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PF chama de 'operação resgate' ação de Wassef e assessores de Bolsonaro para reaver joias

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A investigação mostra que Wassef e assessores se articularam para recuperar o "kit ouro Branco"  |   Bnews - Divulgação Reprodução

Publicado em 12/08/2023, às 11h59   Constança Rezende/ FolhaPress


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A Polícia Federal classificou como "operação resgate" a movimentação sigilosa de alguns dos principais auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para reaver nos Estados Unidos joias que haviam sido vendidas, mas que para autoridades brasileiras pertencem ao patrimônio público.

No dia 15 de março, o TCU (Tribunal de Contas da União) havia determinado que o material fosse devolvido ao governo brasileiro.

Participaram do movimento, segundo a PF, o tenente-coronel do Exército e ex-chefe dos ajudantes de ordem de Bolsonaro, Mauro Cid, o seu assessor Marcelo Câmara, o segundo-tenente Osmar Crivelatti e o advogado Frederick Wassef.

A investigação mostra que eles se articularam para recuperar o "kit ouro Branco", entregue ao ex-presidente em sua visita oficial à Arábia Saudita em outubro de 2019 e incorporado ao seu acervo privado.

O conjunto era composto de um anel, abotoaduras, um rosário islâmico ("masbaha") e um relógio da marca Rolex, produzido em ouro branco e diamantes. Os aliados do ex-presidente teriam dividido a operação em duas etapas, segundo a PF.

O relógio Rolex Day-Date, vendido à empresa Precision Watches, na Pensilvânia, Estados Unidos, foi recuperado no dia 14 de março por Wassef. Ele teria comprado de volta o objeto.

Após o "resgate", o advogado teria retornado com o bem ao Brasil no dia 29 de março e entregue a Mauro Cid quatro dias depois, em São Paulo. O tenente-coronel então retornou a Brasília na mesma data e entregou o relógio a Crivelatti.

A PF identificou registros de interação entre Cid e Wassef para tratar do assunto, apesar de o primeiro ter apagado a maior parte das mensagens.

O órgão confirmou que Wassef embarcou no dia 11 de março de Campinas (SP) para a Flórida.

O restante das joias, segundo a PF, foi recuperado por Cid em 27 de março, durante viagem a Miami.
Em junho de 2022, ele havia visitado o mesmo local para vender (ou expor à venda) o restante dos itens do Kit Ouro Branco, segundo a PF.

Em 15 de março, Cid também conversou com o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten sobre a possibilidade do TCU pedir o retorno do material.

Wajngarten respondeu: "Vão mesmo. Por isso era muito melhor a gente se antecipar". Em seguida, demonstrando contrariedade, ele critica o assessor e o advogado de Bolsonaro: "Mas o gênio do [Marcelo] Câmara + Fred [Wassef] contaminam tudo".

A polícia também achou mensagens que mostraram o nervosismo de Cid e Marcelo Camara ao tentar recuperar o kit.

Chamou atenção da polícia o diálogo trocado no dia 26 de março, em que Cid afirma não estar confiante. Em resposta, Camara diz: "Acredita soldado". Um dia depois, Cid encaminha a mensagem a Crivelatti "Resolvido!", ao que este responde: "Excelente"; "Ihuuuuuu".

Após isso, Cid solicita documentos que comprovariam o registro dos bens no acervo privado do ex-presidente para apresentá-los caso fosse parado em alguma fiscalização no aeroporto.

Após recuperar os bens, segundo a PF, ele retornou imediatamente ao Brasil, chegando na manhã do dia 28 de março em Brasília, quando também repassou o material a Crivelatti.

De acordo com a polícia, "há robustos elementos de prova no sentido que os bens extraviados foram objeto de verdadeira operação resgate, com objetivo de esconder o fato de que haviam sido alienados".

"Cabe salientar que toda a operação foi realizada de forma escamoteada, fato que permitiu aos investigados devolverem os bens sem revelar que todo o material estava fora do país, ao contrário das afirmações prestadas", disse o órgão.

A polícia também relatou que a operação encoberta permitiu que, até o presente momento, as autoridades brasileiras não tivessem conhecimento que os bens foram vendidos no exterior, "descumprindo os normativos legais, com o objetivo de enriquecimento ilícito do ex-presidente Jair Bolsonaro, e posteriormente recuperados para serem devolvidos ao estado brasileiro".
O conjunto foi devolvido em 4 de abril em uma agência da Caixa Econômica Federal em Brasília, conforme determinação do TCU.

Na ocasião, Wajngarten afirmou, em uma rede social, que a "entrega reitera o compromisso da defesa do presidente Bolsonaro de devolver todos os presentes que o TCU solicitar, cumprindo a orientação do ex-mandatário do país, que sempre respeitou a legislação em vigor sobre o assunto".

O presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, afirmou que Bolsonaro não poderia ficar com as joias e que, para um presente ser incorporado ao patrimônio privado de um presidente, deveria ser classificado como item personalíssimo e ser de baixo valor.

A polícia não achou indícios de que um segundo relógio, também vendido para a loja na Pensilvânia em 13 de junho de 2022, tenha sido recuperado pelos investigados.

Anteriormente, um conjunto de itens masculinos da marca Chopard teria sido resgatado de uma loja em Nova York e encaminhado, por meio do serviço de transporte de mercadorias para um endereço na cidade de Orlando, local em que o ex-presidente estava hospedado.

Em seguida, o kit foi transportado para o Brasil e entregue em 24 de março na agência da Caixa, em Brasília.

OUTRO LADO

A defesa de Bolsonaro afirmou que o ex-presidente coloca sua movimentação bancária à disposição das autoridades e que ele "jamais apropriou-se ou desviou quaisquer bens públicos".

Disse ainda, em nota, que ele "voluntariamente" pediu ao TCU em março deste ano a entrega de joias recebidas "até final decisão sobre seu tratamento, o que de fato foi feito".

Procurado, o advogado de Mauro Cid, Bernardo Fenelon, disse em nota que ainda não teve acesso aos autos da investigação que ocasionou as buscas e apreensões. "Por esse motivo não temos como fazer qualquer comentário, afirmou.

Fabio Wajngarten disse em rede social que no diálogo mantido com Mauro Cid, reportado pela Polícia Federal, se referia "à entrega voluntária das joias ao Tribunal de Contas da União".

"Quando disse que se devia 'antecipar' a entrega dos objetos estou me referindo a uma remessa antecipada à Corte, antes de um pedido formal do TCU, que aliás acabou ocorrendo."

Frederick Wassef ainda não se pronunciou a respeito.

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