Esporte

Clube afasta treinador de ginástica após relatos de abuso sexual

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Segundo reportagem do Fantástico, 42 pessoas disseram ter sido vítimas de abuso de ex-treinador  |   Bnews - Divulgação CBG/Divulgação

Publicado em 30/04/2018, às 17h49   Folhapress


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O ex-técnico da seleção brasileira de ginástica Fernando de Carvalho Lopes foi afastado nesta segunda-feira (30) de todas as atividades no Clube de Campo Mesc, de São Bernardo do Campo, após reportagem veiculada pelo Fantástico, da Globo, no domingo (29), sobre as acusações de abuso sexual feitas contra ele.

Em julho de 2016, a menos de um mês da Olimpíada do Rio, a CBG (Confederação Brasileira de Ginástica) havia desligado o técnico, então treinador do ginasta Diego Hypolito na seleção brasileira masculina de ginástica artística.

Lopes foi acusado pelos pais de um ginasta menor de idade que havia trabalhado com ele em São Bernardo do Campo. De acordo com a denúncia, o técnico teria cometido mais de um abuso contra o jovem. Ele nega todas as acusações.

Segundo o Fantástico, 42 pessoas disseram ter sido vítimas de abuso físico, moral ou sexual pelo ex-treinador. A reportagem partiu de um comentário no Facebook feito pelo ginasta Petrix Barbosa, ouro nos Jogos Pan-Americanos de Guadalajara, em 2011, indicando a ocorrência de casos de abuso na ginástica brasileira.

De acordo com a matéria, os casos ocorreram ao longo de 15 anos, entre 2001 e 2016, a maior parte deles no clube Mesc, onde Lopes trabalhava.

Petrix relatou ter sido vítima de tentativas de abuso quando tinha dez anos. Segundo o ginasta, que afirmou ser um dos que mais sofreram com as investidas de Lopes, o técnico tomava banho com ele e chegava a dormir na mesma cama. “Já acordei com ele, não sei quantas vezes, com a mão na minha calça e eu conseguia tirar e dormir porque eu não ficava parado."

“Toda vez que eu ia dormir, na casa dele ou no hotel, ele queria dormir comigo na cama, mas aí eu ia dormir no chão. E ele falava: ‘não, fulano vai para o chão e o Petrix vai dormir na cama comigo’. Todo mundo me olhava, e às vezes tentavam me tirar, mas ele não deixava. Era uma coisa comigo, e eu ficava sufocado, sufocado, sufocado”, contou.

Petrix disse também ter sido prejudicado pelo técnico quando este passou a fazer parte da comissão técnica da seleção brasileira masculina de ginástica.

“Ele já me disse pessoalmente que, nas reuniões de treinadores, ele era o primeiro a não me defender ou votar por mim. Ele já chegou, meses antes da Olimpíada, a dizer que me via abandonado (nos treinos). Só para me abalar antes da Olimpíada. Que me via no treino sozinho e que tinha dó de mim. E foi aí que, com 25 anos, eu falei pela primeira vez que não precisava que ninguém sentisse dó de mim. Eu disse que era eu que tinha de ter dó dele, porque ele sabia o que tinha feito quando eu era pequeno, com outras crianças.”

Segundo depoimentos de outros atletas à reportagem, que preferiram não se identificar, o treinador pedia constantemente para ver os órgãos genitais dos menores e tocava em suas partes íntimas, alegando querer saber o nível de desenvolvimento de hormônios para poder estabelecer os treinos dos ginastas.

Algumas vítimas também afirmaram ter sofrido bullying, relacionado aos casos de abuso, quando se mudaram para o centro de treinamento de São Caetano do Sul. O hoje coordenador técnico de ginástica do Brasil, Marcos Goto, foi apontado por duas delas como um dos que faziam piadas sobre o caso.

De acordo com a reportagem, a investigação não avançou até o momento e a acusação na Justiça ainda não foi formalizada. Segundo a Globo, até o momento foram ouvidas 15 testemunhas e ao menos outras 13 pessoas citadas no processo ainda deverão dar depoimento.

A ginasta americana Aly  Raisman, que está  processando o Comitê Olímpico dos Estados Unidos e a Federação de Ginástica do país por abusos sexuais cometidos pelo médico Larry Nassar contra ao menos 265 atletas, fez um post no Twitter em apoio às vítimas e demandando atitudes de órgãos internacionais do esporte.

"Devastada de ouvir sobre os muitos ginastas no Brasil que sofreram abusos. Sobreviventes devem ser ouvidos e a justiça deve ser cumprida. Como deveria ser em todos os lugares. Mundo da ginástica, eu repito, grito o mais alto que puder, ISSO É MAIOR QUE NASSAR. FIG (Federação Internacional de Ginástica) e IOC (Comitê Olímpico Internacional), ajam agora. Não podemos mais esperar", disse na rede social.

OUTRO LADO

Por telefone, o ex-treinador Fernando de Carvalho Lopes negou ao Fantástico as acusações e disse estar com a consciência limpa.

“Nunca fui um técnico legal. Eu fui um técnico sempre muito rigoroso, às vezes até demais. E acho que, por outro lado, eu tive um problema de ser um cara que muitas vezes misturei, de achar que eu era mais do que um técnico. Acho que eu podia ser um amigo, podia ser um pai, que podia ser qualquer outra coisa. Então, isso talvez tenha dado uma margem de interpretação errada para cada um deles. Mas a ponto desse tipo de acusação, eu não tenho o que falar, acho que eles vão ter que provar”, disse.

Em nota, a administração do clube Mesc afirmou nunca ter recebido reclamação ou denúncia relacionada à atuação ou comportamento inadequado de Fernando de Carvalho Lopes durante os 20 anos de sua colaboração com o clube.

O clube informou também que, há dois anos, quando surgiram as primeiras acusações, o treinador foi transferido para serviços administrativos, não mantendo desde então qualquer contato direto com atletas e alunos da ginástica ou de qualquer outra modalidade esportiva.

Procurada pela Folha, a Confederação Brasileira de Ginástica ainda não se manifestou sobre o caso.

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