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Busca de 3ª via une nos bastidores ex-miss e raposas políticas que querem opção a Bolsonaro e Lula

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Publicado em 22/08/2021, às 14h25   Joelmir Tavares / Folhapress


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Não faltam pré-candidatos (pelo menos dez já foram lançados) nem dirigentes partidários na disputa por holofotes em que se transformou a saga da terceira via para as eleições presidenciais de 2022.

Mas a busca de uma opção para encarar Jair Bolsonaro (sem partido) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que seja ao mesmo tempo competitiva e capaz de unir setores que se denominam de centro movimenta também, nos bastidores, uma rede de articulação variada, influente e, mais do que nunca, ansiosa.

A teia, que ganhou propulsão desde março, com a reabilitação eleitoral de Lula, une raposas políticas que estão afastadas de posições de poder, representantes do empresariado e do mercado financeiro preocupados com a economia e líderes de movimentos da sociedade civil.

São pessoas que se recusam, por motivos variados, a aceitar a polarização mostrada pelas pesquisas de intenção de voto --lideradas pelo petista, seguido pelo atual ocupante do Planalto. Para ter em quem votar no segundo turno, a turma dos inconformados se vale dos canais de pressão que tem à mão.

Na arena de embates predileta de lulistas e bolsonaristas, as redes sociais, o desafio de promover uma alternativa que ainda não tem nome definido nem patamar significativo nas sondagens foi assumido recentemente pela estudante de ciência política Monalisa Carneiro, 30.

Principal rosto do recém-criado Movimento Há um Caminho, a ex-miss Mundo Goiás protagoniza vídeos nos perfis do Instagram, do Twitter e do TikTok. "Nossa pauta é clara: viabilizar a terceira via e conscientizar as pessoas para os prejuízos de uma eleição do Bolsonaro ou do Lula", afirma ela.

Ex-candidata a deputada estadual e vereadora, filiada ao DEM e ex-aluna do curso de novos políticos RenovaBR, Monalisa diz que foi chamada para o movimento por outros jovens aliados da causa. Segundo ela, a iniciativa é financiada por "um grupo de empresários de São Paulo" que não quer aparecer.

João Doria e Eduardo Leite (que disputam as prévias do PSDB), Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), Sergio Moro (sem partido) e Luiz Henrique Mandetta (DEM) são alguns dos presidenciáveis citados nos vídeos da influenciadora, repletos de dancinhas, dublagens, enquetes e desafios típicos das redes.

Monalisa diz que ainda não tem pré-candidato de preferência, que o trabalho não está ligado à sua filiação e que não há favorecimento ao colega de partido Mandetta. "O que buscamos é apresentar os nomes e difundi-los em uma linguagem que todo o mundo possa entender", afirma.

O clamor na sociedade por uma opção fora "dos extremos" é crescente, na visão da ex-miss. Outros perfis, como o Movimento Terceira Via (que não respondeu à reportagem), também surgiram. "Bolsonaro é um lunático que prometeu e não cumpriu. Lula é um ex-presidiário e nos deixou a Dilma [Rousseff]", critica ela.

O Há um Caminho está convocando para a manifestação de 12 de setembro do MBL (Movimento Brasil Livre) e do VPR (Vem Pra Rua) em apoio ao impeachment do presidente e à bandeira da candidatura alternativa. Os grupos esperam que o ato mostre a força da onda "nem nem" (nem um nem outro).

Como esse sentimento não foi demonstrado pelas pesquisas, tornou-se comum ouvir de artífices do caminho do meio os mais variados argumentos para justificar a inexpressão desse polo nos levantamentos. A ordem é jogar luz sobre sinais que evidenciariam o potencial de sucesso.

Entusiastas dizem que não se deve olhar só para as intenções de voto, mas também para as taxas de rejeição (que foram de 59% para Bolsonaro e de 37% para Lula no Datafolha de julho). Lembram também, baseados em pesquisas, que em torno de 50% dos eleitores desejam uma opção além dos dois.

Outras mensagens de conforto, por assim dizer, repetidas por envolvidos no tema vão na linha de que o cenário ficará mais favorável até 2022 --a grande aposta é em uma erosão ainda maior da popularidade de Bolsonaro-- e de que virá a esperada convergência, com a união dos vários nomes em torno de um.

Reflexões do tipo vêm, sobretudo, de gente experiente em eleições, como os ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung (ex-MDB, PSB e PSDB). Todos são consultados por um leque variado de políticos e líderes do setor privado.

