Entrevista

Presidente do Sistema Faeb/Senar comenta Plano Safra 2021/2022: “os recursos também foram para quem mais precisa”

Divulgação
Nesta entrevista, Humberto Miranda fala sobre a importância de parte desse montante chegar até os cerca de 700 mil pessoas que se declaram agricultores na Bahia  |   Bnews - Divulgação Divulgação

Publicado em 11/07/2021, às 09h37   Nilson Marinho e Samuel Barbosa


FacebookTwitterWhatsApp

O Governo Federal lançou, no mês passado, o Plano Safra 2021/2022, são R$ 251,22 bilhões para apoiar a produção agropecuária nacional, um aumento de R$ 14,9 bilhões (6,3%) em relação ao plano anterior. Os financiamentos já estão disponíveis desde o dia 1º deste mês e podem ser solicitados até o dia 30 de junho de 2022. 

Nesta entrevista, o presidente do Sistema Faeb/Senar, Humberto Miranda, fala sobre a importância de parte desse montante chegar até as 700 mil pessoas que se declaram agricultores na Bahia — sendo 90% deles pequenos e médios produtores —, num momento em que o estado apresenta números positivos, seguindo em direção ao protagonismo nacional.

BNews: O governo federal lançou, no mês passado, o Plano Safra que equivale a 2021/2022, são R$ 251 bilhões, montante que é superior ao do ano passado. O senhor prevê quanto desse valor será disponibilizado para os agricultores da Bahia?

  • Humberto Miranda: É, realmente, o volume de recurso foi aquele mesmo que você falou: R$ 251 bilhões, 6.3% maior que o ano passado. Outra boa notícia é que os recursos também foram para quem mais precisa, que são os pequenos e médios produtores. Houve um aumento de 19% só para o Pronaf, que é a linha de crédito que atende mais os pequenos e médios produtores, então, isso também é muito interessante. Nós temos mais de 700 mil produtores e a grande maioria desses produtores são pequenos e médios. Então, para a Bahia é muito bom. O Pronampe tem uma linha de crédito que atende muito aos médios produtores e que aumentou 2.5%. A outra linha de crédito é para armazenagem, criação de armazéns e armazenagem de produtos colhidos. Isso atende muito a gente na região oeste. A produção tem batido recorde ano a ano, e a gente não tem conseguido armazém suficiente para os produtos, que ficam armazenados em bags, que são estruturas de borracha a céu aberto, no meio do campo, às vezes, dentro da própria fazenda. Não temos uma capacidade de galpões suficientes para armazenar esses produtos. O que nós não podemos afirmar é quanto desse recurso vem para a Bahia, já que a demanda do recurso é quem poderá abrir mais ou menos, quanto mais os produtores estão organizados, estão acessando o crédito junto aos bancos e as redes bancárias oficiais. Daqui até junho de 2022, os produtores rurais baianos e do Brasil vão estar aptos a encaminhar propostas para ocupar os agentes financeiros e, consequentemente, gerar recursos para o plantio. Não só para o plantio, mas é bom lembrar que tem recursos para investimento de estruturas nas propriedades, seja com estrutura física, como construir galpões, currais, cercas, preparo de solo e reflorestamento de áreas... Então, o plano foi bem diverso e teve a participação direta do setor produtivo através da ministra Tereza Cristina e da CNA, que é quem representa os produtores rurais brasileiros a nível nacional. 

BNews:A gente sabe que muitos agricultores foram impactados devido à pandemia, os preços dos produtos ficaram elevados. Houve, inclusive, a realocação dos recursos do Governo federal para combater a Covid-19, o senhor acha que as taxas são justas para o agricultor investir e custear a produção?

  • Humberto Miranda: Juros no Brasil é sempre uma briga eterna, nós gostaríamos de ter taxas até mais baratas do que as do ano passado, que girou em torno de 5% a 6%, neste ano, já se fala até em 7,5% a 8,5%. Algumas taxas para empreendimentos maiores de grandes produtores, o do Pronaf, por exemplo, ficou entre 3% a 4,5%, mas, infelizmente, a gente sabe que as taxas de juros variam de acordo com o mercado, a questão do câmbio tem interferência nisso, a inflação tem interferência também, assim como a taxa Selic, são fatores de fora do mundo agropecuário, mas que interferem diretamente. Realmente, as taxas aumentaram em relação ao ano anterior em virtude dessa variação que houve na taxa Selic e na variação cambial também. 

