Política

TSE vê conexões de disparos em massa, mas cassação de chapa de Bolsonaro é considerada difícil

Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Bnews - Divulgação Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Publicado em 10/10/2021, às 14h04   Patrícia Campos Mello/Folhapress


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Integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) veem conexões entre disparos em massa de WhatsApp durante a campanha de 2018 e a milícia digital ligada ao governo federal, mas a cassação da chapa de Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão é considerada pouco provável.

Em 16 de setembro, o ministro Alexandre de Moraes compartilhou provas reunidas nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos do Supremo Tribunal Federal (STF), que investigavam ataques coordenados contra integrantes do Supremo e financiamento de ações contra as instituições. O inquérito dos atos antidemocráticos foi extinto em julho, dando lugar a uma nova investigação sobre milícias digitais.

Moraes atendeu ao pedido do ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-geral eleitoral que é o relator das duas ações de investigação judicial eleitoral (Aije) sobre o uso de disparos em massa de WhatsApp para distribuir notícias falsas em favor do então candidato Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018.

A investigação do TSE foi iniciada após o jornal Folha de S.Paulo revelar a existência de um esquema bancado por empresários apoiadores de Bolsonaro, com uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir disparos em massa. Caso comprovados pela Justiça Eleitoral, esses atos relatados nas reportagens poderiam configurar abuso de poder econômico e uso indevido de meio de comunicação social, que podem levar à cassação da chapa e inelegibilidade de Bolsonaro e Mourão.

A maioria das provas provenientes dos inquéritos do STF se refere ao período pós-eleição. Mas, no material compartilhado com o TSE no mês passado, há evidências que indicam conexões entre o esquema atual de milícias digitais ligadas ao governo Bolsonaro e o dos disparos em massa na campanha eleitoral.

Na percepção de integrantes da corte, não seria difícil demonstrar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação, dois elementos necessários para uma decisão a favor da cassação da chapa. Mas isso não basta, pois seria preciso demonstrar que houve conduta de tal maneira grave que pode ter interferido no resultado.

Leia mais: Troca de corregedor-geral da Justiça Eleitoral não deve impactar investigações sobre chapa Bolsonaro-Mourão

Dado que seria difícil demonstrar que o uso dos disparos em massa teve impacto suficiente para influenciar nas eleições, a possibilidade de cassação da chapa é considerada baixa. Além disso, na visão de integrantes da corte, não há condições políticas para uma decisão como essa.

Um cenário também em discussão é a possível divisibilidade da chapa. A tese foi tentada pela defesa do então presidente Michel Temer em 2017, no julgamento da ação eleitoral que pedia a cassação da chapa Dilma-Temer por suposto abuso de poder político e econômico na campanha de 2014.

Historicamente, quando há irregularidades em uma campanha, os dois integrantes da chapa sofrem as sanções. Mas a defesa de Temer argumentou pela separação, que seria inédita.

A chapa acabou absolvida, então os ministros não chegaram a decidir sobre a divisibilidade.

Na visão de integrantes do TSE, está na mesa a possibilidade de dividir a chapa -uma eventual cassação, nesse caso, afetaria apenas o presidente Bolsonaro, e não Mourão, com o argumento de que o vice não sabia das irregularidades.

Advogados ouvidos pela Folha, no entanto, acham muito improvável que a corte julgue as Aijes procedentes e que divida a chapa, cassando apenas Bolsonaro. Segundo eles, não há precedentes para isso e é praticamente impossível demonstrar que o possível abuso de poder econômico teria beneficiado apenas Bolsonaro, e não Mourão.

O ministro Salomão, relator das ações, está pressionando para que elas sejam pautadas para julgamento antes do fim de seu mandato na corregedoria, em 29 de outubro. Nessa data, quem assume a relatoria é o novo corregedor-geral eleitoral, Mauro Campbell Marques.

Salomão deve anunciar no dia 15 de outubro que as ações estão prontas para serem julgadas pelo plenário do TSE. Mas a data do julgamento depende do presidente da corte, Luis Roberto Barroso. Na visão de alguns assessores, Barroso tende a pautar o julgamento, e não adiar, considerando que as ações tramitam há quase três anos e já passaram por três relatores.

No entanto, uma possibilidade seria o julgamento começar e algum dos ministros pedir vista. Dessa maneira, a ação ficaria em suspenso, para que Bolsonaro seja mantido "na rédea curta".

Ainda assim, a saída mais cogitada é usar o inquérito administrativo do TSE sobre fraude eleitoral para a mesma finalidade de manter os arroubos autoritários de Bolsonaro sob controle.

O inquérito administrativo foi aberto em agosto por sugestão de Salomão, para apurar a conduta de Bolsonaro, que vem afirmando que o sistema eleitoral é vulnerável a fraudes e minando a confiança na integridade do processo. O inquérito administrativo tem o objetivo de investigar redes que distribuem notícias falsas sobre o processo eleitoral e possível propaganda eleitoral antecipada e abuso de autoridade e poder econômico por parte de Bolsonaro. Também examinará as lives do presidente e uso da TV Brasil.

O plano é manter diligências no inquérito ao longo de 2022. Em última instância, a investigação poderia levar o Ministério Público ou algum dos partidos políticos a entrar com uma Aije, que poderia resultar na inelegibilidade de Bolsonaro.

AS AÇÕES NO TSE

Aije 1771-28

Foi apresentada pela coligação O Povo Feliz de Novo (PT, PC do B e PROS) e questiona a contratação, por pessoas jurídicas, entre elas, a Havan, das empresas Quickmobile, Yacows, Croc Services e SMSMarket, responsáveis pelo disparo em massa, via WhatsApp, de mensagens contra o PT e a coligação O Povo Feliz de Novo.

A ação aponta ainda a existência de uma "estrutura piramidal de comunicação" para disseminar desinformação via grupos originários da campanha dos representados ou grupos derivados de WhatsApp. A Aije, em fase de alegações finais, teve reaberta a fase de instrução em 10 de outubro de 2019.

Aije 1968-80

Foi ajuizada pela coligação O Povo Feliz de Novo e apresenta como fato a ser investigado a contratação da Yacows, Kiplix e AM4 Informática para a prestação de serviço de disparos em massa de mensagens de cunho eleitoral, pelo WhatsApp.

A coligação aponta uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e garantir disparos em massa. Ainda segundo a ação, o suposto uso de robôs deve ser investigado. A Aije ainda cita que algumas das agências contratadas foram subcontratadas pela AM4. A ação está em fase de alegações finais. A reabertura da instrução foi determinada em 15 de outubro de 2019.

Classificação Indicativa: Livre

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