Política

Bahia: Comissão da Verdade analisa depoimentos de torturados na ditadura militar

Vitor Fernandes
Na Bahia são mais de 125 casos não resolvidos  |   Bnews - Divulgação Vitor Fernandes

Publicado em 22/05/2013, às 06h40   Juliana Costa (Twitter: @julianafrcosta)


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A emoção tomou conta da primeira audiência pública da Comissão Especial da Verdade realizada nesta terça-feira (21) na Assembleia Legislativa da Bahia. Fortes depoimentos dos torturados fizeram os participantes chorarem de indignação. A primeira ação da Comissão, presidida pelo deputado estadual Marcelino Galo (PT), é o encaminhamento de uma resolução que revoga a cassação de deputados estaduais baianos durante o período da ditadura militar.

Lígia Mendes de Carvalho, esposa do ex-deputado estadual Ênio Mendes de Carvalho (PR), cassado em 1964 por falta de decoro ideológico, conta os momentos de tortura psicológica que a família sofreu na época. “Aos 36 anos, Ênio era comunista, socialista e esquerdista. Devido a isso foi cassado por duas vezes. Eles diziam que por ele ser muito inteligente influenciava sete partidos dentro da Assembleia e assim não poderia permanecer”.

O parlamentar foi cassado, recorreu, ganhou por unanimidade, mas novamente não pode retornar às atividades parlamentares. “Vivemos momentos de uma pressão psicológica, morávamos em um apartamento nos Barris e vigiados por um carro de polícia dia e noite. Não podíamos sair. Tivemos que nos mudar para o interior, mas mesmo assim passamos momentos difíceis, pois as pessoas não se aproximavam de nós com medo porque sabiam que éramos perseguidos politicamente” relata a viúva. Mendes ainda foi secretário de Segurança Pública da Bahia do governo Waldir Pires (1987/1989) e morreu aos 83 anos, em 2011.

Em conversa com o Bocão News, Carlos Augusto Marighella - filho de um dos mais conhecidos opositores ao regime militar, o baiano Carlos Marighella – fez duras críticas aos depoimentos do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, chefe de órgão de repressão política durante a ditadura militar. Na última semana, Ustra declarou à Comissão Nacional da Verdade (CNV) que sem a luta dos militares, o Brasil estaria sob uma "ditadura do proletariado", dentre outras afirmações.

“Ustra dirigiu uma operação aqui na Bahia, entre os dias 4 e 7 de julho de 1975, e ordenou a prisão de mais de 300 pessoas, dentre elas, 42, incluive eu, fomos levados para um centro de tortura em Alagoinhas. Por dez dias ficamos encapuzados, sofrendo todo o tipo de violência: choques elétricos e espancamentos. Em um único dia o capuz foi retirado para que pudéssemos ver o rosto da pessoas que coordenada aquela ação. Era o comandante Ustra. Então esse fato é uma prova concreta de que a motivação dos militares não era exatamente de um combate frontal. Esperamos que essa comissão tenha elementos suficientes para levar esse criminoso à cadeia, pois ele participou ativamente e pessoalmente das torturas”.

O representante da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Gilney Viana, declarou que na Bahia são 126 casos não resolvidos. “Eles peitaram o regime e pagaram seu preço. O preço da lista dos mortos desaparecidos, o preço daqueles que ficaram exilados, daqueles que foram banidos, daqueles que ficaram presos como nós, que foram intimados, perseguidos e jogados à clandestinidade”, frisa.

Quem também contou histórias emocionantes foram ex-deputado e jornalista 
Emiliano José (preso político), Paulo Pontes (preso político), Inácio Gomes (advogado de preso políticos) e de Leonia Cunha (familiar de mortos).

De acordo com o presidente da comissão, o colegiado irá analisar os depoimentos, construir um relatório para que sirva de elemento concreto para resgatar a memória da sociedade, bem como contribuir com a comissão nacional.

"A comissão só não tem poder de julgar, mas vamos fazer o possível que a real história dessas pessoas sejam conhecidas, para percebermos o quanto de ruim os militares fizeram para a nossa sociedade. Isso precisa ser falado e vamos resgatar a nossa história", afirma Galo. 

Nota originalmente postada às 16h do dia 21

Classificação Indicativa: Livre

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