seus aspectos, os conselhos, os comitês, os grupos técnicos, as comunidades originais, as comissões locais.

Recuperação x Indenizações

A remediação ambiental está indo excepcionalmente bem. Mais de 130 afluentes estão em recuperação. Aproximadamente 500 nascentes. Se você viaja ao longo do rio nem consegue perceber o que de fato ocorreu.

Em termos sociais, há duas áreas em que estamos mais focados, no reassentamento, uma das questões sociais mais importantes, e em apoiar a Renova para que devolva os pescadores às suas atividades econômica tão rápido quanto possível.

Independência da Renova

Agora o conselho diretor tem nove representantes, não sete. Agora temos membros da comunidade como parte da representação e temos o Comitê Interfederativo (CIF), o grupo de governança para verificar e assegurar que o trabalho se alinha com o que deve acontecer, uma espécie de instância de supervisão.

Obviamente a estrutura de governança que criamos serve para assegurar que o trabalho seja feito com base na ciência e em aspectos técnicos. No novo acordo temos muito mais envolvimento comunitário, de todo modo, o que é ótimo, temos os procuradores e os defensores públicos também no processo.

A imagem [da Renova como preposto da Samarco] é uma coisa, mas o fato é que, como empresa, queremos ver as coisas progredirem.

Não posso falar pela Vale, mas a BHP quer que se tomem as melhores decisões para remediar o que precisa ser remediado, usando ciência para tomar as decisões, e para compensar o que precisa ser compensado. Não se trata de compensar só por compensar, e depois ver as vidas das pessoas arruinadas depois.

O novo e o velho Bento

Cabe à comunidade e ao município [Mariana] decidir o que querem fazer [com o velho Bento]. Há obviamente questões de segurança no local impactado pelos rejeitos. Se for um memorial, seria bom para a comunidade, mas precisamos avaliar os riscos em termos de estabilidade daquelas construções. Odiaria que as pessoas façam daquilo um lugar para visitar e depois um teto cair e ferir ou matar alguém. Reconheço também que há um cemitério lá, importante para todo mundo visitar os entes queridos que morreram. A questão para mim é garantir que seja seguro.

A Renova está falando em 22 a 24 meses [para construir o novo Bento]. Estão concentrados em fazer a área central primeiro, a infraestrutura, o centro da cidade, e o projeto de arquitetura de cada casa ainda tem de ser aprovado pelo município.

Volta da Samarco

Entendemos que a Samarco é uma organização muito importante para a região de Mariana. Houve várias reuniões comunitárias em favor do retorno da Samarco. Ainda há muitos passos pela frente, licenças, permissões. Parte de minha incompreensão do processo é que sempre há mais uma aprovação [a obter]. A Samarco está tirando a licença de operação, o que deve acontecer até o ano que vem.

Em paralelo ao processo de licença, algum trabalho de preparação tem de ser realizado, algumas questões legais a serem resolvidas com o Ministério Público. Vai ser uma operação de baixa produção por vários anos, portanto a viabilidade será muito diferente do que era antes de ser paralisada.

Assim que se chegar perto de ter a licença de operação aprovada e do trabalho de preparação na nova cava de rejeitos, ainda seria preciso realizar todo o recrutamento, treinamento, assim como transferir as plantas de filtração desde Ubu [em Anchieta, ES], parte do novo projeto da Samarco –separar as areias do lodo nas instalações de rejeitos, de modo a ter mais capacidade.

Viabilidade econômica

Primeiro, temos de trabalhar na estruturação da dívida, de modo a assegurar que a Samarco tenha viabilidade econômica de longo prazo. Estamos concentrados na retomada tanto quanto a Vale, mas temos de alinhar todos os pontos: tem de fazer sentido do ponto de vista de segurança, a comunidade querer, contar com as licenças e ser econômico –se não for, trabalharemos para tornar econômico. Queremos ver a Samarco recomeçar em algum ponto.

Sociedade com a Vale

Certo ou errado, em nenhuma das nossas joint ventures no mundo discutimos informação comercial confidencial. Nosso foco é trabalhar com a Vale pela retomada, e em fazer isso segura e economicamente.

Antes de mais nada, o foco foi sempre na remediação e na compensação. A Samarco podia esperar enquanto isso acontecia. Agora, retomada é algo em que se pode pensar. Não me parece necessariamente certo ver a mineração acontecendo e Bento não acontecendo. Isso é muito importante para nós.

Burocracia

Todo país tem algum nível de processos [burocráticos], e esses processos são adotados em certa altura por alguma razão. A frustração de não ver as coisas andarem mais depressa vem em parte de não entendermos esses processos. Em outros países conhecemos melhor e, portanto, podemos nos antecipar. Estamos um pouco desapontados com a velocidade das coisas, mas para a maioria das pessoas é normal.

Até mesmo para coletar amostras de peixes [do mar] tem havido restrições. Não podemos colher amostras para testar se os peixes estão OK e dar confiança às pessoas. Não entendemos por quê. É uma das coisas do programa que poderia andar bem mais depressa. Porque os pescadores não podem pescar. Eles e nós ficamos tentando entender por que não. A informação que temos hoje não indica muita preocupação, mas sempre há algum tipo de restrição.

Classificação Indicativa: Livre

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