Temer chegou ele mesmo a ser cotado como pré-candidato, mas está hoje mais interessado em ajudar a aproximar legendas e fabricar um projeto palatável à elite e ao eleitorado. Há alguns dias, ele falou sobre terceira via em palestra no Oval Table, plataforma com 700 membros, a maioria empresários.
FHC, após ser criticado por tucanos por um encontro com Lula em maio, declarou apoio a Doria nas prévias da sigla.

Ao lado do também ex-presidente José Sarney (MDB), Temer e FHC farão no próximo dia 15 a abertura de um seminário das fundações partidárias de PSDB, MDB, DEM e Cidadania. No pano de fundo do evento "Um novo rumo para o Brasil" está a demanda por uma via além de Bolsonaro e Lula.

"Essa polarização não é boa para o Brasil", diz o ex-deputado federal Marcus Pestana (MG), presidente da fundação do PSDB e um dos organizadores. "O objetivo é trabalhar para preparar o ambiente. Antes da convergência de nomes, é preciso pavimentar o caminho pela convergência de ideias."

Pestana confirma o diagnóstico, colhido pelo jornal Folha de S.Paulo com outros operadores no campo que vai do centro à direita, de que Ciro Gomes é uma opção tratada com ressalvas. Embora consiga patamar até razoável em pesquisas (cravou 9% em um dos cenários do Datafolha), é visto como mais alinhado à esquerda.

"Há com ele, no campo das ideias, divergências substantivas. É questão de visão de país. Mas queremos manter uma interlocução. Podemos estar aliados em algum momento", comenta o tucano. Avaliações à parte, Ciro faz acenos ao centro e abriu guerra simultânea a Lula e Bolsonaro.

Hartung, que até meados do ano era articulador da pré-campanha de Luciano Huck, manteve a rotina de diálogos em prol da terceira via mesmo após o apresentador desistir da campanha para continuar na TV Globo, o que frustrou a parcela do universo político que enxergava nele uma salvação.
Convidado frequente para conversas fechadas sobre o quadro eleitoral, o ex-governador afirma ser positivo que o assunto atraia atenção.

"Trabalhar por alternativas é saudável para a democracia, algo a ser valorizado. Ajuda o processo. É bom que o país tenha mais alternativas do que duas", diz.

"Acho importante que esse movimento traga ao cerne do debate questões programáticas e caminhos para os problemas que o Brasil precisa enfrentar há décadas", segue Hartung, que, à frente da Ibá (entidade da cadeia produtiva de árvores, papel e celulose), fala com industriais e investidores.

Também com trânsito privilegiado nos universos político e empresarial, o cientista político Luiz Felipe d'Avila é outro ativo na construção de pontes entre o PIB paulista, partidos e formadores de opinião. Organiza encontros mistos (virtuais e presenciais) e faz debates entre presidenciáveis.

"Sou um arquiteto do centro", resume ele. "Não tenho preferência por um ou outro. Meu objetivo é edificar uma candidatura para vencer Lula e Bolsonaro. Não chamo de terceira via, mas de única."

Ex-filiado ao PSDB (disputou as prévias da sigla  em 2018 para governador, vencidas por Doria) e genro do empresário Abilio Diniz, d'Avila faz as costuras valendo-se de sua agenda de contatos e do trabalho com o CLP (Centro de Liderança Pública), criado e presidido por ele.

A organização, que se define como suprapartidária, defende, por exemplo, a reforma tributária. O fundador diz rejeitar Bolsonaro e Lula por razões parecidas: "Tanto o populismo de esquerda quanto o de direita não entregou os avanços que as pessoas querem, que são emprego, renda, desenvolvimento".

Com o agravamento da crise e o futuro sombrio projetado por economistas e analistas (um misto de crescimento estagnado e inflação acelerada), porta-vozes da área privada favoráveis à terceira via dizem que a chance de ascensão de uma candidatura ganhou fôlego nas últimas semanas.

Embora setores que apoiaram a eleição de Bolsonaro em 2018 se mantenham ao lado do governo, uma parte começa a se descolar. O manifesto no início do mês em repúdio à ameaça do presidente de não realizar eleições em 2022, endossado por empresários, foi considerado um marco dos novos ares.

"Eleição é um processo de ondas, e está começando a nascer uma nova onda, com esse tiroteio enorme entre as instituições e a constatação de que aquela recuperação prevista já está em risco", afirma George Niemeyer, dono da empresa de comércio exterior Multilink e fundador do fórum Oval Table.

"Alguns [do grupo] me perguntam: 'Está louco de promover debate sobre terceira via? É algo inviável. Você está enfraquecendo o Bolsonaro e, indiretamente, fortalecendo o PT'. Isso é o que eu menos quero! O que defendo é que precisamos abrir uma terceira via para enriquecermos o debate", diz o empresário.

Classificação Indicativa: Livre

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