BNews: O senhor prevê números positivos para  a próxima safra aqui na Bahia?

  • Humberto Miranda: Sem dúvidas, a gente tem uma expectativa pra esse ano de 2021, tem uma previsão de aumento na produção de grãos, batemos dez milhões de toneladas no ano passado, achamos que tivéssemos chegado ao limite. Neste ano, a gente já está com previsão de aumento de 6% em cima do que foi colhido no ano passado. A Bahia está espetacular e, ano a ano, vem batendo recordes de produção, e não é apenas em grãos. Neste primeiro semestre, aumentamos também mais de 17% na produção de fruticultura. Na exportação batemos recorde na produção de ovos no primeiro trimestre deste ano. Batemos recorde também no abate de frango no primeiro trimestre. A Bahia vai se reinventando, diversificando, acho que o grande ganho hoje da agropecuária baiana é essa diversidade. Não dependemos mais do oeste, que é o grande propulsor da economia rural da Bahia, isso é fato. A soja, algodão, milho, os produtores da região oeste ainda são grandes puxadores da economia baiana, mas a Bahia tem uma diversidade de produção fantástica. A fruticultura vem crescendo absurdamente em quase todas as regiões do estado, até no semiárido a gente tem muita fruticultura, a exemplo de Juazeiro, Chapada Diamantina, extremo-sul, e, também, na região oeste, que está chegando muito forte. Com essa diversidade, a Bahia vai perdendo um pouco essa dependência de só produzir grãos, e isso é muito bom porque dá uma sustentabilidade à economia rural. Quando tiver problema numa estrutura, as outras se sustentarão com produções maiores e melhores, e, consequentemente, não deixará que a economia do estado sofra.

BNews: A fruticultura seria a nova aposta da Bahia?

  • Humberto Miranda: Já não é nem mais uma nova aposta, a fruticultura já é uma realidade. O primeiro produto da balança comercial baiana, do agronegócio, de exportação, são grãos, que a gente exporta muito pra China e países asiáticos, depois vem os produtos florestais que temos em grande escala lá no extremo-sul , são os dois produtos que tem maior peso na exportação baiana, depois disso, vem alguns outros produtos como derivados da soja. O cacau ainda tem uma importância significativa na exportação, aí vem a fruticultura. Hoje, a gente coloca a fruticultura nos Estados Unidos, nos países da Europa, abastecemos os principais mercados brasileiros. Somos o segundo produtor de manga no Brasil. Temos morango na Chapada Diamantina, com um projeto muito bacana de integração, onde você tem os grandes produtores e uma centena de pequenos que têm produção da fruta até no fundo do quintal, mas que conseguem colocar no mercado junto com os produtos dos grandes produtores. É um modelo de integração onde todos ganham coletivamente. Estamos começando a produzir trigo na região oeste, que é uma coisa que o Brasil importa da Argentina, e eu não tenho nenhuma dúvida que seremos um produtor significativo em pouco tempo, até porque já está se instalando na região uma indústria para beneficiamento do trigo. A gente está falando de cultura de clima temperado, de um clima que não é o nosso, principalmente da Bahia, mas, mesmo assim, com a tecnologia, inovação, conhecimento e pesquisa, conseguimos técnicas que podem nos levar a produzir aqui, na Bahia, de uma forma competitiva e até com melhor qualidade.

BNews: Sobre a questão da logística e escoamento da produção, qual o principal gargalo que a gente precisa resolver com urgência para dar continuidade a esses números positivos?

