Política

CPIs não saem do papel e viram 'holofote' para parlamentares

Publicado em 14/03/2016, às 16h26   Juliana Nobre e Rodrigo Daniel Silva


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Um instrumento do Legislativo criado para ouvir depoimentos e obter informações importantes de determinado fato, as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) viraram vitrine para legisladores no Brasil. Na Bahia, sempre que surge um caso polêmico, é dito e pronto, logo aparece um deputado ou vereador que sugere a instalação de uma CPI para investigar o episódio na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) ou uma Comissão Especial de Inquérito (CEI), na Câmara Municipal. Mas, é só a poeira abaixar que a criação da comissão é engavetada. Em tempos de crises econômica e política, as comissões são alardeadas, porém, muitas vezes, não chegam a ser instaladas. 

Em um levantamento realizado pelo Bocão News, entre os anos de 2006 e 2015, foram constatadas 13 CPIs e CEIs que foram sugeridas, mas nunca saíram do papel. A explicação é uma só: faltam assinaturas suficientes para instalação ou o presidente da Casa de Leis, simplesmente, indefere.

Em 2008, a Câmara de Salvador quis investigar as irregularidades na Superintendência de Engenharia de Tráfego (SET) – hoje, Transalvador –, que vieram à tona durante a greve dos agentes de trânsito. Os vereadores conseguiram as assinaturas, mas o presidente, à época, Valdenor Cardoso (PSL) não aceitou o pedido.

No mesmo ano, uma comissão gerou polêmica. Vereadores soteropolitanos queriam investigar a morte do encarregado do setor financeiro do gabinete da Secretaria Municipal de Saúde, Neilton Souto da Silveira, encontrado sem vida no terraço interno do órgão, um ano antes. O caso, até hoje, não tem decisão da Justiça. Há suspeitas de queima de arquivo, com indícios de desvios de verbas públicas. A iniciativa não teve assinaturas suficientes.

O metrô de Salvador também chegou a ser alvo de pedidos de apuração, mas também não saíram do papel. A obra, que perdura há 16 anos, seria investigada em todas as gestões, incluindo os ex-prefeitos Antônio Imbassahy (PSDB) e João Henrique (PR), que seriam chamados para depor, bem como o atual prefeito, ACM Neto (DEM). Contudo, o pedido foi arquivado em abril do ano passado. Os edis iriam verificar o superfaturamento da obra e o envolvimento de construtoras.

Um colegiado com o mesmo tema foi proposto na Assembleia Legislativa da Bahia em 2006, mas não foi levado à diante. À época, o deputado Paulo Rangel (PT) era relator. Em conversa com o Bocão News, o parlamentar afirmou que a CPI não foi instaurada, pois o equipamento não era administrado pelo governo do estado. “Na época falei com Elmar Nascimento [deputado] que não tinha fundamento porque não era obra do governo estadual. Então chegamos a conclusão de que não renderia”, explicou o petista. Desde 2013, o equipamento é administrado pelo Governo do Estado.

Até o Carnaval caiu nas artimanhas dos vereadores, em 2015. Uma suposta compra de vagas nas filas dos desfiles da festa momesca foi alvo da fúria do edil Arnando Lessa (PT). Para ele, existia a suspeita de que entidades carnavalescas estariam comercializando espaços públicos e o Conselho Municipal do Carnaval (Comcar) estaria sendo conivente. “Precisava de 29 assinaturas, mas não consegui. É um tema muito delicado que envolve interesses de muitas pessoas”, disse. Questionado se voltaria com o tema nessa legislatura, o petista disse que não. “Era um tema específico do ano passado. Para os próximos anos não vale mais. Por conta da crise, muito blocos deixaram de desfilar, então a fila ficou mais vazia”.

Se por um lado, as comissões não saem do papel por falta de assinatura, por outro, quando saem, ainda passam por avaliação do presidente da Casa. Este foi o caso da investigação sobre as obras atrasadas na Bahia, durante gestão do governador Jaques Wagner. Deputados da oposição conseguiram o apoio dos 21 parlamentares necessários para a chamada "CPI da Wagareza", mas o pedido foi arquivado pelo presidente Marcelo Nilo (PSL). Ao Bocão News, o proponente, deputado Luciano Simões Filho (PMDB), disse que há duas dificuldades: “a primeira é realmente conseguir as assinaturas, mas depois ainda tem que passar pelo crivo do presidente. Como ele [Marcelo Nilo] é governista, jamais vai passar uma comissão da oposição”, afirmou. Marcelo Nilo rejeitou a proposta alegando que não havia "fato determinado e interesse público".

Poder legal

Se o papel do legislador é criar leis, as comissões parlamentares concedem a ele um outro papel. Apesar disso, o parlamentar não tem autoridade judicial e algumas ações são restritas. Quem explica o que pode e o que não pode dentro de uma CPI é o procurador do Estado e professor de Direito Púbico, Miguel Calmon. “O parlamentar pode convocar testemunhas, que são obrigadas a comparecer às audiências, ter acessos a dados judiciais, com autorização da Justiça. Mas não pode prender, nem ordenar busca e apreensão e interceptação telefônica. Isso só pode a autoridade judicial. A CPI não pode constranger aquele que está sendo investigado, que pode é obrigar a comparecer audiência. Agora, geralmente vai e fica em silêncio”, explica.

Calmon ressalta ainda que há excessos na condução de algumas CPIs. “Não deixa de ser um instrumento político. Mas tem que ressaltar que a CPI não pune ninguém. O resultado é um relatório que é encaminhado para autoridades competentes, como o Ministério Público ou o Conselho de Ética da Casa. Agora, há alguns excessos em determinadas CPIs, que constrangem os investigados e praticam atos fora das suas atribuições”, disse.

Em relação à intervenção dos presidentes das Casas, o procurador explica que as comissões não precisam da autorização do chefe do poder Legislativo. “Não precisa de autorização do presidente para ser instalada. Agora, tem que atender aos requisitos, que é ter um 1/3 de assinaturas dos deputados e ter um fato alegado determinado e de interesse público. A CPI terá um tempo estabelecido que pode ser renovado. Mas não pode passar para outra legislatura”, disse.

Por outro lado, quando as comissões de inquérito são instaladas, um relatório final é elaborado. Ele deve conter soluções e ser disponibilizado para a sociedade. 

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Classificação Indicativa: Livre

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