  • Humberto Miranda: Eu tenho dito em alguns lugares e que cai bem para o setor agropecuário, nem tudo são flores. A gente vê que mesmo na pandemia o setor continuou trabalhando, continuou gerando emprego. Aumentamos as exportações, o setor agropecuário é responsável por mais de 50% das exportações, no primeiro trimestre do ano passado, batemos 3.8% do PIB. Neste primeiro trimestre de 2021, passamos de 25% do PIB , tudo vem crescendo... Temos problemas seríssimos de infraestrutura e coisas básicas, não é só estradas horrorosas e que não conseguem fazer com que nossos produtos cheguem com qualidade, seja em Salvador, para colocar no mercado, ou em outros estados, nos portos e aeroportos. Temos problemas numa malha ferroviária que praticamente acabou dentro do estado, para nossa felicidade, o governo está investindo na FIOL (Ferrovia de Integração Oeste – Leste) que vem nessa perspectiva de abrir uma nova opção de infraestrutura de transporte dentro do estado. Mas também nos faltam coisas simples, como energia elétrica. Aqui, no semiárido, onde o pequeno produtor está produzindo leite, o ‘cara’ quer colocar uma ordenha mecânica ou uma bomba em um poço artesiano, mas não tem capacidade de energia para isso. A energia não suporta que ele coloque uma bomba num poço artesiano para fazer uma pequena irrigação, isso é um absurdo e chega ao ponto da gente perder fábricas na região oeste, que querem se instalar, mas não conseguem em virtude de não ter energia suficiente. Um outro problema seríssimo nos dias de hoje é a questão da conectividade, hoje, todo mundo tem um celular, tem mais celular no Brasil do que pessoas, e o celular se transformou no meio de conhecimento. Temos no Senar cursos a distância em que as pessoas conseguem, através do celular, acesso à qualificação, treinamentos do setor agropecuário, até pra dar igualdade a todo mundo, oportunidade de trabalho, para se inserir no mercado. É um problema tão sério quanto o da segurança no campo, não temos segurança, muitas famílias estão saindo do campo porque têm medo de morar na zona rural, medo de ficar na fazenda por causa de assaltos, roubos e sequestros. Todos os dias, acontecem roubos de animais, é diário, recebemos queixas de roubo todos os dias. E também tem a segurança jurídica, as pessoas, às vezes, tem uma propriedade que veio de seus avós, passou para seus pais, e uma nova modificação no Congresso Nacional diz que aquela terra é indígena, de origem quilombola, isso é muito ruim, o ‘cara’ tá ali há 30, 40, 50 anos e um decreto diz que aquela terra não é mais dele. É preciso dar um ponto final nisso. O Brasil tem mais de 500 anos e não dá pra criar normas e leis a todo momento. Nós também não temos assistência técnica para o produtor rural, a empresa pública que tínhamos a EBDA foi extinta, hoje, os pequenos produtores não têm acesso a um agrônomo, um veterinário, a informação, assistência para melhorar sua produção, isso é muito ruim porque  não dá o acesso a esses produtores para melhorar sua condição de produção e sua atividade agropecuária.


BNews: Esses gargalos já foram apresentados à ministra Tereza, e ela de alguma forma foi sensível a esses problemas aqui do nosso estado?

  • Humberto Miranda: A ministra é uma pessoa do setor, então,  conhece muito de perto todos esses problemas, participou da discussão do plano safra, discute políticas públicas do Brasil junto com a Frente Parlamentar todos os dias. Muitos desses problemas de infraestrutura são problemas de conhecimento amplo de vários governos. Muitos desses problemas são de solução estadual, como questão da energia, infraestrutura e conectividade, são problemas nossos que tem que ser resolvido em casa. O problema da assistência técnica precisa ser dividido inclusive com os municípios, a organização social precisa começar da base, inclusive a sociedade civil como um todo.

BNews: Sobre a retomada da economia...

  • Humberto Miranda: A Bahia continua crescendo no setor agropecuário e tem chegado investimentos importantes, nós temos a nova fronteira agrícola da Bahia que começa na região de Irecê a Barra de São Francisco. Primeiro, que tem uma obra de infraestrutura muito importante que está sendo feita lá, a ponte que liga Xique-Xique a Barra, isso vai encurtar o caminho do oeste da Bahia, ou seja, a vinda da soja, algodão, milho, das coisas daquela região para o porto, aeroporto da capital. Essa obra vai interferir positivamente. A região de Barra do São Francisco vai se tornar o novo polo de desenvolvimento da área da agropecuária baiana porque está chegando muitos empresários de Pernambuco, Minas Gerais para plantar cana, ali vai se transformar no novo polo sucroalcooleiro para produção de açúcar, etanol e grãos. A gente tem projetos de fruticultura se espalhando da região oeste até a região da Chapada Diamantina. Tem muita coisa nova chegando na Bahia, mas é preciso investir em alguns pontos, como educação no campo, infraestrutura e conectividade, além da assistência técnica.

Classificação Indicativa: Livre

FacebookTwitterWhatsApp